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“O teletrabalho cinco dias por semana é um mau uso da tecnologia”

A propósito dos Investor Relations & Governance Awards (IRGA), que são entregues esta quinta-feira, 26 de maio, o Expresso entrevistou os nomeados a CEO do ano. João Manso Neto, presidente executivo da Greenvolt, é um deles

Joao Manso Neto, presidente executivo da Greenvolt.

Ana Baptista

Os IRGA deste ano dizem respeito ao desempenho de 2021, um ano em que assumiu a liderança da Greenvolt e a transformou por completo. Quais foram os maiores desafios e feitos que atingiu nesse período?

Foi uma oportunidade de transformar uma empresa só de biomassa numa empresa de renováveis e o primeiro passo foi definir uma estratégia que tem de fazer sentido e tem de vantagens comparativas. Na área da biomassa foi mais fácil porque já estava na empresa, mas na área das renováveis centralizadas [parques de maiores dimensões] foi preciso arranjar recursos humanos e financeiros e depois foi começar a fazer algumas aquisições na área do descentralizado [instalações de autoconsumo]. Depois fizemos o IPO [entrada em bolsa] e continuámos a dar passos sólidos, quer do ponto de vista operacional, quer financeiro, porque formos capazes de aceder ao mercado de capitais na parte da dívida. Foi um ano realmente interessante e a equipa e os acionistas foram fundamentais. O meu mérito foi o de juntar as peças.

Isso revela a importância da liderança e da equipa numa empresa?

Uma coisa curiosa é que, muitas vezes, as pessoas dizem que não fazem porque não há condições, mas nós conseguimos demonstrar, com esta equipa toda, que isso não é verdade, e o que faz falta é haver vontade e confiança. Às vezes, as pessoas partem do princípio de que há dificuldades que não existem, mas é preciso acreditar e ter capacidade de insistir, e não mudar de opinião de cinco em cinco minutos.

Como é que a Greenvolt tem lidado com a transição digital e a sustentabilidade?

As empresas não podem pensar só em lucros, têm de pensar no ambiente, no modelo de governo e no social, não só nas comunidades onde estão, mas também em função dos trabalhadores. Ter equipas motivadas é fundamental. A tecnologia permite facilitar o ESG [sigla em inglês que significa Environment (Ambiente), Social (social) e Governance (modelo de governo)], porque permite pôr em prática e medir os impactos ambientais, aumenta a produtividade e, tecnicamente, aumenta a qualidade do trabalho. Mas é de evitar os usos perversos da digitalização. Por exemplo, a tecnologia permite o teletrabalho, mas é preciso ter consciência de que o teletrabalho cinco por dias por semana é um mau uso da tecnologia. Perde-se riqueza humana e a discussão de ideias é importantíssimo numa empresa. Outro exemplo: uma tecnologia que é utilizada para substituir homens por máquinas não é espetacular. Tem, sim, de permitir que os homens se concentrem em funções de valor acrescentado.

Como se evitam esses perigos de substituição ou mesmo de despedimentos?

É preciso ter a inteligência para ver como se usa a tecnologia. Esses perigos, as empresas só os têm se não forem sustentáveis.

De que forma é que a Greenvolt aplica a tecnologia à sustentabilidade?

No modelo de governo, mais do que tecnologia, é uma questão de conceito, quer na composição dos orgãos quer na forma como as decisões são tomadas. Além disso, a tecnologia ajuda, por exemplo, a definir quais os projetos a implementar ou como fazer as manutenções programadas [aos parques e centrais] de forma a ter o menor impacto possível sobre o ambiente.

A Greenvolt cresceu e mudou em 2021, passando um pouco ao lado dos efeitos económicos da pandemia. Será assim como a guerra na Ucrânia?

A guerra tornou ainda mais óbvio a necessidade de renováveis, porque é verde e por questões de segurança energética, por isso, desse ponto de vista, a procura de renováveis ainda é maior do que era, o que mostra que estamos do lado certo da equação. Depois, a inflação introduz pressão no custo de capital, mas os custos da energia também subiram, por isso não há grandes motivos da preocupação. Além disso, os preços altos da energia também incentivam ao autoconsumo, que é outros dos nossos vetores na empresa. Quem tem um telhado e não o usa está distraído.

Pode, então, haver um acelerar dos projetos…

Os governos vão tomar algumas medidas para tornar menos difícil - não é tornar mais fácil - o processo do grande estrangulamento que é o licenciamento, em todo lado, e não só em Portugal. O descentralizado não cria tantos problemas. Toda a gente gosta, da direita à esquerda, e portanto tem um futuro muito bom. Já o centralizado cria mais problemas. Há sempre um conflito entre mais renováveis e biodiversidade.