Economia

Fevereiro de 2014: como a seguradora Tranquilidade foi posta no "prego"

BES explica ao Banco de Portugal que quer vender parte do BES Investimento em Bolsa no Brasil, bem como parte da BES Vida, o que nunca cumpriu. E que pode fazer um aumento de capital, que de facto aconteceria. A Tranquilidade foi avaliada pelo BESI em muito mais do que valia - e essa história também acabaria mal.

Documento: Carta Data: 12 de fevereiro de 2014 De: Banco Espírito Santo Para: Banco de Portugal, Pedro Duarte Neves (vice-governador)

 

As cartas continuam a trocar-se a uma velocidade vertiginosa no mês de fevereiro, por causa do pagamento do papel comercial. Está definida a provisão de 700 milhões de euros, que cobre os pagamentos dos clientes de retalho em Portugal - os institucionais ficam desprotegidos porque o Banco de Portugal considera que tem sofisticação suficiente para saberem os riscos do que compram e os de retalho no estrangeiro também ficam de fora porque o Banco de Portugal considera que estão perante outras jurisdições de supervisão. Na verdade, há quem depois venha dizer que o Banco de Portugal estava apenas preocupado com questões de reputação do BES, pelo que só os clientes de retalho em Portugal o preocupavam. Os outros, mesmo que reclamassem, não tinham capacidade de gerar instabilidade na relação de confiança generalizada dos depositantes em relação ao BES.

Em carta de dia 12 de fevereiro de 2014, o BES responde a questões anteriores do Banco de Portugal, colocadas por carta no dia 4 do mesmo mês. "Para fazer face ao montante em dívida a 13 de fevereiro, 799 milhões €, a ESI está a executar um plano de deleverage", o célebre plano que está sistematicamente a ser invocado, mas que nunca seria executado completamente.

É nesta carta que fica escrito que a seguradora Tranquilidade foi dada como garantia para uma linha de crédito do BES à ESFG para reembolsar o papel comercial: "Caso a ESFG não regularize essa dívida perante o BES no prazo de 30 dias, o BES acionará o mandato irrevogável de venda da Companhia de Seguros Tranquilidade", que por sua vez "foi avaliada, a 30 de junho de 2013, por 899 milhões € pelo BES Investimento, tendo-se considerado no processo ETRICC prudente utilizar um valor de referência de 700 milhões €". Esta história acabaria mal. Primeiro, porque a Tranquilidade não valia nem 899 nem 700 milhões de euros, como se veria quando acabou por ser vendida, no último dia de julho seguinte. Depois, porque seria descoberto que a própria Tranquilidade investiria em papel comercial do GES, intoxicando-se, portanto.

Juntamente com esta carta, o BES envia um parecer do jurista Alexandre Mota Pinto que dá como boa a garantia soberana de Angola - garantia esta que cairia a 4 de agosto, sem benefício para o BES.

Embora as contas do BES não fossem contaminadas, nesta altura, pelas provisões para pagar o papel comercial, havia riscos de que os rácios mínimos de capital não fossem cumpridos. Para contornar esse risco, o BES informa que está a planear vender parte do BES Investimento em Bolsa no Brasil (o que nunca aconteceu) e fazer uma venda parcial da BES Vida (o que a equipa de Ricardo Salgado também não cumpriu). Além disso, "será possível realizar um aumento de capital do BES no mercado". De facto, assim seria, já em Junho: mil milhões de euros entraram no BES, injeção de capital garantida por investidores... que perderiam tudo.

 

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