Economia

Manuel Pinho: aceitar um cargo político “foi um erro enorme”

Antigo ministro da Economia de José Sócrates mostra-se arrependido de ter entrado na política. Pinho lançou página na Internet para se defender das acusações do Ministério Público. E anunciou que irá lançar um livro intitulado "Confinado"

Manuel Pinho reside em Alicante e nos últimos anos tem viajado pelos EUA, China e Austrália
Luís Barra

O antigo ministro da Economia Manuel Pinho, arguido no processo EDP, sob suspeitas de ter sido corrompido para favorecer a elétrica, divulgou na Internet a sua declaração inicial no interrogatório da última semana no Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), reiterando que não favoreceu a EDP e mostrando-se arrependido de ter aceitado ser ministro durante o primeiro Governo de José Sócrates, entre 2005 e 2009.

Ter aceitado exercer um cargo político "foi um erro enorme", aponta Manuel Pinho. "Além dos custos que eu e a minha família tivemos de suportar em termos financeiros (empobreci muito na política, ao contrário de enriquecer) e de exposição pública, posteriormente a minha vida nunca mais foi a mesma, tendo levado a um confinamento que já leva nove anos", declara o antigo ministro, num site que criou para promover a sua defesa.

Nesse espaço, além de revelar que está a preparar o lançamento de um livro intitulado "Confinado", Manuel Pinho diz estar a ser alvo de uma campanha difamatória.

"Vivo confinado em resultado de estar a ser investigado há nove anos sobre supostos favorecimentos à EDP em 2007, quando fui ministro (2005- 2009) e da campanha difamatória de que fui (e sou) alvo. Como irá verificar, o processo envolve situações que não teriam lugar durante o Estado Novo", lamenta Pinho.

O antigo ministro publicou as declarações que proferiu em interrogatório no DCIAP. "Durante os 9 anos de duração deste inquérito vivi uma situação de verdadeiro confinamento, o que implicou ter de estabelecer residência no estrangeiro sem um visto de residência permanente, ter visto cada mais limitadas as minhas relações sociais em Portugal, ter de dar explicações sempre que preciso de abrir uma conta num banco ou obter um visto para viajar e enorme dificuldade, ou mesmo impossibilidade, de trabalhar", declarou.

No mesmo documento, revela ter sido em 2013 confrontado por um jornalista com a sua declaração de rendimentos de 2012. "Uma vez confrontado com esta situação que nunca teria lugar num Estado de Direito, solicitei à Autoridade Tributária fazer uma investigação interna para apurar o responsável (ou responsáveis) pela quebra do meu sigilo fiscal. Para minha surpresa e do então meu advogado, fui informado pela AT que o Ministério Público tinha pedido a quebra do meu sigilo fiscal devendo ser por essa via que foi parar à imprensa", descreve Pinho.

O antigo ministro nega, na sua defesa, a tese de que a sua ida para o Governo de Sócrates foi uma ideia de Ricardo Salgado para defender os interesses do Grupo Espírito Santo na EDP (onde o BES teve durante anos uma participação de pouco mais de 2%), e de que a ascensão de António Mexia na EDP (da qual saiu em 2020) foi determinada por Salgado.

"Ricardo Salgado não teve rigorosamente nada a ver com a nomeação de António Mexia. Zero. Não vale a pena irem por aí porque não vão chegar a lado nenhum. Há muitas testemunhas que o podem confirmar. Isto quer dizer que Ricardo Salgado e o BES não têm rigorosamente nada a ver com o caso EDP, que diz respeito a supostos favorecimentos que nunca existiram", refere Pinho.

O antigo ministro acusa ainda o Ministério Público de protelar uma investigação que "nada" tinha para acusar os investigados, mesmo quando foram feitas buscas e constituídos arguidos, há quatro anos.

"Os senhores procuradores sabem melhor do que ninguém que constituíram arguidos apenas porque queriam parar o que, no vosso entender, eram os prazos de prescrição e ter tempo para ir buscar material a notícias publicadas na imprensa e nas redes sociais e a outros processos em investigação de maneira a criar um caso. Nas 39 páginas do despacho de indiciação que me entregaram em 2019, há 21 referências a artigos publicados na imprensa! Ou seja, debitam informação maliciosa e mentiras à imprensa, ela publica o que lhes dão e vocês usam isso como meio de prova", acusa Pinho.

Na sua intervenção, onde recupera vários argumentos já esgrimidos no passado para defender que a EDP não foi beneficiada no regime dos CMEC (Custos para a Manutenção do Equilíbrio Contratual), Manuel Pinho não dá explicações sobre um dos pontos das suspeitas do Ministério Público, que são os recebimentos de que era titular, através de uma conta bancária de uma empresa no Panamá, com pagamentos mensais provenientes da ES Enterprises, o chamado "saco azul" do Grupo Espírito Santo.

Pinho faz apenas uma referência para defender que não recebeu pagamentos indevidos. "Posso garantir que não recebi um euro indevido do BES. Sobre quaisquer pagamentos que em concreto me tenham sido feitos, continuo à espera que me mostrem os documentos que os titulam, o que os meus advogados requereram em 19/09/2019 e em 30/10/2019, sem resposta até hoje, mas não quero deixar de dizer que nunca recebi nada que não me fosse devido", declarou.