Qualquer pessoa que tenha em casa uma biblioteca, por pequena que seja, já teve de responder à fatídica pergunta do visitante que, intrigado pela razão e utilidade de tantos volumes, pretende saber quantos é que já lemos. A resposta “menos de metade”, que é a mais equilibrada e, com toda a probabilidade, a mais honesta, apazigua-o porque vê nos outros livros, os que ainda não foram lidos, provas de um arrogante exibicionismo intelectual do qual ele, filisteu impenitente, se encontra a salvo. Afinal, para quê ter tantos livros em exposição quando se leu menos de metade?
Haverá alguma justeza nesse raciocínio contabilístico e eu próprio, ao contemplar a minha modesta biblioteca, já me perguntei se preciso mesmo daqueles livros ou se não faria melhor em doar alguns a uma biblioteca pública ou a algum jovem e ávido leitor. Acontece que os livros que ainda não lemos e mantemos perto de nós são possibilidades em aberto. Tê-los à mão tranquiliza-nos, como se renovássemos em permanência a promessa de que um dia ainda os iremos ler. Esse dia poderá nunca chegar, mas um livro por ler, arrumado na estante, conta também a história das aproximações e recuos, da procrastinação e olímpicas desatenções, que é, em parte, a coroa da nossa vida de leitores.
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