Internacional

Irão vive a instabilidade política mais mortífera em quatro décadas

Em apenas quatro dias, entre 180 e 450 pessoas morreram em protestos que começaram há duas semanas após o aumento abrupto dos preços da gasolina. Os protestos têm sido reprimidos com violência pelas autoridades e, até recentemente, um apagão da Internet. Um ex-primeiro-ministro recorda o massacre protagonizado pelos revolucionários agora no poder

Fatemeh Bahrami/Anadolu Agency/Getty Images

O Irão enfrenta a instabilidade política mais mortífera desde a Revolução Islâmica há 40 anos, tendo registado entre 180 e 450 mortos em apenas quatro dias, escreveu este domingo o jornal “The New York Times”. As autoridades contestam os números e promovem contramanifestações de apoio ao poder vigente.

Os protestos começaram há duas semanas após o aumento abrupto de 50% ou mais dos preços da gasolina. Desde então, manifestantes em cidades grandes e pequenas pedem o fim do Governo da República Islâmica e o derrube dos seus líderes. Os protestos têm sido reprimidos com violência pelas autoridades e só agora, após o levantamento recente de um corte da Internet, começam a surgir detalhes sobre a repressão.

Em muitos casos, as forças de segurança abriram fogo contra manifestantes desarmados, na sua maioria desempregados ou jovens de baixos rendimentos entre os 19 e os 26 anos, segundo relatos de testemunhas e vídeos.

“O uso recente de força letal contra pessoas em todo o país não tem precedentes, nem mesmo para a República Islâmica e o seu histórico de violência”, acusa, citado pelo “Times”, Omid Memarian, vice-diretor do Centro de Direitos Humanos no Irão, um grupo estabelecido em Nova Iorque.

Líder supremo acusa inimigos internos e externos

Em quatro dias de intensa violência após o anúncio do aumento dos preços da gasolina, a 15 de novembro, o número de mortos poderá ter variado entre as duas centenas e o meio milhar, havendo pelo menos dois mil feridos e sete mil detidos a registar. O balanço cruza informações de organizações internacionais de direitos humanos, grupos de oposição e jornalistas locais.

Muitos iranianos orientaram a sua hostilidade diretamente ao líder supremo, o ayatollah Ali Khamenei, que considerou a repressão uma resposta justificada ao que apelidou de conspiração dos inimigos do Irão, dentro e fora do país.

Membro da oposição lembra massacre de 1978

O assassínio de manifestantes motivou uma reação do antigo (e último) primeiro-ministro do Irão, Mir-Hossein Mousavi, que se encontra em prisão domiciliária desde 2011 e raramente fala em público. Num comunicado divulgado no sábado num site da oposição, o ex-candidato presidencial, cuja derrota nas eleições de 2009 desencadeou manifestações pacíficas que o ayatollah também reprimiu pela força, responsabilizou o líder supremo pelas mortes. Mousavi comparou a repressão sangrenta com o massacre de 1978 pelas forças do Governo, que levou à queda do xá Mohammad Reza Pahlavi no ano seguinte, às mãos dos revolucionários islâmicos que agora governam o país.

Em 2009, após as eleições contestadas, registou-se a última grande onda de protestos no Irão, também sujeita a uma repressão mortal. O balanço foi de 72 mortos ao longo de cerca de dez meses.

Analistas citados pelo “Times” defendem que os protestos representam um duro golpe para o Presidente Hassan Rouhani, relativamente moderado no espectro político do Irão, abrindo-se caminho para que candidatos da linha dura vençam as eleições parlamentares e presidenciais daqui a dois anos.