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Carga fiscal penaliza aforro

Fisco. Com o país a precisar de equilibrar as contas, os rendimentos de capital não escapam ao aumento de imposto.

Sofia Santos e Isabel Vicente (www.expresso.pt)

Já não há retorno. Os rendimentos sobre o capital vão sofrer agravamentos já este ano e também no próximo ano.

A medida anunciada pelo Governo era até expectável: depois de se pedir aos portugueses muitos sacrifícios, com cortes indiretos e diretos no rendimento disponível - perdas de subsídios, mais agravamento do IRS, aumento de impostos -, a tributação sobre os produtos de poupança era inevitável. O rol de produtos financeiros afetados pela medida recai sobre os juros pagos nos depósitos a prazo, nos Planos de Poupança Reforma (PPR), nas mais-valias em Bolsa e nos Certificados de Aforro, entre outros rendimentos de capital. Vão mesmo pagar mais IRS. E não há distinção entre residentes e não residentes, como acontece noutros países. A medida que vai ser aplicada visa amealhar mais receita para o Estado.

Os números falam por si: a aplicação de impostos sobre rendimentos de capital - a que se soma um imposto especial sobre casas de luxo - pode render ao Estado mais de €150 milhões, este ano, e €500 milhões em 2013, como referiu no Parlamento o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio. Disse ainda que este é "um agravamento como nunca aconteceu".

Esta medida surge depois dos portugueses mostrarem que confiam nos bancos. O valor de depósitos disparou em 2011, reflexo da conversão de aplicações com menos liquidez em depósitos. Isto porque os depósitos são um investimento protegido pelo fundo de garantia e mais líquido. Apesar disso, houve também maior poupança por via da retração do consumo. Hoje, porém, o nível de crescimento da poupança é menor, embora ainda positivo. Para a banca fica um recado: há que rever as subidas das taxas de juros nos depósitos, em conjugação com o Banco de Portugal, que as limitou ao patamar de 300 pontos base acima da Euribor, sob pena de a taxas mais altas os bancos responderem com capital. Os depósitos chegaram a valer 6% em termos brutos, hoje superam os 3% na melhor das hipóteses. A média dos juros praticados na zona euro são inferiores - em agosto de 2012 estavam nos 2,93% (ver gráfico abaixo).

Concorrência na Europa

Portugal optou por tributar em igual proporção residentes e não residentes (ver focos), juros e dividendos, que estão sujeitos atualmente a uma taxa de imposto sobre o capital de 26,5%. Esta taxa será aplicada retroativamente aos rendimentos de 2012, no caso das mais-valias mobiliárias, antecedendo a sua aplicação à entrada em vigor da lei que sobe a referida taxa em 1,5 pontos percentuais. No caso dos juros e dividendos entretanto distribuídos irão pagar os atuais 25%.

Tal como Portugal, apenas a República Checa, com uma taxa liberatória de 15%, e a Roménia, com 16%, aplicam a mesma taxa a todos os contribuintes, independentemente de residirem no território ou não, e a todos os tipos de mais-valia.

As restantes 24 economias que integram a União Europeia optaram por sistemas com taxas diferenciadas, como forma de atrair, por exemplo, as poupanças de estrangeiros. Na Alemanha, os juros declarados por não residentes estão isentos, enquanto os residentes pagam 26,375%.

Em Espanha, os residentes podem pagar até 27% sobre os dividendos, enquanto os não residentes pagam 21% e podem ficar isentos no que toca aos ganhos com juros. Áustria e Bélgica têm as taxas mais altas da União: são progressivas e podem chegar aos 50%. No extremo oposto estão a Bulgária e a Letónia, com um imposto máximo de 10%.

Este patamar de tributação coloca-nos entre os Estados-membros que mais tributam os rendimentos de capital, sendo que 16 países passam a ter taxas inferiores ao imposto português.

28%

Com uma taxa liberatória de 28%, em 2013, por cada €100 de juros de depósitos a prazo ou de mais-valias, €28 passarão a ir diretamente para os cofres do Estado, sob a forma de IRS. No início do ano, este valor era de €25.

Com uma taxa liberatória de 26,5% em 2012, Portugal ultrapassa os 26,36% de imposto máximo cobrado na Alemanha e mais distante ficará no próximo ano, caso o Governo suba a tributação para os 28%. Na Grécia os dividendos pagam 25%, enquanto os juros têm uma taxa progressiva até 45% para os residentes e de 40% para os não residentes. Espanha tributa até 27% os residentes e a 21% os não residentes (estão previstas isenções no que toca a rendimentos de juros).

 

Texto publicado no caderno de economia do Expresso de 13 de outubro de 2012