Economia

Morreu Paul Volcker, o economista que enterrou o padrão-ouro e domou a inflação nos EUA

O economista norte-americano Paul Volcker faleceu este domingo em Nova Iorque aos 92 anos, apenas quatro meses depois de ver 'flexibilizada' a 'regra Volcker' de aperto das atividades bancárias especulativas

Mike Segar/Reuters

Morreu este domingo em Nova Iorque Paul Volcker, o economista que marcou a política monetária e de supervisão dos Estados Unidos em três momentos-chave nos últimos cinquenta anos.

A sua carreira publica em altos cargos atravessou quatro presidentes norte-americanos bem diferentes. Foi subscretário de assuntos Monetários de Nixon, tendo inspirado o abandono do padrão-ouro, presidente da Reserva Federal nas Administrações de Carter e Reagan, conseguindo fazer cair a inflação de quase 15% para menos de 4%, e conselheiro de Obama na regulação apertada dos vícios especulativos da banca norte-americana que haviam conduzido à crise financeira de 2008.

O economista faleceu com 92 anos, apenas quatro meses depois de ver 'flexibilizada' por entidades da atual Administração - a Federal Deposit Insurance Corporation e o Comptroller of the Currency - a regra que foi batizada com o seu nome ('regra Volcker') e inserida na lei Dodd-Frank de regulamentação de Wall Street depois da crise financeira de 2008.

A regra Volcker com Obama

Esta 'regra' foi o terceiro grande momento da carreira de Volcker, um economista que media mais de dois metros (a sua alcunha na escola era o "gigante Paul"), sobressaindo em qualquer foto com outros banqueiros centrais ou ao apertar a mão aos presidentes na Casa Branca.

Em 2008, ele apoiou a candidatura de Obama e de 2009 a 2011 presidiu ao Economic Recovery Advisory Board. Na parte final da sua carreira, ele inspirou esta regulamentação mais apertada do sector bancário. A 'regra' com o seu nome separou as atividades bancárias comerciais das de investimento e vedou à banca comercial o envolvimento em atividades especulativas de alto risco.

O enterro de Bretton Woods

No entanto, ele considerou que o momento "mais importante da carreira" foi o ter inspirado a decisão tomada por Nixon em agosto de 1971 de abandono do padrão ouro como referência de conversão do dólar (então, o preço da onça de ouro mantinha-se em 35 dólares desde 1934).

Esta decisão foi a primeira machadada, também, nas regras do mercado cambial mundial instituídas em 1944, e que ficaram conhecidas como "sistema de Bretton Woods" (do local da conferência internacional de 44 nações aliadas na guerra contra o nazismo e o imperialismo japonês, onde os pontos de vista de Washington venceram os de Keynes à frente da delegação britânica). O sistema seria enterrado em 1973 ao ser substituído por um regime flutuante de câmbios.

Domador de uma inflação de dois dígitos

O segundo momento chave da carreira de Volcker ocorre entre 1979 e 1987, quando assumiu as rédeas da Reserva Federal (Fed, o banco central norte-americano).

Com a inflação a disparar - chegaria a um pico de 14,6% em fevereiro de 1980 -, Volcker começou a subir a taxa diretora do banco central, encarecendo o custo do dinheiro. Em março de 1980, a taxa subiu para 20%. Com vários ziguezagues, de descidas e subidas, a taxa voltaria a 20% em dezembro daquele ano e, depois, ainda em fevereiro e maio de 1981.

O aperto da política monetária implicaria duas recessões da economia norte-americana - uma de janeiro a julho de 1980 e outra de julho de 1981 a novembro de 1982 -, mas Volcker acabaria por vencer a inflação, que cairia do pico de quase 15% no início de 1980 para 3,8% em dezembro de 1982.

A crise de 1982 foi particularmente sentida no tecido da economia real, sobretudo PME. O Tennessee Professional Builder, um jornal local, foi ao ponto de colocar a cara de Volcker como se fosse um foragido, inscrevendo "Procura-se", acusando-o de ter "assassinado premeditadamente e a sangue frio milhões de pequenas empresas".

Quando terminou o segundo mandato à frente da Fed, em agosto de 1987, deixou uma herança de 4% de inflação a Alan Greenspan.

Volcker estudou nas Universidades de Princeton (licenciatura em 1949) e Harvard (mestrado em 1951) nos EUA. Começou a carreira pública em 1952 como economista no Banco da Reserva Federal de Nova Iorque, tendo chegado, muito mais tarde, a ser seu presidente em 1975. Também teve um carreira destacada no sector financeiro privado, começando pelo Chase em 1957.

Era membro da Comissão Trilateral (de que foi co-fundador) e do Clube de Bilderberg, dois lóbis mundiais com influência geopolítica.