No mês em que se assinalam os 49 anos da Revolução dos Cravos, ver chegar às livrarias a reedição do álbum “Cartoons — 1969-1975”, de João Abel Manta, é uma celebração que enaltece o trabalho gráfico de um autor que o soube praticar com mestria inigualável. Mais do que isso, é o resgate há muito em falta de uma herança extraordinariamente valiosa. Se os cartoons de João Abel Manta são criações gráficas exímias na análise e no comentário sobre o país e o mundo, a apreciação do seu trabalho em sequência, formando um corpo complexo, revela essa inteligência atravessada pela mordacidade que o caracteriza ao longo das décadas e que ganha em cada composição a força de um texto visual que se basta a si mesmo, sem precisar de qualquer acrescento.
Passaram 48 anos sobre essa edição de “O Jornal”, quase tantos como já levamos de democracia, e o livro de Abel Manta não voltou a estar disponível, até agora. É um facto estranho, se atentarmos na importância destes trabalhos para a memória coletiva dos anos imediatamente anteriores e posteriores ao 25 de Abril, mas será um daqueles absurdos que caracterizam o nosso mercado editorial, sempre tão cheio de novidades que aparecem e desaparecem das livrarias a um ritmo vertiginoso e sempre tão escasso de fundos, de reedições que não deixem desaparecer do acesso aos leitores bibliografia tão essencial como esta. Merecíamos, coletivamente, que esta herança não ficasse confinada às bibliotecas e às prateleiras mais caras dos alfarrabistas.