No dia 28 de junho de 1969, há 56 anos e dois dia, um bar gay em Nova York, em Greenwich Village, foi invadido pela polícia. Este evento desencadeou uma manifestação de centenas de pessoas pró-LGBT, que durou várias noites seguidas. Inspirada nesta sucessão de eventos, surgiram as primeiras marchas do orgulho em Nova York, um ano depois.
Agora que o mês do orgulho está a acabar — mas o orgulho dura todo o ano —, é indiscutível que a imagem que reina nas manifestações são as bandeiras arco-íris. Sabemos como começaram as manifestações, mas sabemos como surgiu a primeira bandeira?
Do céu à terra, de bandeira ao vento
Embora as marchas pelos direitos LGBT tenham começado oficialmente em 1970, a bandeira arco-íris que tanto as representa somente apareceu oito anos depois, no dia 25 de junho, na marcha de São Francisco pela Liberdade Gay e Lésbica. A simbologia e importância da bandeira como sinal gráfico são inegáveis e, se há quem o saiba, são os designers e ativistas. Ora, assim, com certeza não é surpreendente quando descobrimos que a primeira bandeira LGBT foi pensada por um ativista político e designer: Gilbert Baker. A inspiração de Baker foi a universalidade do arco-íris já que este é “a bandeira natural vinda do céu”. Um símbolo de liberdade, de amor e comunidade, materializada originalmente em oito listras de diferentes cores, cada uma com o seu significado: rosa, como símbolo de sexo; vermelho, simbolizando a vida; laranja como símbolo da cicatrização [healing]; amarelo, que simboliza a luz do sol; verde, pela natureza; turqueza para a magia; azul, a simbolizar a serenidade; e roxo, como símbolo do espírito. Atualmente, a versão mais conhecida da bandeira foi reduzida a seis cores, eliminando a presença do rosa e turquesa.
Depois de desenhada, era preciso fabricar a bandeira, Gilbert Baker. Desta forma, o ativista e designer reuniu trinta pessoas voluntárias, no Centro de São Francisco da Comunidade Gay, que tingiram as cores e coseram as bandeiras à mão para a marcha de 25 de junho de 1978. Baker, para além do céu, inspirou-se na proliferação da bandeira americana na cultura popular. Hoje, podemos atestar que a presença da bandeira LGBT é maior a nível global do que qualquer bandeira de qualquer país. O símbolo LGBT tornou-se universal a todas as pessoas da comunidade em todo o mundo, reconhecido por toda a gente, para lá dos limites físicos da bandeira. Hoje, temos meias, canecas, pins, capas de proteção de telemóveis, ganchos para o cabelo, todo o tipo de acessórios, peças têxteis com as riscas que tão bem reconhecemos.
A evolução gráfica da bandeira, pela inclusividade
Com o passar do tempo e a abertura para a diversidade, a bandeira original já ganhou novas versões, mantendo o esquema das riscas, sendo que a sua versão mais completa inclui uma divisão triangular à esquerda com mais cores.
Estas mudanças representam o Feminismo Interseccional: uma abordagem feminista que tem em conta os diferentes sistemas de opressão. Assim, reconhece, analisa e questiona os diferentes privilégios sócio-económicos e geográficos, lutando contra discursos anti-LGBT, a desigualdade de oportunidades económicas, o machismo, o racismo, o capacitismo, a xenofobia e a ocupação indevida de territórios, estudando e explicando como todas estas questões se correlacionam.
Ora, em 2017, Amber Hikes acrescentou, na horizontal, uma risca preta e outra castanha, de forma a incluir a diversidade racial.
No ano seguinte, Daniel Quasar propôs uma alteração na bandeira, utilizando as seis cores horizontais presentes antes da proposta de Hikes, mas agora com uma divisória triangular à esquerda, onde se podem observar as cores de Hikes, da luta anti-racista, e as cores da bandeira do orgulho trans, desenhada por Monica Helmes em 1999. Deste modo surgiu a “Progress Pride Flag”.
Em 2021, Valentino Vecchietti, da Intersex Equality Rights UK, propôs que se incorporasse as cores da bandeira intersexo e daí nasceu a versão mais completa usada recorrentemente nas Marchas de Orgulho.
Há outras derivações da bandeira que são usadas, porque, se há sentimento que deve existir na comunidade LGBTQIA+, é a liberdade inclusiva na diversidade.
O Orgulho é do Povo: a Marcha do Orgulho no Porto e na Hungria
No sábado passado, dia 28 de junho, no Porto, aconteceu a marcha do Orgulho LGBTQ+. Centenas de pessoas manifestaram-se na rua, com alegria, orgulho e entreajuda. Enquanto o sol forte nos batia na pele, no nosso suor de luta e alegria via-se o arco-íris. Numa manifestação sem qualquer financiamento direto da câmara — contando apenas com o “apoio logístico via Ágora [empresa municipal de Cultura e Desporto]” — , esta marcha aconteceu com a organização incrível da Orgulho Porto, com uma equipa preocupada em zelar pelo bem-estar de todas as pessoas participantes, pelo fluxo de pessoas, com refúgios seguros para descansar durante a marcha, microfone aberto para quem o quisesse, e até postos de apoio para pessoas neurodivergentes. Por isso, deixo aqui os meus sinceros parabéns à organização da marcha, que realmente permitiu que a comunidade se manifestasse de forma segura, alegre e confortável, mesmo debaixo do sol ardente. Quanto à deplorável falta de investimento da câmara neste evento de tão elevada importância, penso que já demonstrei a minha opinião através da escolha do primeiro adjetivo desta frase.
Numa segunda nota de louvor,na Hungria, centenas de milhares de pessoas numa marcha de Orgulho que havia sido proibida pelo governo. eguindo a ideologia falaciosa anti-LGBT, o governo havia declarado essa proibição, usando como argumento que “poderia ser prejudicial para as crianças”. Este país, embora pertencendo à União Europeia, não segue as diretrizes de direitos LGBT declarados pela mesma. Assim sendo, o facto da Marcha do Orgulho LGBT ter acontecido com esta dimensão há-de ser para sempre um marco histórico.
A diversidade sempre existiu e sempre existirá, mesmo que façam de conta que não existe, mesmo que fechem os olhos, mesmo que a tentem ignorar. E se ser LGBT+ é contra os desígnios do Deus em que vocês acreditam (castrador, vingador do Antigo Testamento — vítima de traduções mal feitas conforme os contextos históricos ao longo dos tempos —, e não o Deus que propaga o amor), bem que o inferno vai ser um céu do caraças, cheio de arco-íris e boa companhia.
Com orgulho, de mão dada à minha namorada,
Clara
Fonte de informação sobre o design da bandeira original: https://www.moma.org/collection/works/192373