França tem um novo primeiro-ministro, depois de o bebé ter sido devolvido às mãos de Macron. De seu nome Instabilidade, o bebé não nasceu ontem, e pesa mais de 5% de défice. Noutra vida, chamara-se o Imbróglio. Calha agora a Sébastien Lecornu, discreto e moderado servidor, tratar dele.
Num país com tradição em contestação e vidros partidos, o presidente francês e os sucessivos líderes de governo parecem não ter mãos sobre a vontade popular. Esta: viver como nenhum outro país da Europa vive. Despesa pública em alta, dívida pública a acompanhar, e uma reforma tranquila aos 62 anos. Isto sem receita que faça jus.
A conta não fecha: Macron, o ex-primeiro-ministro Bayrou, e agora Lecornu, sabem-no. Sabem as instituições europeias; sabem também os mercados. O que leva a crer que os principais partidos políticos conhecem o problema. E conhecem; só o ignoram.
A política europeia está repleta de negação e dissimulação. Desde Paris, os partidos de Marine Le Pen e de Jean-Luc Mélenchon cultivam-na com aprumo e convicção. No Parlamento e na rua, os extremos tocam-se na rejeição a alterações sérias ao estado de coisas. Às contas públicas e à despesa que galopa com o tempo. De acordo com os dois partidos, mesmo que para fins diferentes, o caminho é a continuidade. A atração pelo abismo.
O caminho, portanto, é dar razão ao que Macron vai notando: a França parece ser irreformável. O que faz lembrar a pergunta que De Gaulle, há mais de quatro décadas, deixou no ar: “Como se há-de governar um país que tem 246 variedades de queijo?” Pouco entendo de queijos, e desconheço se o seu número aumentou entretanto, leitor, mas prevejo um fim à novela francesa.
Perante um Estado francês que vive acima das suas possibilidades, o establishment francês torce por um vulto tecnocrata à imagem de Mario Draghi. Alguém que faça o que esse fez em Itália. Alguém que, à volta da sua figura, trace um compromisso para um debate nacional: poderá o Estado viver deste modo? Nada disto, tudo indica, se avizinha, sendo o único compromisso que existe em França o de fazer cair qualquer governo que proponha esse debate. A ruína está na moda.
Financeiramente, a França será grande demais para ruir. Já para cair e ralar os joelhos, duvido. A conta será a dividir por todos, incluindo a Europa e este lindo retângulo à beira mar.