Economia

Autoridade da Concorrência com receio do IVAucher: não pode depender só do Multibanco

Entidade deixa três recomendações para que operacionalização do programa de estímulo ao consumo, previsto no Orçamento do Estado para 2021, não dependa unicamente de cartões bancários (nem da SIBS nem do seu Multibanco e, portanto, da banca tradicional)

Margarida Matos Rosa, presidente da AdC
TIAGO PETINGA/LUSA

Há um programa de estímulo ao consumo no próximo ano, mas não pode ser feito em circuito fechado. Deve haver um esforço para que nem tudo dependa da SIBS, detida pelos bancos nacionais, nem do seu Multibanco. Esta é uma preocupação demonstrada pela Autoridade da Concorrência em relação ao programa IVAucher, criado na proposta de Orçamento do Estado para 2021, com vista à promoção ao consumo de serviços de alojamento, cultura e restauração.

O que é o IVAucher não é novo: os consumidores que façam gastos em alojamento, cultura e restauração poderão acumular o valor de IVA aí pago para depois o utilizarem em novo consumo nesses mesmos sectores. Porque se preocupa a Autoridade da Concorrência? “A operacionalização da medida irá envolver instrumentos de pagamentos, nomeadamente cartões bancários e, consequentemente, terminais de pagamento disponíveis nos operadores económicos ativos nas atividades abrangidas pela norma”.

Por isso, “considera-se relevante que, na implementação do programa IVAucher, se opte por soluções abertas aos diversos meios/instrumentos de pagamento, reduzindo-se as barreiras à entrada e à inovação no setor”, segundo os comentários feitos pela entidade presidida por Margarida Matos Rosa. Aliás, a Autoridade da Concorrência recebeu já uma participação – de um operador não identificado – que lança alerta sobre esse receio, já que deveria ser assegurada neutralidade tecnológica na contratação pública. E a ideia é que o sistema possa favorecer o "sistema fechado" entre SIBS e Multibanco.

Três recomendações

A entidade presidida por Margarida Matos Rosa deixa três recomendações, que têm destinatários óbvios: não só os deputados que fazem as propostas de alteração à proposta de Orçamento do Estado, como também o Governo, que o criou. A primeira recomendação avisa que se for preciso ajuda para implementar o sistema, então deve procurar-se no mercado quem possa fazê-lo, e, aquando da contratação da entidade, o sistema criado não pode ter barreiras a vários participantes.

Assim, recomenda a entidade, o programa desenvolvido tem de ser compatível com vários prestadores de serviços de pagamentos. E há mais: nem tudo deverá depender de cartões bancários. “Recomenda-se que se equacione da proporcionalidade de implementar o programa IVAucher alargando-o à utilização de instrumentos de pagamento alternativos aos cartões bancários, como sejam os assentes em novas tecnologias digitais disponibilizadas por operadores fintech”. Uma das sugestões deixadas é, por exemplo, haver transferências bancárias, já que, aí, pode abarcar mais prestadores.

Um histórico de alertas

Tudo isto porque, entende a Autoridade da Concorrência, “a indústria dos pagamentos com cartão em Portugal funciona como um ecossistema fechado, centrado na SIBS e na rede Multibanco” - aliás, já há recomendações para a mudança deste panorama desde 2018.

Ainda recentemente, Margarida Matos Rosa defendeu que há “barreiras significativas à entrada e ao desenvolvimento” de fintechs na área de pagamentos em Portugal.

A SIBS, detida pelos grandes bancos portugueses, tem defendido que desmantelar o atual sistema nacional vai torná-lo dependente de grandes operadores como a Visa e da Mastercard, defendendo que nunca colocou entraves à entrada de operadores, e que fintech com produtos credíveis e funcionais conseguem ser bem-sucedidas.