Os partidos decidiram ontem aprovar uma norma no Orçamento do Estado, do PCP e do PAN, que prevê a suspensão dos concursos para a obra da linha circular no metro de Lisboa e, em alternativa, estudar a possibilidade de expandir o metro para Alcântara e Loures. Uma decisão que o ministro que tutela a pasta, João Pedro Matos Fernandes, espera ainda que seja “corrigida” pelo PSD. Trata-se de uma decisão “irresponsável e de uma grande ingerência no que é o poder executivo do Governo”, diz em conversa com o Expresso.
Contas feitas, diz o ministro, são 83 milhões de euros de perda de fundos. Mas a maior perda é o facto de não poder haver qualquer obra no metro até pelo menos 2023. A explicação passa pelo facto de este quadro comunitário prever que os fundos têm de ser investidos até ao final de 2023, com esta decisão não só haverá perda destes fundos já alocados como não poderá haver alternativa neste quadro comunitário, argumenta o governante. “É trocar isto por zero. Não haverá qualquer possibilidade de fazer qualquer obra no Metro de Lisboa”, afirma.
Com os concursos já lançados, esta decisão pode também provocar, afirma o Governo, o pagamento de indemnizações até porque já foram iniciados “processos de expropriação”.
A verdade é que, no Governo, levantam-se dúvidas jurídicas sobre a legalidade desta aprovação pelo Parlamento, uma vez que a realização deste tipo de obras é poder exclusivo do Governo. O ministro do Ambiente recusa entrar nestas querelas jurídicas para se focar apenas na questão política de pressão sobre o PSD: “Há ainda um dia para corrigir” a votação, espera. Para o ministro dos sociais-democratas parecem estar esquecidos de quando foram governo e sobre o que isto significa enquanto ingerência nas competências do Governo.
A decisão do Parlamento terá sequência: “A ir para a frente a proposta sobre suspensão das obras do metro de Lisboa, o grupo parlamentar irá suscitar a sua inconstitucionalidade junto do Tribunal Constitucional”, diz fonte do grupo parlamentar ao Expresso.
Num primeiro momento, tanto da parte do Governo como da parte do PS a pressão foi direta para o PSD, que aprovou as propostas do PCP e do PAN. Rui Rio, que deu uma conferência de imprensa sobre a proposta do IVA da eletricidade, respondeu dizendo que não “entra na dramatização” do Governo sobre este assunto e remeteu os pedidos do executivo “para os parceiros”, já que foram eles que apresentaram a proposta.
Já Matos Fernandes não esquece o PAN por defender o combate às alterações climáticas e depois propor uma obra que vai ser essencial para o transporte público e reduzir as emissões de carbono: “acabam por torpedear esse combate às alterações climáticas”, afirma. Matos Fernandes crítica o PAN e como este partido terá de ter “duplo pudor” quando falar de combate às alterações climáticas.
Medina: “Estão a fazer um disparate para nada”
Os socialistas falaram a várias vozes esta manhã, pressionando para um eventual recuo do PSD numa eventual nova votação ainda do Orçamento. O presidente da Câmara de Lisboa foi uma dessas vozes, clamando que os fundos perdidos não poderão ser usados para a expansão da linha vermelha em vez da linha circular.
O debate já leva anos na Câmara de Lisboa: linha circular ou expansão do metro até Loures e Alcântara. Fernando Medina, presidente da Câmara de Lisboa, diz que quer as duas, mas primeiro a linha circular e depois a expansão da linha vermelha. O autarca foi confrontado com a decisão do Parlamento de suspender a linha circular para estudar a possibilidade da expansão e deixa o aviso claro: o “disparate” de suspender o lançamento da obra não permitirá a alternativa, disse ao Expresso.
“Os fundos afetos ao Metro de Lisboa não poderão ser para mais nada. Não há possibilidade temporal" de fazer projetos e alterar tudo a tempo de nova candidatura aos fundos, diz ao Expresso. “É uma decisão altamente prejudicial para o transporte público; é desprovida de qualquer sentido. A não realização da linha anula tudo. Não permite a transferência dos fundos”, acrescenta.
A proposta do PAN e do PCP para suspender a linha circular tem agregada a ideia de estudar a alternativa da linha vermelha que, diz Medina, já estará incluída no plano de investimentos da Área Metropolitana de Lisboa, acordado com o Governo. Pelo que uma coisa não é oposta à outra, defende.
Em causa estão não só os 83 milhões de fundos comunitários, como as indemnizações que terão de pagar a quem se apresentou a concurso. São três as empresas que o fizeram e que estão válidas. Caso tenham de ser pagas indemnizações, tal eleva a factura desta suspensão para mais uns milhões: “É preciso perceber a dimensão do disparate... para nada”, diz, pedindo ao PSD uma “reflexão que leve a evitar este conflito político e jurídico”.
PCP e PAN “nunca contaram com a irresponsabilidade do PSD”
O assunto tomou a manhã no Parlamento. Ana Catarina Mendes, líder parlamentar socialista, marcou uma conferência de imprensa para criticar duramente o “desnorte total do PSD”. “Não pensam nos milhares de pessoas que usam transportes públicos”, afirmou.
Para a socialista, esta decisão do PSD de votar favoravelmente as propostas do PCP e PAN travando os concursos em curso, mostra que o partido não tem um projeto para o país.
Questionado sobre se as críticas não são estendidas aos partidos que propuseram a suspensão, Ana Catarina defende a posição do PCP e do PAN ao terem legitimidade para apresentar propostas para o seu eleitorado, e que, seguramente, “não contavam com a irresponsabilidade do PSD”. reforçou.