Enquanto Israel continua a tirar consequências da afirmação de António Guterres no Conselho de Segurança da ONU, em Portugal o Governo , o Presidente da República e vários partidos já se pronunciaram em defesa do secretário-geral das Nações Unidas, à exceção do Chega e da IL que condenaram as declarações. PSD a várias vozes.
Depois de António Costa ter enviado uma mensagem a António Guterres, noticiada pela agência Lusa, a dizer que Guterres tem sido “exemplar” na defesa do direito humanitário internacional e afirmando que Portugal “compreende e acompanha” a posição do secretário-geral das Nações Unidas, também o PS se mostrou solidário com o secretário-geral da ONU. E o mesmo fez o ministro dos Negócios Estrangeiros, em nome do Estado português.
"Compreendemos e acompanhamos inteiramente a posição de António Guterres, que foi inequívoco quando condenou o terrorismo do Hamas, que é absolutamente inaceitável. Foi absolutamente cristalino na análise que fez", disse João Gomes Cravinho à Lusa.
Numa nota enviada às redações, também o PS reiterou que acompanhava o secretário-geral da ONU e ex-primeiro-ministro português. “O Secretário-Geral da ONU reiterou sempre a necessidade da negociação de um cessar-fogo imediato que, em respeito pelo direito internacional, inclua a libertação de reféns civis e a abertura de corredores humanitários na Faixa de Gaza, bem como um caminho para o cumprimento das múltiplas resoluções das Nações Unidas”, escreveu o partido, com o deputado e vice-presidente da bancada socialista Francisco César a “subscrever integralmente a interpretação e as declarações do secretário-geral da Organização das Nações Unidas", que considera muito "claras”.
O apoio a Guterres surge da esquerda, mas também vem de algumas alas do PSD, apesar de à saída de um encontro com o Presidente da República, o presidente social-democrata, Luís Montenegro, ter recusado falar sobre a polémica internacional.
Montenegro não quis desviar atenções do que o tinha levado a Belém - o estado da Saúde em Portugal -, mas uma das suas vice-presidentes comentou o assunto nas redes sociais. “Estranhos tempos em que o mais elementar bom senso e humanismo é censurável”, escreveu Margarida Balseiro Lopes no X (antigo Twitter). Para a dirigente social-democrata, o que Guterres fez foi “enquadrar acontecimento” e isso “não é o mesmo do que justificar a barbárie”.
E escreve ainda: “Solidarizarmo-nos com as vítimas e reconhecer o direito a que se defendam também não implica que se feche os olhos a atropelos claros dos direitos humanos.”
A posição oficial do PSD só viria, contudo, ao fim do dia pela voz do eurodeputado Paulo Rangel. O vice-presidente do PSD Paulo Rangel defendeu que a clarificação feita pelo secretário-geral das Nações Unidas sobre as declarações que proferiu na segunda-feira sanou a polémica, mas considerou que houve de facto uma frase “menos feliz”.
“A clarificação que fez o secretário-geral das Nações Unidas, o nosso compatriota António Guterres, é uma clarificação importante. De facto, criou-se uma controvérsia em toda a imprensa internacional, porque as declarações de ontem [segunda-feira], enfim, pelo menos não foram felizes, especialmente uma frase”, sustentou Paulo Rangel, em declarações aos jornalistas no Parlamento Europeu (PE), em Bruxelas. O vice-presidente social-democrata disse ter “a certeza absoluta” de que António Guterres “não queria, em caso nenhum, justificar o terrorismo”.
“Mas é verdade que há uma frase menos feliz, que implicava uma clarificação. Um secretário-geral das Nações Unidas, para desempenhar bem a sua função, tem, muitas vezes, de manter essa neutralidade”, completou.
Esquerda aplaude
Também foi nas redes sociais que o líder parlamentar do Bloco, Pedro Filipe Soares, saiu em defesa de Guterres. "Há uma deriva irracional do Governo de Israel que quer "dar uma lição" à ONU, demitir António Guterres e negar vistos a representantes e funcionários da ONU", escreveu o dirigente bloquista, que deixa a pergunta: “Quando a ONU passa a inimiga, quais são os valores que se pretendem impor ou as atrocidades que se querem cometer?”
