Vinte e três dias depois de ter dito à CNN que os abusos sexuais de menores não eram “um crime público” e que, por isso, não havia “obrigatoriedade de denunciar” alegados casos, o bispo do Porto D. Manuel Linda publica agora uma carta no site da diocese portuense onde reconhece “não ter sido feliz na expressão” utilizada.
No texto, D. Manuel Linda explica a motivação da missiva - “nas últimas semanas fui objeto de várias notícias e comentários” - e concede “ter deixado dúvidas quanto à noção de crime público”. “Pois bem: assumo que não fui feliz na expressão e que, porventura, tornei incompreensível o meu próprio pensamento. E disso peço desculpa a todos e perdão às vítimas que, possivelmente, se sentiram feridas”, lê-se na carta de D. Manuel Linda.
Além disso, o bispo referiu-se a declarações suas mais antigas. Por exemplo, quando em entrevista à TSF, em 2019, disse que ninguém criaria uma comissão “para investigar um meteorito” que caísse na Invicta. Afirmou então o seguinte: “É possível que caia aqui um meteorito? É. Justifica-se uma comissão dessas? Porventura, não. Se se destina a criação de uma comissão [para investigar abusos na Igreja, o que veio a acontecer, sob a liderança do pedopsiquiatra Pedro Strecht] para recolher queixas, não se justifica, pois até agora não tivemos nenhum caso [de abusos sexuais de menores], graças a Deus".
Agora, alguns anos depois, D. Manuel Linda afirma que, “algo ingenuamente", acreditava que as estruturas das dioceses seriam suficientes “para receber e tratar casos que viessem a surgir”.
O ato de contrição do bispo do Porto continuou na carta publicada, recuperando a vez em que disse que os abusos sexuais de menores eram “asneiras”, “palavra” que na sua “zona de origem” designa “qualquer ação perversa”. “Não era minha intenção menorizar o terrível crime dos abusos”, assegura.
Nos últimos meses, vários meios de comunicação, a Comissão Independente e também representantes da Igreja portuguesa têm refletido sobre os abusos sexuais de menores alegadamente protagonizados por padres que ainda se encontram no ativo, que abandonaram o ofício, faleceram ou cujos supostos crimes terão prescrevido.
Sobre isto, D. Manuel Linda afirma ter “amarguradamente de reconhecer que a realidade é muito mais sombria e dolorosa” do que ele pensava. “Que fique muito claro que sofro e deploro liminarmente esse flagelo dos crimes de natureza sexual cometidos contra menores ou pessoas vulneráveis. E que tudo farei para lhes pôr cobro”, escreve o bispo.
Nos últimos dois pontos do texto, D. Manuel Linda exorta a Igreja a unir-se para “erradicar dos ambientes eclesistiais e de toda a sociedade qualquer tipo de abuso”, repisando a “tolerância zero” exigida pelo Papa Francisco.