Cultura

A origem madeirense de “1917”, o filme de Sam Mendes sobre a Primeira Guerra Mundial

Foi o avô do realizador britânico que lhe contou o que era a guerra. Descendente de madeirenses, Alfred Mendes foi um dos escritores caribenhos mais importantes no século passado. As suas histórias inspiraram o neto a criar o filme que agora chega aos cinemas

François Duhamel / Universal Pictures

“A primeira vez que entendi a ideia de guerra foi quando o meu avô me contou sobre a sua experiência na Primeira Guerra Mundial.” É assim que Sam Mendes começa por explicar “1917” nas notas de produção a que o Expresso teve acesso. O filme estreia-se quinta-feira nas salas de cinema nacionais, mas o que agora transformou em ficção foi-lhe passada pelo avô quando ainda era criança. “Sempre tive um fascínio pela Grande Guerra, talvez por o meu avô me falar sobre ela quando ainda era muito jovem.”

Aos 19 anos, Alfred Mendes estava no Exército Britânico a defender as cores da bandeira real no conflito, mas a sua baixa estatura levou-o a receber uma missão diferente daquela que os seus camaradas desempenhavam. Jovem e rápido, era invisível aos olhos do inimigo e tornou-se mensageiro entre postos. Guardou as memórias desses tempo para si até à década de 1970, altura em que contou como foi mobilizado para a Guerra e serviu em França, no batalhão King's Royal Rifles. As memórias de Alfy, como ficou depois conhecido em Trinidad y Tobago, foram o ponto de partida para uma história épica agora a chegar aos cinemas.

Universal Pictures

“O nosso filme é ficção, mas algumas cenas e determinados aspetos são extraídos de histórias que ele me contou, outras foram contadas por soldados que foram seus companheiros. A ideia de um único homem a levar uma mensagem de um lugar para outro ficou sempre comigo e foi o ponto de partida para 1917.” É que apesar da ligação familiar, o realizador responsável por “007 Skyfall” frisa que “este filme não é uma história sobre o avô, mas sobre o seu espírito — o que esses homens passaram, os sacrifícios, a sensação de acreditar em algo maior que eles mesmos”.

Talvez por isso tenha decido, com Krysty Wilson-Cairns (da série “Penny Dreadful”), que a ação se centrasse em duas personagens principais — dois jovens soldados britânicos, Schofield (George MacKay, de “Capitão Fantástico”) e Blake (Dean-Charles Chapman, de “A Guerra dos Tronos”) —, que recebem uma missão aparentemente impossível. Terão de atravessar território inimigo e entregar uma mensagem que impedirá um ataque letal contra 1600 soldados, entre eles o irmão de Blake.

“1917” está nomeado para a 92ª edição dos Óscares em 10 categorias, entre as quais Melhor Filme, Melhor Realizador e Melhor Argumento Original. Foi já distinguido com dois Globos de Ouro para Melhor Filme e Melhor Realizador e tem 9 nomeações aos BAFTA.

UMA VIDA CHEIA DEPOIS DA GUERRA

Depois de sobreviver à Primeira Guerra Mundial, Alfred Mendes regressou a Trinidad y Tobago e foi nas ilhas que o descendente de portugueses presbiterianos expulsos da Madeira liderou o primeiro movimento moderno da literatura caribenha, fundando a revista “The Beacon” com outros escritores. Nascido ainda no século XIX, Alfy é considerado uma referência dos anos 1930 e 1940, tendo escrito dois romances, um conjunto alargado de contos e mais de 60 poemas. “Pitch Lake: A Story from Trinidad” e “Black Fauns” são dois dos títulos que assina. Alfred Mendes morreu em 1991, em Barbados.