Sociedade

Agricultura intensiva acelera mudanças sem precedentes no ciclo global da água, aponta NASA

Estudo da NASA detetou mudanças sem precedentes no ciclo global da água. De acordo com os cientistas, a maioria destas alterações é causada por atividades como a agricultura

Miguel Sotomayor

Cientistas da NASA utilizam quase 20 anos de observações para mostrar que o ciclo global da água está a mudar de formas sem precedentes e que a maioria destas alterações é causada por atividades como a agricultura.

Este novo estudo refere também que as alterações podem ter impactos nos ecossistemas e na gestão da água, especialmente em determinadas regiões.

"Estabelecemos através da assimilação de dados que a intervenção humana no ciclo global da água é mais significativa do que pensávamos anteriormente", destacou, em comunicado, Sujay Kumar, investigador do Goddard Space Flight Center da NASA (agência espacial norte-americana) e coautor de um estudo publicado na revista PNAS.

As alterações têm implicações para toda a população mundial. As práticas de gestão da água, como a conceção de infraestruturas para as cheias ou o desenvolvimento de indicadores de seca para sistemas de alerta precoce, baseiam-se frequentemente em pressupostos de que o ciclo da água flutua apenas dentro de um determinado intervalo, frisou Wanshu Nie, investigador do Goddard da NASA e o autor principal do estudo.

"Esperamos que esta investigação sirva de guia para melhorar a forma como avaliamos a variabilidade dos recursos hídricos e planeamos a gestão sustentável dos recursos, especialmente em áreas onde estas alterações são mais significativas", sublinhou Nie.

Um exemplo de impactos humanos no ciclo da água encontra-se no norte da China, que sofre com a seca contínua. Mas a vegetação em muitas áreas continua a prosperar, em parte porque os agricultores continuam a irrigar as suas terras bombeando mais água das reservas subterrâneas, detalhou Kumar.

Estas intervenções humanas inter-relacionadas levam frequentemente a efeitos complexos noutras variáveis do ciclo da água, como a evapotranspiração e o escoamento.

Nie e os seus colegas concentraram-se em três tipos diferentes de alterações no ciclo: em primeiro lugar, uma tendência, como uma diminuição de água num reservatório de águas subterrâneas. Em segundo lugar, uma alteração na sazonalidade, como a época típica de cultivo que começa mais cedo no ano ou o derretimento da neve mais cedo, e terceiro, uma alteração em eventos extremos, como "inundações de 100 anos", que ocorrem com maior frequência.

Os cientistas recolheram dados de deteção remota de 2003 a 2020 de várias fontes de satélite diferentes da NASA.

"Este artigo combina vários anos de esforço da nossa equipa no desenvolvimento de capacidades de análise de dados de satélite, permitindo-nos simular com precisão os fluxos e armazenamentos de água continentais em todo o planeta", vincou Augusto Getirana, investigador do Goddard da NASA e o coautor do estudo.

Os resultados do estudo sugerem que os modelos do sistema terrestre utilizados para simular o futuro ciclo global da água devem evoluir para integrar os efeitos atuais das atividades humanas.

Com mais dados e modelos melhorados, os agricultores e os gestores de recursos hídricos poderiam compreender e planear eficazmente como será o "novo normal" da sua situação hídrica local, apontou Nie.