O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, insistiu esta segunda-feira que quer “fazer um acordo” para o Brexit, sublinhando que uma saída desordenada do Reino Unido da União Europeia (UE) seria um “fracasso” para os Governos britânico e irlandês.
Johnson esteve em Dublin para se reunir com o chefe do Governo da República da Irlanda, Leo Varadkar, que adverte que “não existe uma rutura limpa” e que “os riscos são elevados”.
Numa conferência de imprensa que antecedeu o encontro à porta fechada, o primeiro desde que assumiu a liderança de Downing Street em julho, Johnson afirmou acreditar que ainda é possível um acordo até à cimeira europeia de outubro. O primeiro-ministro britânico disse que preferia “estar morto numa valeta” a pedir um novo adiamento do Brexit, enquanto o seu homólogo irlandês já sinalizou que apoiaria uma nova extensão do atual prazo, 31 de outubro.
Johnson diz-se “absolutamente destemido”
Ainda antes do encontro, Varadkar disse que perguntaria a Johnson como pretende fazer aprovar um acordo para o Brexit quando já não dispõe de maioria na Câmara dos Comuns. Já na capital irlandesa, o primeiro-ministro britânico mostrou-se “absolutamente destemido” quanto ao que poderá acontecer no Parlamento nos próximos dias.
“Há duas tarefas que simplesmente temos de cumprir. Temos de restaurar Stormont [o Parlamento da Irlanda do Norte, suspenso há dois anos e meio por falta de acordo entre unionistas e republicanos, o que deixa a região sem governo autónomo] e sair a 31 de outubro. Caso contrário, serão causados danos permanentes à confiança no nosso sistema democrático”, enfatizou Johnson. Por seu turno, Varadkar garantiu que o Governo irlandês “não pode e não irá substituir uma garantia legal por uma promessa”.
Ainda e sempre o backstop
O Executivo de Dublin sustenta que o backstop (a solução que o acordo entre a UE e Theresa May prevê para evitar nova fronteira entre as Irlandas) é necessário em qualquer acordo de Brexit. Para Johnson, o backstop é “inviável”, “antidemocrático” e “inconsistente com a soberania do Reino Unido”, além de poder, na sua opinião, minar o processo de paz na Irlanda do Norte, enfraquecendo “o equilíbrio delicado” do acordo de paz da Sexta-feira Santa, assinado em 1998. “Tal como está”, o acordo para o Brexit voltará a não passar no Parlamento britânico, avisava ainda em agosto o primeiro-ministro.
Neste momento, não há quaisquer entraves à circulação entre a província britânica da Irlanda do Norte e a República da Irlanda, país independente e Estado-membro da UE. O backstop é uma cláusula de salvaguarda: caso o Reino Unido e os 27 não criem até ao fim de 2020 (período transitório do Brexit) uma relação bilateral que evite a fronteira, o Reino Unido ficará em união aduaneira com a UE até que tal suceda. Se for preciso acionar o backstop, a Irlanda do Norte ficará sujeita a certas regras do mercado único, ao contrário do resto do Reino Unido. Não há mecanismo de saída bilateral deste regime, só por mútuo consentimento.
Últimos trabalhos parlamentares antes da suspensão
Entretanto, um projeto de lei que obriga Johnson a tentar evitar um Brexit sem acordo entra em vigor, após carimbo real, esta segunda-feira, o mesmo dia em que o primeiro-ministro tentará pela segunda vez convocar eleições antecipadas.
A sua primeira tentativa na semana passada não foi bem-sucedida. Para ter sucesso, Johnson precisaria de dois terços do apoio parlamentar (434 deputados no total) mas a oposição revelou na sexta-feira que voltará a chumbar o diploma, uma vez que só pretende apresentar-se a novo ato eleitoral depois de garantido um novo adiamento do Brexit.
Esta segunda-feira, os trabalhos parlamentares serão suspensos até 14 de outubro, na sequência de um pedido de Johnson à rainha. Isabel II acedeu, como seria de esperar, pois não há memória em tempos recentes de um monarca contrariar a vontade de um Governo com legitimidade democrática.