Opinião

A Revolução Ecológica na Europa: Debates Proibidos

A política ambiental, na União e nos Estados membros, é conduzida através de mentiras piedosas, faz parte dos debates proibidos, e estamos todos a defrontar-nos com o problema. Pouco a pouco

A consciência individual sobre a emergência climática aumenta na Europa. A comprovar isso, talvez pelo efeito Thunberg, o grupo parlamentar os Verdes foi um grande vencedor nas últimas eleições Europeias. Mas a política ambiental, na União e nos Estados membros, é conduzida através de mentiras piedosas, faz parte dos debates proibidos, e estamos todos a defrontar-nos com o problema. Pouco a pouco.

O Apoio às Políticas contra as Alterações Climáticas

Um artigo na revista Der Spiegel mostra-nos a diferença entre o apoio, em abstrato, dos alemães a políticas de combate às alterações climáticas, e a sua predisposição para alterarem comportamentos diários. A maioria apoia as políticas, desde que não limitem demasiado as suas vidas, em termos de gastos e de comodidade. O partido alemão os Verdes não se saiu bem na discussão sobre a sustentabilidade energética das habitações, sobre a disponibilidade de os alemães diminuírem as viagens de avião até Mallorca, e o aumento dos combustíveis. Foi rotulado de desmancha-prazeres.

A contradição entre vontade na teoria e na prática é explicada pela prevalência, nas nossas decisões, das emoções sobre a razão. Essa contradição é ilustrada por exemplos apelativos: por que só 4% dos alemães usam os carros partilhados? por que continuam a comprar Kiwis, que chegam de avião e estes produzem CO2? Segundo o Instituto de pesquisa de sustentabilidade transformadora, de Potsdam, 80% dos inquiridos de todas as idades e estratos sociais estão de acordo com as energias renováveis, mas só 40% estão dispostos a ter esses gastos imediatos para adaptar as suas casas. Outros estudos mostram preocupações com a subida do preço dos combustíveis, e o diferente impacto nos orçamentos familiares.

A Proteção das Gerações Futuras

Como o ambiente é de todos, a prevalência das emoções sobre a razão pode levar-nos a esperar pela ação dos outros. E pode levar os Estados à inércia, esperando por acordos internacionais.

Contrariando esta atitude, o tribunal constitucional alemão impôs, recentemente, a criação legal de ações concretas e eficazes na redução das emissões de CO2 a médio prazo. Na Alemanha, existem medidas legislativas aprovadas até 2030 e o tribunal exigiu a aprovação imediata de medidas para as décadas seguintes. Aprovação imediata significa aprovação na próxima legislatura, dado as eleições legislativas ocorrerem em 26 de setembro. A campanha eleitoral alemã será dominada por este tema.

A decisão do tribunal tem por base uma norma da constituição alemã, segundo a qual, o Estado tem a responsabilidade de proteger os fundamentos naturais da vida e dos animais em benefício das gerações futuras, através do poder legislativo, executivo e judicial.

Nos termos do acórdão, assim como um Estado não se pode sobre-endividar à custa das gerações futuras (é proibido pela constituição), também não deve sobrecarregar as gerações futuras com as questões ambientais.

Os juízes reconhecem uma perda potencial de liberdade individual, pelos sacrifícios decorrentes das medidas de proteção climática. Todavia, não veem alternativa e exigem uma distribuição justa, entre gerações, dessa perda de liberdade. Esta é justificada com a proteção da propriedade – por exemplo, na ausência de medidas suficientes, os proprietários de florestas perdem as suas propriedades devido às alterações climáticas; e as propriedades costeiras tornar-se-ão inabitáveis.

Quem Paga O Futuro

O impacto deste acórdão é enorme. A Alemanha entra numa nova fase e o seu exemplo influenciará as medidas europeias, dos Estados membros, e as decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE).

Já não se trata de discutir as alterações climáticas, esse capítulo fica encerrado, mas de decidir como combatê-las de forma mais eficaz, mais barata e com o mínimo de agitação social. E de decidir o papel do Estado, das empresas e dos cidadãos na nova era.

A questão principal reside em decidir quem paga a fatura das políticas europeia e nacionais. Quando falamos de custos, falamos de impostos. A União Europeia tem competências ambientais e uma agenda ousada, mas as políticas fiscais não são, até agora, coerentes com os objetivos climáticos. Estão anunciadas propostas para racionalizar a política tributária energética da União, o sistema de taxas mínimas, eliminar isenções e taxas reduzidas, introduzir mecanismos de ajustamento de preços, e rever do sistema de comércio de emissões.

Por seu turno, as politicas fiscais nacionais conflituam com as obrigações da União sobre o clima. Há subsídios atribuídos a indústrias danosas para o ambiente, de que são exemplo os subsídios à indústria automóvel.

O acórdão do tribunal constitucional alemão pode levar o TJUE a condenar medidas nacionais favorecendo indústrias, produtos ou comportamentos poluentes. Mas a tarefa do Tribunal de Justiça não é fácil: algumas medidas fiscais nacionais com propósitos ambientais podem constituir medidas protecionistas, atingir a oferta de energia na União, impedir a competitividade da União, conduzir a desigualdades sociais.

Nós, contribuintes e eleitores portugueses, somos colocados a léguas destes debates. A política ambiental em Portugal e os seus custos fazem parte do debate proibido, na nossa memória coletiva estão ligados às políticas de rendas excessivas e às tarifas garantidas às renováveis. Para além da subida da eletricidade e dos combustíveis, sabemos de medidas avulsas, tal como o imposto sobre os sacos plásticos. Nenhum partido discute connosco as medidas mais eficazes e baratas, ninguém nos pergunta o que estamos dispostos a pagar. É isso, justamente: precisamos de saber o que está em causa na política ambiental nacional e europeia, o que aí vem de sacrifícios, como serão distribuídos os custos, que ganhos e empregos podem advir para Portugal de indústrias pioneiras em matéria ambiental.