Internacional

Síria. Civis curdos planeiam servir como “escudos humanos” para travar avanço de tropas turcas

No domingo, os EUA anunciaram que não iriam intervir numa operação militar turca contra forças curdas, que estará iminente, abrindo caminho às tropas de Ancara. Um dia depois, Trump ameaçou “destruir” a economia turca no caso de a intervenção ultrapassar os limites. O Irão instou esta terça-feira a Turquia a respeitar a integridade e a soberania da Síria

DELIL SOULEIMAN/AFP/Getty Images

Civis curdos no nordeste da Síria planeiam servir como “escudos humanos para impedir o avanço turco” numa operação militar que estará iminente, revelou esta terça-feira o ativista Arin Sheikhmous à Al Jazeera. Ele e centenas de outras pessoas estão concentradas em Qamishli, junto à fronteira com a Turquia, em “grandes tendas”. Também as cidades de Ras al-Ain, Tell Abyad e Kobane começaram a realizar concentrações com o mesmo objetivo.

No domingo, os EUA anunciaram que não iriam intervir numa operação militar turca contra forças curdas, abrindo assim caminho às tropas de Ancara. O anúncio de não envolvimento está a ser descrito pelos analistas como uma mudança repentina da política norte-americana, traduzindo-se, na prática, no abandono dos aliados curdos na região.

Há quase cinco milhões de pessoas a viver no nordeste sírio, incluindo centenas de milhares de deslocados internos que fugiram das ofensivas lideradas pelo Governo de Damasco noutras partes do país, segundo autoridades locais. “Esta é a única área que foi poupada à ofensiva de destruição total e queremos mantê-la assim”, sublinhou Sheikhmous. “Estamos todos assustados porque se a Turquia puser o pé nesta área, haverá massacres”, alertou.

Turquia quer deslocar dois milhões de refugiados sírios

Ancara pretende que aquela zona fique livre de combatentes das Unidades de Proteção Popular (YPG), uma organização armada curda que a Turquia considera uma organização terrorista. Estas unidades eram uma parte importante das Forças Democráticas Sírias, as forças apoiadas pelos EUA que derrotaram o Daesh na Síria.

A Turquia considera as YPG uma extensão do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), que luta pela autonomia curda na Turquia há mais de três décadas. As YPG negam qualquer vínculo organizacional direto àquele partido. No passado, Ancara já condenou Washington por apoiar as YPG.

Albergando 3,6 milhões de sírios que fugiram da guerra civil no seu país, a Turquia pretende igualmente transferir dois milhões desses refugiados do seu território para uma “zona segura”.

O comunicado de domingo da Casa Branca surge depois de, na véspera, o Presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, ter anunciado que a incursão turca aconteceria em breve. Durante uma conversa telefónica com o Presidente dos EUA, Donald Trump, Erdogan mostrou-se frustrado com a falta de progresso na criação de uma “zona segura” no nordeste da Síria, ao longo da fronteira com a Turquia, com que os aliados da NATO concordaram em agosto.

“Uma facada nas costas”

As Forças Democráticas Sírias descreveram o anúncio da retirada de Washington como “uma facada nas costas” mas prometeram “defender” a sua terra “a todo o custo”.

Esta segunda-feira, Trump ameaçou “destruir” a economia turca no caso de a intervenção de Ancara ultrapassar os limites. “Como disse antes, e apenas para reiterar, caso a Turquia faça algo que eu, na minha grande e inigualável sabedoria, considere que está fora dos limites, destruirei e aniquilarei totalmente a economia da Turquia”, escreveu no Twitter. “Já o fiz anteriormente!”, acrescentou Trump, numa referência à queda da lira turca, que em agosto perdeu 25% do seu valor após Washington ter convertido a libertação do missionário protestante Andrew Brunson, que entretanto regressou aos EUA, numa causa diplomática.

A televisão nacional do Irão noticiou esta terça-feira que o ministro dos Negócios Estrangeiros do país, Mohammad Javad Zarif, telefonou ao seu homólogo turco, Mevlüt Çavuşoğlu, para expressar a sua oposição à operação de Ancara. O chefe da diplomacia iraniana instou a Turquia a respeitar a integridade e a soberania da Síria.