Guerra na Ucrânia

“Um Estado-ponte entre blocos”: Viktor Orbán vai reunir-se com Donald Trump em Mar-a-Lago e enfurece parceiros da NATO (869º. dia de guerra)

Para que a Hungria ocupe o lugar de “um Estado-ponte entre blocos de poder opostos”, Orbán continua a irritar os parceiros da NATO, viajando para encontrar-se com Donald Trump, sem sequer se ter reunido antes com Joe Biden. A Rússia, a China e até Erdogan, o Presidente turco, reagiram, respetivamente, com promessas de retaliação, ira e preocupação às promessas feitas à Ucrânia na cimeira da NATO. Eis os destaques do 869º. dia de guerra

Viktor Orbán e Donald Trump, num encontro bilateral em 2019
BRENDAN SMIALOWSKI

O primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, vai viajar até Mar-a-Lago para se encontrar com Donald Trump, informaram duas fontes com conhecimento do encontro, de acordo com o jornal “The Guardian”. Orbán enfureceu os seus aliados da NATO ao reunir-se com Vladimir Putin e Xi Jinping dias antes da cimeira da aliança em Washington. Reuniu-se também com Volodymyr Zelensky, tendo em vista o seu próprio plano de cessar-fogo, sem atender às ideias de Biden ou dos líderes de outros países da UE.

Bulent Gokay, analista de relações internacionais da Universidade de Keele, no Reino Unido, refere, no entanto, em declarações ao Expresso, que nem tudo na política de Orbán é explicado pelo favorecimento à China e à Rússia. “O primeiro-ministro húngaro foi a Pequim apenas dois meses depois de Xi ter visitado a capital húngara, Budapeste. A Hungria, que acaba de assumir a presidência rotativa da UE, tem uma abordagem amigável, tanto para a Rússia, como para a China. Orbán descreveu a sua viagem à Ucrânia, Rússia e China como uma missão de paz. E chama à China um dos pilares da nova ordem mundial. Mas a sua visita à China tem também uma dimensão económica significativa. A Hungria é hoje uma base de produção crucial para as empresas chinesas. A gigante chinesa de veículos elétricos BYD está a construir a sua maior fábrica na UE na Hungria, e muitos fabricantes chineses de baterias também estão a considerar transferir as suas instalações de produção para a Hungria.”

Agora, o líder Húngaro vai encontrar-se com Donald Trump, e viajará no seu jato 606 Dassault Falcon, uma das várias aeronaves que aterrou na base aérea Andrews na terça-feira, para participar na cimeira da NATO.

Apesar de Orbán preparar-se para estar com o antigo Presidente norte-americano, com Biden nem pediu para reunir-se, nem houve qualquer pedido para um encontro bilateral. O ministro dos Negócios Estrangeiros húngaro, Péter Szijjártó, tinha dito à Reuters: “Vemos uma oportunidade para a paz se o Presidente Trump ganhar. Vemos uma oportunidade para boas relações entre a Hungria e os EUA se o Presidente Trump estiver a ganhar.”

Orbán “quer ser o homem de Trump na Europa se Trump ganhar as eleições", alegou um diplomata da União Europeia, em declarações ao jornal “The Guardian”. A Hungria continuará a ocupar a presidência do Conselho da UE até ao final do ano, coincidindo com um período em que Trump poderá ser presidente eleito. “Portanto, durante o último mês antes da tomada de posse, ele poderá ser o protagonista europeu em Washington a fazer acordos em nome de todos”, afirmou o diplomata.

“É óbvio que os responsáveis ​​da UE e os líderes de outros países da UE não partilham as opiniões de Orbán sobre a forma de alcançar a paz na Ucrânia”, comenta Bulent Gokay. “No entanto, seria errado descrever Orbán pelas suas políticas como pró-Rússia, pró-China ou anti-Ucrânia. Orbán parece estar a tentar mostrar que a Hungria pode ser um Estado-ponte entre blocos de poder opostos.”

O Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, afirmou nesta quinta-feira que qualquer possibilidade de um confronto direto entre a Rússia e a NATO era “preocupante”, segundo a agência France-Presse (AFP), que cita a agência de notícias estatal turca Anadolu.

Os líderes da NATO reuniram-se em Washington e adiantaram, entre outras informações, que iriam acelerar a transferência de caças F-16 para Kiev, e que a Ucrânia se encontrava num “caminho irreversível” para a adesão à aliança. O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, disse, em resposta, que a Rússia estava a planear “medidas de retaliação” para conter a “ameaça muito séria” da aliança.

Erdogan, que esteve presente na cimeira da NATO, resolveu posicionar-se: “A possibilidade de um conflito direto entre a NATO e a Rússia é, sem dúvida, preocupante. Quaisquer passos que possam levar a este resultado devem ser evitados de forma consciente.”

Outro interveniente internacional a emitir uma resposta de revolta às declarações aos representantes da NATO foi a China. Em comunicado, a aliança afirma que a China se tornou um “facilitador decisivo” do esforço de guerra da Rússia na Ucrânia, e que Pequim continua a colocar desafios sistémicos à Europa e à segurança.

Um porta-voz da missão chinesa na União Europeia comentou que a declaração da cimeira da NATO em Washington estava repleta de “retórica beligerante”, e que o conteúdo relacionado com a China contém “mentiras, incitamento e difamações”.

“Como todos sabemos, a China não é a criadora da crise na Ucrânia”, vincou um porta-voz da liderança chinesa. Também um jornal do Partido Comunista Chinês (PCC) defendeu que a NATO "precisa de criar continuamente mais inimigos e crises para sustentar a sua existência", acusando a aliança "incitar conflitos" na região da Ásia-Pacífico. "Não vamos especular sobre se a NATO chegará viva ao seu 76.º aniversário, mas é certo que a NATO não avançará pacificamente para o futuro", escreveu em editorial o “Global Times”, jornal em inglês do grupo do Diário do Povo, o órgão central do PCC. "Não satisfeita com a divisão da Europa, a NATO está também a tentar incitar conflitos e confrontos na região da Ásia-Pacífico", acrescenta a publicação.

Outras notícias em destaque:

⇒ O secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, e o Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, realizaram uma conferência de imprensa conjunta em Washington. Stoltenberg vaticinou que o "futuro da Ucrânia é na NATO" e garantiu que os aliados estão "ansiosos" por demonstrar o seu apoio a Zelensky e ao seu país. O responsável da NATO diz que, na quarta-feira, os aliados acordaram um pacote “substancial” para a Ucrânia, incluindo assistência e formação em matéria de segurança, com uma “base mínima” de 40 mil milhões de euros em ajuda militar à Ucrânia no próximo ano. Zelensky descreve o apoio da NATO à Ucrânia como “crucial”, para ajudar a travar o “apetite pela agressão” do Presidente russo, Vladimir Putin. Disse ainda estar “confiante” de que a Ucrânia aderirá à NATO e que “tudo fará” para o conseguir.

⇒ Os serviços de informação dos EUA frustraram uma conspiração russa para assassinar o presidente executivo do principal fabricante de armas alemão. Tratava-se de uma tentativa de retaliação pelo papel da empresa no fornecimento de uma grande quantidade de armamento à Ucrânia. A conspiração para assassinar Armin Papperger, presidente da Rheinmetall, é apenas um entre vários planos do Governo russo para matar executivos da indústria de defesa em vários países da Europa, que têm apoiado o esforço de guerra da Ucrânia, disseram à “CNN” autoridades dos EUA e de outros países ocidentais. No entanto, o plano para matar Papperger estava no estágio mais avançado, em comparação com qualquer outro.

⇒ As autoridades russas estão a desenvolver um novo sistema de “troca eletrónica de dados” entre o Ministério da Defesa e o serviço de fronteiras do FSB (serviço de segurança e informação russo) para garantir que os homens convocados para o serviço militar não possam sair do país. A notícia é avançada pelo site noticioso russo “Meduza”. O objetivo do cruzamento de dados é que se torne mais difícil para os recrutas abandonarem o país.