A questão parece sempre repetir-se sem nunca perder a capacidade de gerar discussões apaixonadas: o que nos aguarda? Prever o futuro já não é bem um exclusivo de Nostradamus ou de videntes de Feira Popular, com a mais detalhada análise geopolítica e económica a ser muitas vezes capaz de traçar um retrato assustadoramente fiel ao que se vai passar. Não estamos no domínio das ciências exatas, as surpresas estão sempre ao virar da esquina e podem mudar por completo um cenário previsível. Mas acredite que, quem está nos bastidores, já tem ideias formadas (e fundamentadas) do que se vai passar.
Previsões que foram dadas a conhecer no “Empower Results Day”, um evento da consultora AON. Em Portugal, o certame contou com o apoio do Expresso para divulgar os resultados da edição 2017 do “Global Risk Management Survey” (que pode conhecer melhor nas infografias que pode consultar nestas duas páginas). O “receio das empresas é não saber o que está do outro lado” explicou Gonçalo Costa Andrade, diretor de cloud da IBM Portugal a quem preocupa “a falta de visão dos temas de segurança” quando acionamos a todo o instante permissões no telemóvel sem pensar duas vezes.
De acordo com o estudo, o custo médio anual de um ciberataque subiu para $9,5 milhões (€8,08 milhões), um aumento de 21% face ao ano passado e todos os indicadores apontam para um agravamento da situação. “O cibercrime neste momento é uma indústria”, garante o coordenador do Centro Nacional Cibersegurança, Pedro Veiga, onde alguns “países estão-se a especializar”. Portugal, por exemplo, já teve ataques de ransonware — em que se mantêm dados “reféns” a troco de dinheiro — em hospitais mas até agora “ainda nenhum pagou” porque estavam preparados. “As empresas têm que perceber como se querem defender”, aconselha a diretora-geral da Cisco em Portugal, Sofia Tenreiro, até porque hoje “a privacidade é um tema relativo comparativamente a gerações mais maduras”.
Os mais novos, ou millennials, são uma das forças motoras do desenvolvimento tecnológico e novas necessidades dos clientes. Defende o CEO do grupo dst, José Teixeira, que “temos de desenvolver um processo de normalização da inovação, de cima a baixo”. Parte da solução estará no estímulo de uma “cultura de conhecimento” que ajude também na necessidade de “surpreender constantemente o cliente”. É urgente a criação de “mecanismos económicos para dar nova vida aos materiais”.
O ecossistema entre universidades, grandes nomes e startups foi também destacado por António Portela, CEO da Bial, para quem a menor regulação para novas empresas e novas soluções no campo “da inteligência artificial” podem ajudar “a acelerar imenso a parte inicial da fase de testes” de produtos farmacêuticos. Se a regulação é por vezes excessiva, a certeza é que “temos sempre que testar”. Não inovar é o maior risco para estas empresas e lembra o presidente do InvestBraga, Carlos Oliveira, que muitas vezes uma das soluções “é comprar startups” para incorporar novos modelos de negócio. Importa recordar que “quem está ligado às universidades vence nos mercados” e é preciso “aproveitar esta onda a médio e longo prazo com mais formação”.
Pneu de autocarro
Trata-se do famigerado talento, cuja atração e retenção é um dos grandes riscos que as empresas enfrentam. O estudo divide-se ente fatores económicos, demográficos, políticos e do local de trabalho para explicar as diferentes nuances desta questão e como ela está a afetar o tecido empresarial. Entre o acelerado envelhecimento da população, que significa que não se consegue substituir aqueles que saem, ou as diferentes expectativas das gerações mais jovens, há muito por discutir. Para a diretora de Recursos Humanos da REN, Elsa Carvalho, é importante, por exemplo, “formar equipas multidisciplinares de diferentes faixas etárias” para oferecer “mais diversidade” e é muito importante “não procurar só um certo tipo de talento”.
O dream chief officer da Might, Tiago Forjaz, não tem dúvidas que “qualquer indústria de serviços vai sempre depender muito das pessoas que estiver lá dentro”. Comparou estar obcecado só com performance e reconhecer potencial como “tentar mudar o pneu de um autocarro em andamento”. Já Paula Ferreira Borges partiu da sua experiência enquanto diretora e coordenadora de Capital Humano do Novo Banco para contar como teve que “perceber quem eram os talentos” na empresa num “trabalho de enorme transparência” para com os colaboradores. E para a responsável esse tem que ser o primeiro passo: “Tratá-los com respeito.”
Algo que parece estar cada vez mais em desuso no volátil quadro geopolítico da atualidade, desde o sudeste asiático à nossa porta, na Catalunha. É na expansão do papel da União Europeia que o eurodeputado Paulo Rangel encontra uma das razões para esta vaga de separatismo e isolacionismo na pergunta: “Se eu tenho Bruxelas, porque preciso de ir a Madrid?” Um “efeito natural da globalização” que pode mudar o equilíbrio de “500 anos de uma península, dois estados” e, consequentemente, a nossa importância. E isto “não vai parar por aqui”, atira, referindo-se inclusive aos efeitos imprevisíveis do dínamo Trump.
“Ninguém sabe de manhã o que vai acontecer à tarde”, diz o gestor ex-ministro Jorge Coelho, para referir-se ao presidente norte-americano. “O mundo está muito perigoso e com algumas pontas de loucura” e sem “forças armadas capazes na Europa” (além do Brexit) pede-se mais do que nunca “uma França e Alemanha fortes.” Se Portugal, em termos empresariais, “até pode beneficiar de regiões com mais autonomia” vê-se num mundo que não merece otimismo. Tendências que levam o CEO da AON em Portugal, Pedro Penalva, a afirmar que “é neste quadro de dissonância que vamos ter que atuar”.
Textos publicados orignalmente no Expresso de 7 de outubro de 2017