Economia

Concurso feito à medida? Autoridade da Concorrência pressiona Governo sobre IVAucher

O Governo lançou um programa de promoção do consumo, a Autoridade da Concorrência temeu que a SIBS ficasse com o processo e pediu um concurso. O Governo fez o concurso. Agora, o regulador continua a ter dúvidas sobre se não há um fato à medida

Margarida Matos Rosa, presidente da AdC
TIAGO PETINGA/Lusa

A Autoridade da Concorrência (AdC) voltou a colocar pressão sobre o Governo relativamente ao programa IVAucher, criado para a promoção do consumo em Portugal. Se em novembro lançou recomendações, para que este programa não ficasse exclusivamente nas mãos da SIBS, agora, a entidade volta a posicionar-se com dois alertas enviados ao Ministério das Finanças. O receio continua a ser o mesmo.

Depois das recomendações deixadas em novembro, o Governo, através da Autoridade Tributária e Aduaneira, decidiu lançar um concurso público internacional para obter os serviços que permitem a implementação do programa IVAucher (os consumidores que façam gastos em alojamento, cultura e restauração poderão acumular o valor de IVA aí pago para depois o utilizarem em novo consumo nesses mesmos sectores).

Só que o concurso utiliza critérios que levantam dúvidas à entidade presidida por Margarida Matos Rosa, nomeadamente por avaliar positivamente a dimensão da rede e a abrangência de terminais de pagamento automáticos, bem como “a abrangência de cartões de pagamento aceites”. “Diferentes stakeholders terão destacado que os critérios de adjudicação definidos os colocam numa posição de desvantagem concorrencial face ao operador com sistema de pagamentos local (SIBS)”, sublinha a Autoridade da Concorrência, pedindo critérios menos restritivos.

O Jornal de Negócios já tinha escrito que os critérios de seleção do concurso afastaram empresas de pagamento que tinham mostrado interesse em participar, como a Mastercard e a Revolut. Segundo a AdC, uma empresa, a Viva Payments Services, dirigiu uma carta a João Leão e ao secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, sobre este tema. A SIBS é quem controla, na sua quase totalidade, a rede de terminais em Portugal.

Daí que esta autoridade peça a João Leão para “se avaliar do impacto dos critérios de adjudicação centrados no número de POS/TPA e de cartões centrados num único esquema, em termos do seu impacto na concorrência, quer no procedimento concursal, quer em termos da abertura da solução a contratar”.

João Leão recebe, pela segunda vez em dois meses, alertas da Autoridade da Concorrência sobre o programa IVAucher
tiago miranda

Outro alerta deixado pela AdC é que, nas condições do concurso, “não estão previstas obrigações que visem assegurar a compatibilidade do programa IVAucher com diferentes sistemas de pagamento”.

Esta questão coloca problemas aos comerciantes, que podem ver-se obrigados a mudar de prestador de serviço do seu terminal de pagamento automático. A AdC dá um exemplo: “num cenário em que a operacionalização do IVAucher se limite à rede Multibanco (ou outra), um comerciante utilizador do programa IVAucher terá que assegurar que o seu TPA aceita pagamentos Multibanco (ou de outra rede)”.

Do ponto de vista dos contribuintes, também só podem beneficiar do desconto proporcionado pelo programa se utilizarem cartões de pagamento compatíveis com o sistema escolhido. “Tal pode levar a um desvio de transações de um sistema de pagamentos para outro, na medida em que uma fração relevante dos consumidores pode passar a privilegiar a utilização de cartões do sistema que lhes permite aceder ao programa IVAucher, em detrimento de outros”, alerta a AdC.

Não há ainda data para o arranque do programa, já que o concurso terminou apenas a 23 de janeiro.