Já no Parlamento, o BE deu entrada com um voto de solidariedade com o secretário-geral das Nações Unidas, com Pedro Filipe Soares a cirticar os “dois partidos” [Chega e IL] que se colocaram contra Guterres. Fazê-lo, disse, é estar contra a carta dos direitos humanos das Nações Unidas. Trata-se de um “ataque ignóbil” contra Guterres, afirmou ainda, depois de Mariana Mortágua já ter escrito, no X [ex-Twitter], que António Guterres disse “o óbvio” e, mesmo assim, ficou “sob assédio do regime israelita”.
“Face ao genocídio, são poucas as vozes que se ouvem pela paz e pelo direito internacional”, disse ainda Mariana Mortágua, instanto o Governo a sair em defesa do secretário-geral da ONU.
Já o PCP congratulou-se mesmo com as palavras de Guterres. “Consideramos que Portugal, ao nível da Presidência da República, Governo, Assembleia da República, tem de ter um posicionamento numa perspetiva de encontrar uma solução de paz, de cumprimento das resoluções das Nações Unidas e de respeito pelo direito da Palestina. As palavras do secretário-geral das Nações Unidas são neste sentido”, disse a líder parlamentar comunista, Paula Santos, questionada sobre o caso numa conferência de imprensa para apresentação de propostas de alteração ao Orçamento do Estado.
Paula Santos lembrou que a posição do PCP “é muito clara” sobre o conflito. “Há décadas de incumprimento das resoluções das Nações Unidas, e é neste contexto da necessidade de cumprimento dessas resoluções, da solução dos dois Estados e da criação do Estado da Palestina, com as fronteiras de 1967 e com a capital em Jerusalém Oriental, que nós vemos estas declarações do secretário-geral da ONU”, referiu.
Chega pede demissão
Bem diferente é a posição do Chega, com André Ventura a defender que secretário-geral da ONU "não tem condições políticas" para continuar no cargo e a propor que a Assembleia da República condene as declarações de António Guterres.
Em declarações aos jornalistas no Parlamento, André Ventura manifestou "incómodo e insatisfação" com as palavras do secretário-geral da ONU, que afirmou ser "importante também reconhecer que os ataques do Hamas não aconteceram num vácuo", e que "o povo palestiniano tem sido submetido a 56 anos de ocupação sufocante".
O líder do Chega quer que o parlamento "tome uma posição clara de condenação das palavras" de António Guterres quanto ao conflito entre Israel e o Hamas e defendeu que o antigo primeiro-ministro "não tem condições políticas para ser secretário-geral da ONU", pedindo a sua demissão.
André Ventura propôs também convidar o Presidente de Israel, Isaac Herzog, a discursar na Assembleia da República, o que poderia acontecer por via remota, como aconteceu com o chefe de Estado ucraniano, Volodymyr Zelensky, ou presencialmente, quando visitar Portugal.
O líder do Chega disse ter sugerido ao presidente do parlamento a "constituição de uma delegação parlamentar que visite Telavive", e que a deslocação seja "liderada pelo Presidente da República". Ventura disse ter enviado hoje um ofício a Santos Silva com estas propostas e que vai levar o assunto à próxima reunião da Conferência de Líderes.
O Presidente de Israel, Isaac Herzog, tinha prevista uma visita a Portugal no início de novembro, que foi adiada.
Também a Iniciativa Liberal condenou as declarações de Guterres, dizendo que mostram “desrespeito pelas famílias das vítimas de um hediondo acto de terror e barbárie humana”. “Foram politicamente insensatas e diplomaticamente catastróficas”, escreveram os liberais no antigo Twitter.
Nota: notícia atualizada às 17h10 com posição do Chega e às 19h10 com posição oficial do PSD