Um alto tribunal norte-irlandês rejeitou, esta quinta-feira, uma ação judicial que alegava que uma eventual saída da União Europeia (UE) sem acordo, a 31 de outubro, punha em risco o processo de paz naquela região do Reino Unido. Segundo o juiz, as divergências políticas pertencem ao âmbito da política e não à esfera judicial.
O processo fora instaurado por três requerentes. Argumentavam que um Brexit duro poria em causa os acordos entre o Reino Unido e a Irlanda que estão na base da pacificação da Irlanda do Norte, sobretudo no tocante à colaboração transfronteiriça. A região foi assolada por um conflito sangrento entre católicos (defensores da reunificação das Irlandas) e protestantes (unionistas, isto é, partidários da ligação ao Reino Unido) que só terminou em 1998, com o Acordo de Sexta-feira Santa.
Segundo o juiz Bernard McCloskey, o assunto de sair ou não da UE e, saindo, fazê-lo com ou sem acordo é “inerentemente e inconfundivelmente político”, sendo as divergências de opinião, “alegações e contra-alegações, afirmações e contra-afirmações” parte normal da disputa nessa esfera. São mesmo, acrescenta o magistrado, “a própria essência do que é aceite e permitido numa sociedade democrática”.
A ação judicial foi interposta pelo ativista Raymond McCord, que perdeu um filho nessa guerra, assassinado por paramilitares unionistas em 1997; por Jamie Waring, da organização de defesa dos direitos cívicos Comité para a Administração da Justiça; e por um cidadão anónimo.
A haver recurso, será decidido na sexta-feira. Isto permite que, caso assim entenda, o Supremo Tribunal do Reino Unido inclua este processo na apreciação que fará, a partir de terça-feira, 17 de setembro, de outros dois processos apreciados na Escócia e em Inglaterra a respeito do Brexit.
Supremo pode juntar três processos
Quarta-feira um painel de três juízes do mais alto tribunal cível escocês considerou ilegal a suspensão do Parlamento decidida pelo Governo de Boris Johnson, na sequência de uma queixa apresentada por 79 pessoas, na maioria parlamentares. Os magistrados concordaram que a medida não se destinou (como alegou o Executivo) a preparar a próxima sessão legislativa, mas a contornar o escrutínio da ação governativa pelos deputados. O tribunal norte-irlandês não abordou esta questão.
Já o Alto Tribunal inglês rejeitou a ilegalidade da suspensão do Parlamento, noutro processo da autoria da ativista política Gina Miller, a mesma que em 2017 conseguiu que a justiça obrigasse o Governo de Theresa May a consultar o Parlamento antes de desencadear o processo do Brexit.
O Supremo começa a apreciar terça-feira, ao longo de três dias, o recurso de Miller contra a decisão inglesa e o do Governo contra a decisão escocesa. Recorde-se que no referendo que decidiu a saída da UE, em 2016, por 52%-48%, a permanência na UE foi opção maioritária na Escócia (62%) e na Irlanda do Norte (56%).