O Dia Mundial da Obesidade é assinalado em Portugal esta segunda-feira, dia 4 de março. A data marca ainda os 20 anos desde que a obesidade foi reconhecida, pela Organização Mundial da Saúde (OMS), como uma doença. Portugal foi pioneiro neste reconhecimento.
A obesidade é definida, pela presidente da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo (SPEDM) e diretora do Serviço de Endocrinologia do Centro Hospitalar Universitário de São João, Paula Freitas, como “uma doença crónica, complexa, multifatorial, recidiva, que aumenta o risco de outras complicações a longo prazo e reduz a esperança média de vida”.
A consciencialização para o tema e a inovação terapêutica dão agora, passadas cerca de duas décadas, mais oportunidade àqueles que sofrem com a doença de obesidade, mas nem todos têm a sorte de conseguir agarrá-la. Ao Expresso, Paula Freitas frisa que “não estamos a proporcionar às pessoas com obesidade um tratamento adequado porque falhamos no investimento e planeamento”.
A obesidade tem impacto direto na morbilidade e mortalidade dos cidadãos. Aliás, a OMS considera esta doença uma epidemia global, uma vez que o número de doentes aumentou ao longo das últimas décadas.
A obesidade em números
A World Obesity Atlas 2022 estima que o número de indivíduos que sofrem com obesidade continue a aumentar, afetando mais de 1,5 mil milhões de pessoas em 2030. Este crescimento poderá ser alavancada pela subida da inflação, já que os consumidores acabam por preferir alimentos menos saudáveis que, por norma, têm preços mais reduzidos. Tendo em conta uma análise da McKinsey & Company, 5% dos casos de morte registados a nível mundial são devidos à obesidade.
Em Portugal 67,6% da população tem Excesso de Peso ou Obesidade, sendo que a prevalência da Obesidade é de 28,7%, segundo o estudo “O custo e a Carga do Excesso de Peso e Obesidade em Portugal”, de outubro de 2021, levado a cabo pelo Centro de Estudos de Medicina Baseada na Evidência (CEMBE), Evigrade-IQVIA e Sociedade Portuguesa.
De acordo com a Federação Mundial da Obesidade, cerca de 39% dos portugueses adultos serão obesos até 2035.
O que falta fazer em Portugal
A Professora Paula Freitas explica que, atualmente, a dieta e o exercício físico já não são considerados os exclusivos tratamentos para a obesidade. “São obviamente um complemento essencial e não podem faltar”, mas o tratamento “baseia-se em três pilares fundamentais: a terapêutica comportamental, terapêutica farmacológica e terapêutica cirúrgica.”
E é nesta questão que Portugal acaba por estar atrasado em relação a outros países europeus, uma vez que os fármacos ainda são vendidos a preços que nem todas as pessoas conseguem comportar, porque não são comparticipados, e as restantes terapêuticas têm um investimento muito reduzido em Portugal.
Para a professora, o tratamento da obesidade deve ser feito através de uma equipa multidisciplinar, da qual fazem parte “médicos, psicólogos para fazer a terapêutica comportamental, fisiologistas do exercício físico e nutricionistas para ensinar as pessoas a comer de forma saudável e equilibrada”. Acrescenta ainda que quando necessário deverá haver uma “maior acessibilidade à terapêutica cirúrgica”, já que os resultados que apresentam são bastante eficazes.
Paula Freitas lembra que “70% do nosso peso é determinado geneticamente”, sendo esta uma das mais comuns causas para se sofrer com a doença da obesidade. É também muitas vezes consequência de outros tipos de doenças ou devido à toma de determinados medicamentos.
Por outro lado, refere que vivemos num ambiente em que existe “excesso de sedentarismo, elevados níveis de stress, pouco tempo para cozinhar em casa, mas com todo o tipo de comida disponível a qualquer hora. E a comida menos saudável acaba por ser a mais barata, afetando, especialmente, a franja da sociedade com menos posses monetárias”. Para evitar este tipo de comportamentos defende que a sensibilização para a doença comece numa fase escolar precoce.
O Governo português criou um programa de prevenção da obesidade, em dezembro de 2023, mas a medida ainda não saiu do papel. O atraso deve-se ao facto de o executivo se encontrar em gestão, cabendo ao próximo Governo colocá-lo, ou não, em prática.
Para a presidente da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo (SPEDM), trata-se de “um programa muito interessante e muito bem estruturado, que foca não só as consequências da obesidade, mas também as suas causas”. O Programa é o resultado do trabalho que tem sido levado a cabo por sociedades científicas, nomeadamente pela Sociedade Profissional de Obesidade e a Sociedade Portuguesa de Endocrinologia.
Qual é o custo da obesidade?
Segundo o estudo “O custo e a Carga do Excesso de Peso e Obesidade em Portugal” esta doença tem um “impacto económico significativo” nos serviços de saúde. A nível mundial, estima-se que seja responsável por 2% a 8% do total das despesas em saúde nos países ocidentais. A estes custos somam-se os custos indiretos como a improdutividade, absentismo ou o desemprego. No total, segundo o mesmo estudo, deverá cifrar-se nos 2,8% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial, sendo que se estima que estes custos aumentem nos próximos anos.
Em Portugal, segundo o mesmo estudo, o excesso de peso e a obesidade representam um custo direto anual de 1,2 mil milhões de euros, o que equivale a 0,6% do PIB e a 6% das despesas de Saúde em Portugal. O valor é contabilizado tendo em conta o número de internamento e ambulatório codificado, ambulatório e medicamentos.
A Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo e a Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade apelam à urgente disponibilização no mercado e respetiva comparticipação médica de novos fármacos para o tratamento da obesidade já disponíveis noutros países, nomeadamente para as classes sociais mais desfavorecidas, que são as mais afetadas por esta patologia. Segundo a SPEDM, é ainda importante haver um reforço das consultas de obesidade no Serviço Nacional de Saúde (SNS), de modo a que seja traçado um plano estrutural do tratamento desta doença.