O seu telefone não parava de tocar, mas as instruções eram claras: não atenda. Escondido num hotel da Cidade do México, Andrés Timoteo aguardava o seu destino. Ia ser exilado para a Europa ao abrigo do mecanismo de proteção para jornalistas ameaçados. A única ideia na sua cabeça: sair com vida.
Durante dias, o jornalista tinha mentido aos seus entes queridos, dizendo-lhes que tinha conseguido um visto para estudar em Paris. Mas na realidade, ele estava a deixar tudo para trás. Ele sabia que provavelmente nunca mais voltaria ao México.
Cinco dias antes, a 28 de Abril de 2012 em Xalapa, uma cidade do sudeste do México, o corpo sem vida da sua amiga Regina Martínez tinha sido descoberto. Martínez, também jornalista, tinha sido espancada e depois estrangulada até à morte na sua própria casa de banho. O seu assassinato foi um aviso para outros repórteres na região de Veracruz, muitos dos quais conheciam ou sabiam quem era Martínez. A mensagem era clara: um deles podia ser o próximo.
“Se uma jornalista como Regina, que trabalhava para um meio de comunicação social nacional, podia ser morta, isso podia acontecer a qualquer um”, disse Andrés.
A morte de Martínez provocou ondas de choque por todo o México. Muitos viram-no como um sinal do que estava para vir. Nos anos seguintes, Veracruz tornou-se o lugar mais perigoso do mundo para se ser jornalista. O caso de assassinato de Martínez foi muito mal tratado pelas autoridades locais, e mesmo depois de um suspeito ter sido preso, os jornalistas locais nunca acreditaram na história oficial. Oito anos mais tarde, um consórcio internacional de 60 jornalistas de 25 meios de comunicação social retomou as suas investigações inacabadas e tentou desvendar a verdadeira história por detrás da sua morte.
Contactando com fontes que nunca antes tinham falado, o consórcio descobriu que a morte de Martínez foi muito provavelmente o resultado do seu trabalho jornalístico, desvendando múltiplas teorias sobre o porquê da sua morte. Descobriu também uma rede de compadrio implicando dois ex-governadores e uma campanha coordenada para manipular a narrativa em torno do seu assassinato.
Uma jornalista obstinada
“Tudo o que a imprensa local não se atrevia a publicar era publicado via Regina Martínez”, disse Jorge Carrasco, o director do Processo, a revista semanal de investigação para o qual Martínez trabalhou como correspondente desde 2000 até à sua morte prematura em 2012.
Mulher modesta, nascida numa família de 11 filhos, Martínez conhecia Veracruz de olhos fechados — até à mais pequena aldeia. Ela estudou jornalismo e começou a trabalhar como repórter em 1980 para uma estação de televisão local. Aprendeu rapidamente que na profissão muitos repórteres eram pagos por pessoas no poder para publicar as notícias que queriam ouvir.
Martínez — cujos amigos lhe chamavam "La Chaparrita", ou a “pequena mulher”, em referência ao seu metro e meio de altura — construiu o seu nome como repórter profissional, sempre profundamente ocupada com o seu trabalho. O seu profissionalismo isolou-a pouco a pouco. Uma pessoa caseira, preferia ficar em sua casa nos fins-de-semana a fumar cigarros e a cuidar das suas plantas.
Norma Trujillo, a sua amiga de longa data e jornalista em Xalapa, lembra-se dela como uma mulher hiperativa e apaixonada.
“O seu trabalho era a sua vida”, disse Trujillo. “Ela estava realmente interessada nas questões sociais, nas violações dos direitos humanos. Era próxima do povo. Essa era a sua superpotência”.
Era também uma repórter dotada e sem paralelo. Em 2006, três anos antes de ter rebentado a crise da gripe H1N1, Martínez cobriu as horríveis condições sanitárias das explorações suinícolas em La Gloria, a pequena aldeia de Veracruz que mais tarde foi determinada como sendo o provável epicentro do vírus. Um ano mais tarde, acusou o exército mexicano de violar e matar uma mulher indígena de 72 anos. A sua obstinação e determinação levaram-na a investigar os excessos de poder e corrupção que assolavam Veracruz. Fidel Herrera e Javier Duarte, que serviram como governadores, tornaram-se figuras centrais nas suas investigações.