A Aurora do Homem está marcada para 21 de maio de 2061, data em que começaria a escalada em direção à Luz e, neste momento, a última pergunta foi feita: a entropia do Universo pode ser revertida? As fontes de energia minguavam e a saída para a população da Terra passaria pela Lua, Marte e Vénus. O supercomputador Multivac, tão complexo quanto incontrolável, fornecia todas as respostas até que deixou de responder. De saber o que dizer. Por entropia entenda-se a medida da desordem do Universo. Quanto maior a desorganização, aleatoriedade e irreversibilidade de um sistema termodinâmico, maior a energia gasta e mais próximo está o fim. O Multivac não foi além de “dados insuficientes para resposta significativa”. A dúvida repetiu-se ao longo do tempo, e sempre a solução foi nenhuma. Mesmo para lá da Humanidade, a incógnita sobre a possibilidade de reversão da desordem manteve-se, até que “se fez luz”.
Este é, em traços muito gerais, o resumo do conto “A Última Pergunta”, escrito em 1956 por Isaac Asimov. Aquele que foi considerado pelo próprio autor como o seu texto favorito poderia ter sido escrito hoje. Ou amanhã. Se a certeza da desorganização é garantida na inversa proporção em que se desconhece a forma de a reverter, o que faz com que a Humanidade persista, sob a permanente ameaça de autodestruição? Quando a pandemia de covid-19 pareceu amainar e brilhou o zénite de uma pretensa normalidade — palavra gasta de esvaziada —, veio a variante Ómicron e o alfabeto grego começou a parecer demasiado curto para tanta incerteza. Ainda falta luz ao fundo do túnel e a que às vezes se vislumbra não se sabe se é da Aurora ou do comboio em sentido contrário. Nem Asimov ousou prever tanto desacerto. Entre as oscilações da pandemia e os vaticínios das alterações climáticas, já todos perceberam que a incerteza é um elemento constante na equação quotidiana da sobrevivência. E esta é a primeira mudança fundamental. Que alguns intuíram mesmo antes da grande paragem pandémica.