Perante os atrasos de produção da AstraZeneca e da Pfizer, a Comissão Europeia decidiu limitar as exportações de vacinas para a Covid-19 aos casos em que as farmacêuticas conseguiram dar resposta às encomendas iniciadas por países da UE. A Organização Mundial de Saúde (OMS) encara esta restrição como uma nova forma de nacionalismo e defende que o plano de vacinação deve dar prioridade a profissionais de saúde e grupos de risco do mundo inteiro, e só depois deverá expandir-se à maioria da população, que não tem profissões ou registos clínicos de risco.
A posição foi assumida por dois dirigentes da OMS no Fórum de Davos, que decorre este ano em formato digital, devido aos confinamentos e restrições de viagens. Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor da OMS, defendeu que a lógica que privilegia determinados países em detrimento de outros poderá prolongar o tempo necessário para a recuperação social e económica mundial.
Além de classificar esse tipo de estratégias como uma “falha moral catastrófica”, Ghebreyesus considerou que a inexistência de um plano de distribuição global de vacinas vai “manter a pandemia em atividade e… diminuir a capacidade de recuperação da economia”.
Esta posição foi secundada pela médica brasileira Mariângela Simão que assume igualmente um cargo na direção da OMS e que descreveu as restrições à exportação de vacinas como “tendência muito preocupante”, refere a BBC.
Cerca de 95% das vacinações tiveram lugar em 10 países e apenas dois países com rendimentos médios e um país com rendimentos classificados como reduzidos deram início aos programas de imunização.
A este cenário de concentração de vacinas em poucos países do Globo junta-se o diferendo que a Comissão Europeia protagonizou no final da semana ao revelar que a farmacêutica sueca AstraZeneca não está a cumprir com os prazos das encomendas que aceitou depois de firmar um acordo confidencial. Bruxelas também demonstrou descontentamento com a Pfizer, pelo facto de não ter fornecido vacinas dentro dos prazos.
No caso da AstraZeneca, os atrasos foram justificados com falhas nas atividades das fábricas situadas na Holanda e na Bélgica. A farmacêutica aponta ainda o dedo às datas alegadamente tardias em que as encomendas terão sido assinadas.
Em contrapartida, a Pfizer justificou os atrasos com as obras de expansão de uma fábrica situada na Bélgica. Em relação à Pfizer, a produção de vacinas assume ainda contornos de política internacional – que remetem para a própria saída do Reino Unido da União Europeia.
A Comissão Europeia considera que as vacinas produzidas pela Pfizer em fábricas no Reino Unido destinam-se prioritariamente a cidadãos europeus. Esta reivindicação pode assumir contornos diplomáticos imprevisíveis, uma vez que recentemente foi aprovada uma nova ferramenta legal que concede aos 27 estados membros a possibilidade de vetar exportações de vacinas, sempre que considerarem que os interesses das respetivas populações não estão acautelados.
“A proteção e a segurança dos nossos cidadãos é a prioridade e os desafios que estamos a enfrentar deixaram-nos sem qualquer alternativa senão esta”, refere uma posição oficial da Comissão Europeia citada pela BBC.
A Comissão Europeia encomendou 400 milhões de vacinas às AstraZeneca, 300 milhões à Sanofi-GSK, 400 milhões à Johnson & Johnson, 600 milhões à Pfizer-BioNTech, 405 milhões à CureVac, e 106 milhões à Moderna.
As restrições às exportações de vacinas deverão afetar um total de 100 países – mas há igualmente um total de 92 países que não são abrangidos por estas regras. Alguns países dos Balcãs, Noruega, Suíça, Líbano, Israel e países do Norte de África figuram nas exceções.