Parte da atribulada história de amor entre Camilo Castelo Branco e Ana Plácido passou pelo número 378 da rua do Almada, no Porto. Era na varanda desse edifício que o escritor avistava com frequência a sua amada, que aqui habitava com o marido. A relação adúltera, à época muito polémica, que foi denunciada e condenada com pena de prisão, ficou imortalizada no romance “Amor de Perdição”.
Se há quase duzentos anos aquela porta acalentou o coração dos enamorados, hoje conforta o palato, desde que há quase quatro meses, dois sócios, Margarida Osório e Bernardo Maciel, aqui instalaram o restaurante Camilo, numa homenagem ao vulto maior da literatura nacional e em particular portuense. O espaço, com dois andares e decoração sóbria, dispõe de bar e esplanada para prolongar os jantares, momento exclusivo para refeições no Camilo.
Já a cozinha, a laborar à vista logo na entrada do restaurante, é liderada pelo jovem chef Diogo Coimbra, que aos 28 anos assume a ideia de “infidelidade à cozinha portuguesa”, mas não aos ingredientes nacionais. É que a esta mesa domina a fusão de influências, com sabores do mundo conjugados com peixes, mariscos e carnes nacionais, em pratos pensados para partilhar: todos os empratamentos podem ser divididos para dois.
Fugindo ao desperdício, na preparação, tudo se aproveita, sublinha Margarida, que se habituou a contar aos visitantes estrangeiros não só o romance que dá o mote ao restaurante mas também a história de amor do Porto com a cozinha: “temos enraizada uma cultura de aproveitamento, por exemplo de todas as partes de um animal, e uma cultura de cozinhar em casa que está muito presente” e também se sente na dinâmica do Camilo, visitado pela maioria dos clientes portuenses ao fim de semana.
À chegada à mesa, a ementa do restaurante Camilo apresenta-se em forma de carta lacrada, como as missivas de amor trocadas entre Camilo e Ana Plácido nesta mesma morada. Rompido o lacre, desfila a proposta de sabores de fusão, a começar pelo couvert, onde o pão de massa mãe casa com manteiga e paté de tremoço, além de um snack que varia diariamente ao sabor do mercado. Seguem-se entradas como “Vieiras grelhadas, dashi, edamame e XO” (€18), uma reconfortante “Lula, caldo de porco e enoki” (€15) ou o saboroso “Rosbife, tonato e pickles de mostarda” (€15), além do “Alho francês, molho mornay e presunto” (€12) e do “Leitão, cogolho grelhado e maçã verde” (€15).
Nos principais, o tradicional “Pregado grelhado” acompanha agnolotti e caldo de churrasco” (€25); e o peixe do dia, ditado pela disponibilidade, brilha ao lado de arroz de tomate fumado e bivalves (€30). Ainda no capítulo dos peixes pode escolher “ Bacalhau, grão-de-bico e pil-pil” (€28). Nas carnes, o “Magret de pato, puré de pastinaca, cogumelos e beterraba” (€29), a “Maminha, puré de tupinambo e chimichurri” (€25) e o “Lombo de borrego, beringela e puré de ervilha” (€31) reforçam a aposta nos sabores de fusão. “Couve-flor, molho de amêndoa e feijão branco” (€21) é opção vegetariana.
Em doses mais generosas para dois, encontra ainda a “Paella socarrat, polvo, e aioli de alho negro” (€60) e o “Entrecôte maturado” por 45 dias (€75).
Para o momento mais doce ficam reservados o “Ananás e coco”, o “Chocolate” e o “Mil-folhas de café e mascarpone” (€8) e a “Tarte de pera” que acompanha com gelado variável conforme a época e imaginação: pode ser de Porto (como na imagem), fruta ou manjericão.
Todos as sugestões contam com uma proposta de harmonização vínica, que procura cruzar pequenas produções com referências mais conhecidas sem sair do território vinícola nacional. É o caso do Quinta do Cardo Superior da Beira Interior, que acompanha o rosbife, o Pirata da viúva, de Colares, a ligar com a Lula, do Argilla Herdade da Anta Alentejo branco, servido com o peixe grelhado ou o seguro Conde Vimioso Reserva 2020, a ladear o magret de pato.
O restaurante Camilo (Rua do Almada, 378, Porto. Tel. 915 299 442) funciona diariamente ao jantar, entre as 19h00 e as 22h30; à sexta-feira e ao sábado até às 00h00. Terça-feira é dia de descanso.