Caminho da Internacionalização

Bons ventos e melhores casamentos

Retoma. A economia espanhola cresceu no terceiro trimestre. Foi pouco. mas deu ânimo aos empresários.

José Tomás é uma das atracções de Madrid - o Ronaldo das corridas de touro. E, tal como o português, cobra bem: uma corrida pode custar 1 milhão de euros
Carlos Cazalis/Corbis

J. F. Palma-Ferreira

Quando disparam os negócios na calle Serrano - como voltou a acontecer depois do último verão -, Madrid cresce e Espanha sorri. Este ânimo favorável é sempre útil para Portugal, porque Espanha é o principal destino das nossas exportações de bens - de janeiro a outubro, 23,7% dos produtos fabricados em Portugal foram exportados para o mercado espanhol. Um sentimento positivo vivido em Espanha também indicia maior abertura dos empresários espanhóis ao investimento e melhora o clima de negócios para as 400 empresas com capitais portugueses que operam no país vizinho.

Contudo, o "barómetro" do otimismo está longe do regresso à euforia. Ainda persiste um pesado sentimento coletivo sobre os efeitos sociais do paro - a taxa de desemprego nacional ronda os 26% e em algumas autonomias, como a Andaluzia, chega aos 36%.

Também não significa que os espanhóis se reconciliaram com a política de austeridade e, muito menos, que os madrilenos esqueceram os gigantescos protestos públicos de indignação promovidos pelo Movimento 15-M, iniciado a 15 de maio de 2011 nas Puertas del Sol - que, por ironia do destino, já foi uma das praças emblemáticas da diversão noturna, na movida dos anos 80.

Assim, o glamour recentemente recuperado pela calle Serrano - onde se concentram as melhores lojas de Espanha - é tão somente o fruto da perceção sobre uma evolução económica mais favorável, que alguns empresários já antecipavam e que as estatísticas oficiais agora admitem: acabou a recessão técnica em Espanha, com o Produto Interno Bruto (PIB) espanhol a crescer 0,1% no terceiro trimestre de 2013, face ao trimestre anterior.

No Palácio de La Moncloa, o presidente do Governo espanhol - o galego Mariano Rajoy Brey, líder do Partido Popular -, foi rápido a rever em alta as previsões sobre o crescimento do PIB, elevando-as de 0,5% para 0,7% em 2014. O FMI fez o mesmo, mas com menos otimismo que o Governo de Rajoy, admitindo apenas um crescimento débil do PIB, inferior a 1% nos próximos quatro anos - o FMI só prevê um crescimento mais confortável, de 1,2%, em 2018.

O maior trunfo do Governo Rajoy foi comunicado pelo Ministério do Emprego: em novembro, houve menos 2474 pessoas desempregadas. É outro sinal otimista, mas nenhum espanhol ignora que há 4,8 milhões sem emprego.

É neste enquadramento que a calle Serrano aumentou os negócios de luxo. Já perto do parque do Retiro, a rua das griffes abriu agora a primeira loja em Espanha da marca norte-americana de vestuário Brooks Brothers. Curiosamente, o diretor coordenador da Aicep em Madrid, Eduardo Henriques recorda que o sector português da moda e das confeções tem bons clientes em Espanha e que "cerca de dois terços desses produtos portugueses são reexportados pelos espanhóis". Outra novidade na calle Serrano foi a abertura de uma Ferrari Store, que demonstra a aposta em Madrid feita pelo grupo italiano participado pela holding árabe Mubadala. Ora, os portugueses também beneficiam com esta aposta, porque 100% do mercado dos automóveis Ferrari em Madrid é controlado pela empresária portuguesa Maria do Carmo Espírito Santo Silva.

Luís Pessanha, que gere as vendas da Ferrari na capital espanhola, reconhece que os "ventos mudaram" e que as novas perspetivas "são favoráveis": "Vamos vender mais Ferraris em 2014 porque Madrid retomou a sua dinâmica. É aqui que tudo acontece em Espanha. E é aqui que joga Ronaldo, que, por sinal, é nosso cliente de Ferraris".

Publicado no Caderno de Economia do Expresso de 14 de dezembro de 2014