O primeiro-ministro espanhol respondeu esta quarta-feira com um “não rotundo” quando o chefe da oposição lhe perguntou se iria tirar da cadeia 200 terroristas da ETA, em troca do voto favorável dos nacionalistas radicais bascos ao orçamento de Estado. O socialista Pedro Sánchez declarou-se mesmo “cheio de dor” por Pablo Casado, presidente do Partido Popular (PP, centro-direita) admitir sequer essa hipótese.
A troca de palavras deu-se num debate parlamentar com o Governo. Neste 20 de outubro de 2021 passam dez anos sobre o dia em que o grupo terrorista anunciou o fim da sua campanha homicida.
Casado acusara Sánchez de “deixar para trás as vítimas do terrorismo, ao aproximar [dos seus locais de residência, porque estavam presos em cadeias longínquas] uma centena de etarras com delitos de sangue”. Aludindo ao apoio parlamentar que o Governo de esquerda tem recebido do partido nacionalista radical Euskal Herria Bildu (EHB, Unir o País Basco), Casado defende que “não se pode pactuar e branquear, para continuar no poder, aqueles que justificam o assassínio de 850 inocentes”.
O EHB é descendente político do partido Batasuna, que sob vários nomes foi braço político da ETA durante décadas, tendo sido extinto há 19 anos. O seu principal dirigente, Arnaldo Otegi, reconheceu esta semana o sofrimento causado pela ETA e afirmou que “nunca devia ter acontecido”. Mas Otegi também disse o seguinte, que motivou a pergunta de Casado a Sánchez: “Temos 200 presos na cadeia e se para soltá-los for preciso votar a favor do orçamento, votamos”. O EHB tem cinco parlamentares no Congresso dos Deputados.
PSOE e nacionalistas entendem-se
Casado recordou que o primeiro-ministro prometera não fazer acordos com o EHB, mas a formação independentista tem dado a mão ao Executivo formado pelo Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE, centro-esquerda, chefiado por Sánchez) e pela frente de esquerda Unidas Podemos. Na região de Navarra, foi mesmo com a ajuda do EHB que os socialistas afastaram do poder a aliança de direita que venceu as últimas eleições.
Sánchez rejeitou o conselho do chefe do PP para romper todos os laços com o partido de Otegi, ex-membro da ETA condenado há anos por ter participado num sequestro. Sánchez vê nele um “homem de paz”, tendo sido crucial no processo de deposição das armas e autodissolução do grupo.
O governante garantiu que o PSOE “nunca utilizou o terrorismo”, nem antes nem depois da extinção da ETA. Lembrou que foi no tempo dos seus camaradas José Luís Zapatero (primeiro-ministro entre 2004 e 2011), Patxi López (presidente do governo regional basco entre 2009 e 2012) e Alfredo Pérez Rubalcaba (ministro da Administração Interna) que o grupo armado deixou de matar. Sánchez também atribuiu méritos ao PP e às demais forças democráticas, mas Casado afirma que foram a polícia e a justiça que o alcançaram, não as “cedências de Zapatero”.
O PP defende que os assassínios da ETA, cometidos na maioria já depois do fim da ditadura franquista — o que deita por terra uma aura de luta pela liberdade que o grupo terrorista sempre tentou transmitir —, sejam considerados crimes contra a Humanidade e nunca prescrevam.