ARQUIVO Crise em Timor-Leste

Líder rebelde tinha um milhão de dólares no banco

Descoberta na Austrália uma conta avultada em nome de Alfredo Reinado, o rebelde morto durante um atentado contra o presidente Ramos-Horta. Aumentam os indícios sobre apoios recebidos fora de Timor.

A Polícia Federal Australiana encontrou uma conta conjunta na Austrália em nome do líder rebelde timorense Alfredo Reinado e de Angelita Pires, sua assessora e amante. A conta chegou a acumular um depósito de um milhão de dólares, soube o Expresso junto de uma fonte oficial do Estado timorense, naquele que é um dos achados mais promissores da investigação ao grupo rebelde que quase matou José Ramos-Horta num duplo atentado a 11 de Fevereiro contra o presidente Timorense e também contra o primeiro-ministro Xanana Gusmão, que acabaria por sair ileso.

 

Quando foi detectada pelos investigadores australianos, a conta apresentava um montante de 800 mil dólares - sendo que tinham sido levantados 200 mil dólares, ainda quando o major Reinado estava vivo. A informação foi prestada pela Polícia Federal Australiana ao Estado timorense e está a ser encarada como uma evidência de que Reinado recebeu dinheiro de fora de Timor para apoio das suas actividades enquanto líder de um grupo de mais de 20 rebeldes. Segundo a mesma fonte, que pediu a reserva da sua identidade, "nenhum timorense tem capacidade de dar quantias dessas a ninguém".

 

De acordo com uma fonte ligada ao aparelho judicial em Timor, Angelita Pires, uma timorense também com nacionalidade australiana, tinha na sua conta pessoal em Díli apenas 5000 dólares, sendo que todos os depósitos e levantamentos foram feitos em dinheiro. Junto do corpo de Reinado, morto a tiro pela segurança pessoal do presidente Ramos-Horta, foram só encontrados 200 dólares.

 

Onde estão os relatórios do FBI e da Austrália?

 

Apesar da quantidade de pistas que podem ser seguidas neste momento para desvendar os atentados contra as duas figuras mais importantes do país, as dúvidas sobre o bom termo da investigação judicial são, no entanto, cada vez maiores em Timor.

 

O relatório feito pelos dois agentes do FBI que foram enviados a Díli pelos Estados Unidos logo em Fevereiro ainda não foi acrescentado ao processo judicial, embora tenha sido concluído há já várias semanas. O mesmo se passa com a investigação feita pela polícia federal australiana (AFP), que decidiu enviar no próprio dia dos atentados um reforço de 70 agentes para desmontar a história dos incidentes, mas cujos resultados continuam estranhamente sem constar do processo.

 

Quer o FBI quer a polícia federal australiana estiveram a trabalhar para o procurador-geral da República, Longuinhos Monteiro, cujo perfil e cuja actuação têm sido seriamente postos em causa por diversas vezes desde que a crise político-militar em Timor entrou em erupção, em Março de 2006. Longuinhos Monteiro foi responsável há um mês pelas negociações com o sucessor de Reinado à frente dos rebeldes, o tenente Gastão Salsinha, para que se entregasse e pelos anúncios sucessivos de que estava tudo resolvido, depois de no ano passado ter sido ele a passar salvo-condutos (ilegais) a alguns homens do grupo.

 

Entretanto, a agência Lusa avançou no último fim-de-semana que dez rebeldes do grupo agora conduzido por Salsinha terão fugido para a Indonésia. A Lusa citava fontes das forças de segurança timorenses e referia que as F-FDTL (Falintil-Forças de Defesa de Timor-Leste) e a PNTL (Polícia Nacional de Timor-Leste) estão preocupadas com a possibilidade de haver uma aproximação do grupo de Salsinha a Hércules Rosário Marçal e Eurico Guterres, dois timorenses na Indonésia que aterrorizaram os seus conterrâneos nos anos 90 a soldo de generais da ala dura de Jacarta. Eurico Guterres era o chefe da milícia pró-indonésia Aitarak, responsável por boa parte dos 1500 mortos nos massacres de 1999. A notícia surgiu na sequência da revelação feita pelo Expresso de que Reinado foi apoiado a partir de Jacarta e pelas milícias em Timor Ocidental, tendo estabelecido uma ligação directa a Hércules.

 

Em entrevista ao Expresso, o presidente Ramos-Horta admitiria que tem conhecimento do envolvimento de "militares indonésios que tiveram ligações com Timor mas que agiram individualmente, e não enquanto instituição das forças armadas. Os indícios são muito fortes".