Em Vinhais, três meses de inverno, nove meses de inferno, já dizia a sabedoria popular. A estação das chuvas e do frio estará perto do fim, mas ainda é a lã que ali vale a muitos, enregelados quando o termómetro quase bate no zero. Por obra e graça da natureza, as ovelhas beneficiam da tosquia a tempo de se manterem frescas durante o verão avassalador. O ciclo é conhecido por todos, mas foi sendo esquecido por muitos, à medida que as máquinas se tornaram rainhas e senhoras da indústria do vestuário. Vinhais, one vivem cerca de oito mil pessoas, já foi zona de grandes tecedeiras que faziam disso vida e tinham na atividade o seu sustento.
A bisavó de Susana era fiadeira, e, por isso, a arqueóloga filha da terra já fazia tricô desde sempre, "como uma boa neta". O interesse pelo uso da lã desde a Proto-história, com os seus teares primitivos, é, no entanto, mais recente. Numa região cuja economia é marcada pela pequena indústria, pela agricultura, produção de castanha e porco bísaro, Susana Santos, de 34 anos, diz que o gosto pelas lãs e espécies autóctones a surpreendeu aquando de um projeto da Câmara Municipal de Vinhais, em que participou como formanda. Desde então, somaram-se em catadupa os workshops com a comunidade para trabalhar a lã desde que ela é retirada da ovelha até à criação de fios e outros produtos finais.
A professora do pré-escolar e do ensino básico guarda com carinho a atividade com o Museu do Abade do Baçal, em Bragança, juntando um grupo de crianças de um ATL e criando um quadradinho para levar para casa. Se o peçado de tecido pareceu insipiente ou singelo, o desígnio era maior: valorizar o tricô e a tecelagem, usando os padrões tradicionais do Norte, como os usados nas mantas dos caretos. “É uma passagem de testemunho, valorizando as espécies autóctones e preservando uma tradição muito nossa, um património cultural”, repara. Recorrendo às espécies endógenas e aproveitando o desperdício do produto das tosquias, que foi sendo desvalorizado ao longo do tempo, Susana Santos quer apelar a uma causa comum a todo o território. “A partir do momento em que conseguimos desenvolver sentimento de pertença e conseguimos passar isso para os mais novos, transmitindo também aos mais velhos que não é uma vergonha ter sido fiadeira e ter trabalhado no tear, conseguimos ter uma comunidade que valoriza as tradições e aquilo em que podemos crescer economicamente.”