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"Traição à Pátria": Chega avança com processo contra Presidente da República

Partido decidiu avançar com queixa contra o Presidente da República, mesmo sabendo que PS e PSD não vão dar os votos necessários para que o processo siga para o Supremo Tribunal

FILIPE AMORIM/Lusa

André Ventura anunciou esta terça-feira que o Chega vai avançar com a queixa por crime de “Traição à Pátria” contra o Presidente da República. Em causa estão as declarações de Marcelo Rebelo de Sousa sobre reparações às ex-colónias num jantar com jornalistas estrangeiros por altura do 25 de Abril. “O Presidente da República merece o nosso integral respeito enquanto chefe de Estado. E por isso, estes mecanismos devem ser apenas utilizados em casos excecionais ou graves, quando sentimos que ele nos deixa de representar e passa a representar outros interesses que não o nacional”, afirmou Ventura, no Parlamento, onde anunciou a decisão do partido.

O Chega considera, portanto, que o Presidente defendeu interesses de outros países e não de Portugal, sendo ainda mais grave, segundo Ventura, quando dois destes países já manifestaram querer reparações. “Este é um processo que vai deixar marcas e frutos muito para além de hoje. Isto vai deixar marcas para as próximas gerações, governos e parlamentos", afirmou.

O líder do Chega falou aos jornalistas à porta da Sala do Senado, após uma reunião do grupo parlamentar em que os deputados apresentaram as suas posições sobre o tema. “Esta é a decisão final do grupo parlamentar que, independentemente, de posições a assume consensualmente como um grupo unido”, afirmou Ventura, sublinhando ainda que "independentemente da questão jurídica, há uma censura política que não podia deixar de acontecer.

Para a decisão contribuíram por escrito juristas e professores de direito. Contudo, como já tinha noticiou a SIC, o Chega recusa revelar a entidade destes especialistas por "razões de confidencialidade". Sobre estes, André Ventura diz apenas que “houve indicações em todos os sentidos” e repetiu que os especialistas consultados pediram o anonimato.

Estes pareceres foram recebidos após o líder do partido, ele próprio jurista, ter admitido ter “dúvidas sobre a tipicidade penal do comportamento do Presidente da República”. No domingo, André Ventura defendeu numa conferência de imprensa na sede do partido que a ação criminal “merece ser ponderada”, mas admitiu que as afirmações podem não ter “consistência jurídica”.

No mesmo dia, a possível queixa já tinha sido desvalorizado pelo próprio Presidente, em declarações feitas à margem de uma visita à Ovibeja. "A democracia é isso. Em democracia, em tempo eleitoral, fora de tempo eleitoral, os partidos podem tomar iniciativas. É, naturalmente, a democracia", disse Marcelo Rebelo de Sousa.

Para abrir um processo contra o Presidente é necessária que um quinto dos deputados (46) avancem com uma proposta. Tendo 50 deputados, o Chega pode avançar com tal proposta. Porém. a mesma teria de ser votada e conseguir uma maioria de dois terços (153), exigindo acordo com PS e PSD (que já descartaram essa possibilidade). Só depois a queixa poderia dar entrada no Supremo Tribunal de Justiça.

Enfatizando que este é um caso inédito - e admitindo que continua a ter dúvidas jurídicas - André Ventura disse que será formada uma comissão no Parlamento para analisar a proposta, como previsto na Constituição. Disse igualmente que falará com os outros partidos - “especialmente PS e PSD” - para “articular” e perceber quais serão os próximos passos.

Questionado sobre se não considera contraditório um partido que se posiciona contra a ditadura do politicamente correto censurar agora o PR, André Ventura foi taxativo: este caso “nada tem a ver com liberdade de expressão”. “O Presidente da República em caso algum pode dizer que o seu país é um criminoso. É como quando vemos a seleção jogar. Pode não ter razão, mas estamos sempre do lado dela. O nosso país é assim. O nosso país é assim: às vezes não tivemos razão, às vezes falhamos, mas não se traí”.

A pedido do partido, o tema das reparações será discutido no Parlamento na quarta-feira dia 15. Isto quando o Governo já se posicionou sobre o tema. Numa nota enviada à comunicação social, o Executivo afasta a discussão afirmando que irá continuar a linha seguida pelos anteriores governos na cooperação com estes países.

[atualizado às 19h02]