Sociedade

Bloco admite que “não foi capaz” de explicar chumbo do OE. Críticos da direção não põem de parte Convenção extraordinária

“Derrota pesada”, reconhece Catarina Martins, que promete que o debate sobre o pior resultado dos últimos 20 anos do Bloco de Esquerda não acaba aqui. Corrente crítica queria mais e põe hipótese de pedir um encontro extraordinário para discutir atual liderança

Pela primeira vez, Catarina Martins reconheceu que o Bloco de Esquerda “não foi capaz de comunicar as razões profundas” do chumbo do Orçamento do Estado para 2022 (OE), que deu origem às eleições antecipadas. À saída do encontro da Mesa Nacional, o órgão máximo entre convenções, a coordenadora do Bloco considerou o resultado do passado domingo “uma derrota pesada” – foi, aliás, o pior resultado do partido nos últimos 20 anos. “Estivemos a analisar as causas e o que devemos fazer agora”, adiantou ainda.

Do encontro em Lisboa saíram outras notas, essas já conhecidas do discurso do Bloco: por um lado, o chumbo do OE não teria resultado necessariamente em eleições, não fosse a vontade de Marcelo Rebelo de Sousa, que nunca pôs outra hipótese. Por outro, já durante a campanha, as sondagens foram criando uma “falsa polarização” entre PS e PSD, sobretudo quando começaram a antever um empate técnico. Assim, o Bloco contribuiu para a própria derrota, disse Catarina Martins. “Acreditámos naquilo que os estudos nos diziam e direcionámos a nossa campanha para o combate à direita, porque nos pareceu que era prioritário”. E se direção já contava com alguma perda eleitoral, o que se viu foi uma “queda maior do que a Mesa Nacional antecipava”.

Agora, com uma maioria absoluta do PS, o partido não só mantém que o chumbo do OE era inevitável – “não seríamos fiéis ao nosso mandato se capitulássemos” – como promete “uma oposição de fiscalização absoluta”. Mas pelo meio, terá também de lamber feridas internas. O grupo de críticos da linha da direção aumentou na Convenção de 2021, alcançando um quarto dos lugares na Mesa Nacional. Reunidos na sensibilidade interna “Convergência”, contestam a “excessiva colagem ao PS” e lançam agora um balanço alternativo às legislativas, em que insistem que “a orientação política ziguezagueante, concentrada num acordo com o PS, tem vindo a debilitar o Bloco e a esquerda”.

O Bloco falhou os três objetivos a que se propunha: manter-se como terceira força política, barrar assim o crescimento da extrema-direita e impedir a maioria absoluta de Costa. Por isso, adianta um membro da “Convergência” ao Expresso, não está posta de parte a possibilidade de ser proposta uma Convenção extraordinária, o órgão máximo do partido, que colocaria em causa a direção de Catarina Martins. A corrente interna quer uma responsabilização maior pela perda de 14 deputados no Parlamento e propõe uma alteração substancial da linha política.

Porém, como o Expresso adianta na edição deste fim de semana, a intenção da direção é mesmo manter a atual coordenadora até 2023. Se não for antecipada, é para o primeiro trimestre desse ano que está prevista a Convenção do partido, que se realiza de dois em dois anos.

Ainda à saída do encontro deste sábado, Catarina Martins adiantou que o debate sobre as causas da derrota eleitoral “não deve encerrar-se” e que o partido vai fazê-lo em plenários distritais nos próximos meses. Para abril, ficou alinhavada uma Conferência Nacional para discutir, mais uma vez, “o rumo estratégico do Bloco de Esquerda”. Por agora, aponta para o novo ciclo bloquista no Parlamento: “Iniciaremos esta legislatura com um pacote robusto de combate à precariedade”, outro combate pela “valorização das carreiras para fixar profissionais no SNS” e ainda pela “despenalização da morte assistida”.