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Serrim dos eucaliptos pode produzir energia: projeto português inova na produção de pasta de papel

Em comparação com o processo tradicional, a utilização de biomassa em substituição do gás natural na produção de pasta de papel pode reduzir as emissões de gases de efeito de estufa até 76%

Utilizar a biomassa para criar alternativas aos combustíveis fósseis é uma aposta para tornar a economia mais sustentável e limpa. Um dos exemplos desta solução é o projeto LK2BM - Lime Kiln Tube Biomass, da empresa Navigator, que valoriza resíduos florestais resultantes dos eucaliptais para criar energia.

O objetivo era substituir o gás natural usado para atingir as temperaturas necessários nos fornos de cal, que integram o processo da produção da pasta de papel. Para tal, utiliza-se o serrim, partículas finas que resultam da serração, resultante das operações industriais e florestais da Navigator. “Quando nós fazemos isso, estamos a ter uma redução muito grande nas nossas emissões, de cerca de 17.400 toneladas ano”, afirma António Sequeira, diretor de projetos da empresa.

O projeto “pioneiro” foi financiado em mais de 4,4 milhões de euros pelo Fundo da Inovação, da União Europeia. Esta ideia poderá ainda ser expandida a outras regiões, sendo facilmente replicável no setor da pasta e do papel.

De onde surge a necessidade de criar o projeto LK2BM?

Surge como um projeto que está na nossa política de descarbonização da empresa, em particular este em Setúbal. Assumimos, logo em 2019, um plano de descarbonização em que temos como objetivo reduzir as nossas emissões até 2035 num valor de cerca de 86%. Temos fornos de cal noutros processos, mas o Lime Kiln Tube Biomass (KK2BM) de Setúbal é um eleito natural porque o forno da cal é um dos principais equipamentos industriais que usa combustíveis fósseis.

Qual a diferença relativamente ao método tradicional de produção de pasta de papel?

Temos o forno da cal, que é um processo endotérmico que converte carbonato de cálcio em cal viva para fazer recuperação de químicos no processo de produção de pasta, fechando o processo de produção de pasta porque recupera os químicos do cozimento, tornando-o mais sustentável. Esse forno, para converter o calcário ou carbonato de cálcio em cal viva, precisa de temperaturas na ordem dos 800 graus e para obter essas temperaturas, até agora, utiliza-se combustíveis fósseis, como o fuel ou gás natural. A ideia surgiu de converter este forno à biomassa, sendo que a biomassa que utiliza na realidade é serrim, portanto é um subproduto das nossas operações industriais e florestais que vai substituir os combustíveis fósseis.

Quais foram os desafios na mudança do combustível fóssil para o serrim?

O maior desafio quando se utiliza um material orgânico é que esse material orgânico tem variabilidade. Portanto, aquela exigência de ter 95% inferior ao milímetro ou de ter a humidade nos 5% vai obrigar a ter um controle de processo de fabricação muito mais rigoroso. Com isso, temos uns sistemas informáticos de controlo distribuído que controlam o processo de secagem, o processo de dosagem, o processo de moagem, de tal forma para que seja possível controlar de forma muito rápida e precisa os caudais, a humidade e o tamanho da partícula com que se abastece o forno. O método tradicional é só abrir a torneira do gás e funciona. O método de utilização de um combustível orgânico obriga a que haja maior controlo do processo.

Qual a importância de utilizar a biomassa florestal?

Atualmente nas nossas florestas, nós temos cerca de 5,8 milhões de toneladas de resíduos florestais, dos quais na realidade só são utilizados cerca de 20% para produção de energia. Quando falamos em resíduos florestais, falamos de matéria combustível que fica nas florestas e que é importante remover para mitigar os riscos de incêndio, porque geralmente florestas limpas, sem resíduos florestais, dificilmente vão arder.

Portanto, ao valorizarmos um resíduo florestal, na prática estamos a motorizar a economia que vai despoletar a utilização e a remoção desses resíduos na floresta, a manter as florestas limpas e ao mesmo tempo estamos a substituir um combustível fóssil por um combustível florestal. É bom que ele arda no sítio adequado para produzir valor e não nas florestas. Portanto, estamos a conseguir no mesmo processo reduzir as emissões de CO2, valorizar um processo de fabrico, reduzir um potencial risco de incêndio. É um processo que não faz sentido não o fazer, tendo essa oportunidade.

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