Sociedade

Caso de Tancos. Carlos Alexandre bastante duro com Azeredo Lopes

O ex-ministro da Defesa insistiu várias vezes que desvalorizou a informação contida no memorando da PJM sobre a operação ilegal e que esta se tratava de um assunto de polícias e não do Governo

Ex-ministro Azeredo Lopes
Nuno Botelho

Foi "dura" a audição do juiz de instrução Carlos Alexandre ao ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes, esta segunda-feira no Tribunal de Monsanto, garante ao Expresso fonte ligada ao processo. O magistrado chegou a ter uma fúria durante o depoimento do ex-ministro, lendo do princípio ao fim o memorando redigido pela Polícia Judiciária Militar (PJM) que foi entregue ao seu ex-chefe de gabinete Martins Pereira no Ministério da Defesa pelo diretor daquela polícia, o coronel Luís Vieira e o inspetor-chefe da PJM, o major Vasco Brazão. Um documento que relatava contornos da operação ilegal da PJM e contactos com um informador para a obtenção do arsenal roubado em Tancos.

Carlos Alexandre quis apurar como podia ser possível Azeredo Lopes não perceber na altura que a PJM estava a realizar ações ilegais, à revelia do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) e da unidade anti-terrorista da Polícia Judiciária. "O juiz fartou-se de mandar indiretas e piadas a Azeredo", revela a mesma fonte.

Azeredo Lopes alegou não se recordar ao certo se chegou a ter uma conversa telefónica com o coronel Luís Vieira, no dia em que este e Brazão foram ao seu gabinete, logo após a recuperação das armas de guerra pela PJM na Chamusca, em outubro de 2017. Também disse a Carlos Alexandre não ter a certeza se recebeu o referido memorando via Whatsapp através do seu chefe de gabinete. Recorda-se apenas de ter tido uma conversa com Martins Pereira sobre o documento, nomeadamente sobre a existência de um informador que estava a trabalhar com a PJM para o resgate do material bélico. "Afirmou que na altura pensou que aquele era um assunto de polícias e não do governo", conta uma fonte que esteve presente no Tribunal de Monsanto.

Carlos Alexandre recordou a Azeredo que este chegou a receber um telefonema da então procuradora-geral da República Joana Marques Vidal a mostrar o desagrado para com a atuação paralela da PJM, prometendo agir disciplinarmente contra o seu diretor-nacional, o coronel Luís Vieira. E disse achar estranho que o então ministro da Defesa não tenha alertado ninguém para esta irregularidade.

Questionado sobre se António Costa estaria a par das operações ilegais da PJM, o ex-ministro voltou a assegurar que nada disse ao primeiro-ministro sobre o assunto, não tendo mencionado a existência de qualquer memorando a São Bento.

As diferentes versões de Tancos

Da parte da manhã, Carlos Alexandre quis esclarecer as diferentes ´nuances´ que existem nas versões do ex-diretor da Polícia Judiciária Militar e arguido Luís Vieira e do antigo chefe de gabinete do ministro, Martins Pereira. De acordo com a agência Lusa, o juiz disse mesmo estar à espera que o ministro desempatasse, já que o ex-diretor da PJM apresentou uma versão e o chefe de gabinete Martins Pereira apresentou outra. Azeredo Lopes disse ainda ao juiz que teve conhecimento de que havia um informador [Paulo "Fechaduras" Lemos] da Polícia Judiciária.

Azeredo Lopes é um dos 23 arguidos do caso de Tancos e está acusado de denegação de justiça, prevaricação, favorecimento pessoal praticado por funcionário e abuso de poder.

Segundo a acusação do DCIAP, a recuperação do armamento furtado dos paióis de Tancos, em junho de 2017, deve-se a um "verdadeiro pacto de silêncio entre Azeredo Lopes e os arguidos da GNR, PJM e que todos criaram sérios obstáculos à descoberta da verdade material".

Azeredo Lopes demitiu-se a 12 de outubro de 2018, depois das acusações de Vasco Brazão de que o então ministro estava a par da encenação de recuperação das armas e que o seu chefe de gabinete lhe havia passado o memorando que continha informações sobre parte da operação da PJM.

O inquérito de Tancos investigou o furto, em 28 de junho de 2017, e as circunstâncias em que aconteceu a recuperação de grande parte do material militar, em 18 de outubro do mesmo ano.