Com o Conselho de Estado marcado para esta sexta-feira, Marcelo Rebelo de Sousa segue com a segunda ronda de audiências aos partidos políticos com assento parlamentar. Esta segunda-feira, o presidente ouve os representantes partidários da Iniciativa Liberal (IL), Chega, PSD e PS sobre o balanço do ano político.
Na passada sexta-feira, dia 14, o presidente reuniu-se com o Livre, PAN, Bloco e PCP. Em comum, os quatro partidos criticaram a “atitude de fechamento”, o “poder absoluto” e os "tiques autoritários" da maioria absoluta socialista. Além disso, os partidos acusaram o executivo de António Costa de falta de “respostas” para as “dificuldades” no acesso ao Serviço Nacional de Saúde, a “crise” da habitação ou o “problema” com o setor dos professores.
Numa “conversa de pessoas preocupadas com o país”, IL acusa Governo de ser “incapaz de ler o país”
Na segunda ronda de audições, a Iniciativa Liberal foi o primeiro partido a partilhar as preocupações sobre o ano político. À semelhança das declarações dos partidos à esquerda, Rui Rocha também acusou o Governo de ser “fechado em si mesmo”, “incapaz de ler o país” e, por isso, “incapaz de dar respostas” aos problemas dos portugueses. “Há uma degradação do Governo e da sua capacidade de ouvir e de receber soluções”, atirou.
Sem querer pormenorizar o teor da conversa com Marcelo, o líder liberal disse que se tratou de uma conversa de “pessoas preocupadas com o país”. “Há um diagnóstico de questões que não estão a receber uma resposta adequada de António Costa”.
Quanto às polémicas de corrupção no Ministério da Defesa – que António Costa disse que as pessoas não valorizavam –, Rui Rocha lembrou o artigo de opinião onde o primeiro-ministro se mostra o “campeão do combate à corrupção” sem “nenhum conteúdo que o prove”. O liberal aproveitou ainda para comparar a “central de comunicação” que o executivo socialista construiu em “poucos meses” com a situação da Entidade de Transparência que se mantém sem água, eletricidade, internet e outros meios para “exercer atividade”. “Quando é propaganda, o primeiro-ministro é rapidíssimo a dar meios. Quando se trata da transparência é muito difícil”.
Entre as preocupações levadas pelos liberais ao Presidente da República estão a contratação dos médicos cubanos. “Não por se tratar de estrangeiros, mas pela violação de direitos humanos nessa contratação”, justificou Rui Rocha. A IL comunicou também uma proposta de alteração ao sistema eleitoral com um novo “círculo de compensação”. “Não podemos permitir que milhares de portugueses não encontrem destino para o seu voto”.
Chega acusa PS e PSD de “conluio” e de “calar” a justiça
André Ventura levou até ao presidente da República o caso das buscas a casa do ex-líder do PSD Rui Rio e da sede nacional do partido. Não “pelo caso em si”, mas pela “lógica de confronto institucional entre órgãos de soberania”, justificou o líder do Chega. “A ideia de que há um conluio entre os dois grandes partidos para calar ou condicionar a justiça merece preocupação e repúdio”. André Ventura acusou o PS de vir “cavalgar” a defesa apresentada pelo PSD. “O PS sempre quis condicionar a justiça e impedir o seu funcionamento”. O líder do partido reconheceu que a justiça pode ser “sujeita a crítica” – “não há um português ou uma empresa que não tenha uma razão de queixa” –, mas defendeu que os partidos não podem colocar em causa a “independência” e a “autonomia” das instituições. “Os portugueses querem uma justiça imparcial. Não pode haver um regime de exceção para os partidos”.
A atuação da justiça nas buscas a casa de Rui Rio tem sido alvo de críticas por várias figuras do PSD, PS e outros partidos – a última voz a mostrar solidariedade para com o ex-líder social-democrata foi Augusto Santos Silva. Pelo contrário, o líder do Chega pede ao presidente da República “atenção máxima” a esta tentativa de “afronta” e “menorização” da justiça por parte dos partidos do 'centrão'.
À parte desta polémica, o líder do Chega acusou o Governo de não conseguir cumprir as “metas” estabelecidas por Macelo na execução do PRR, no acesso ao SNS e na negociação com os professores. “Nada disto foi resolvido”, atirou. “Há uma incapacidade do Governo conseguir governar para além dos casos e casinhos”, acrescentou.
Montenegro não põe reforma da justiça na agenda (e levou “alternativa” a Marcelo
Quanto ao presidente do PSD, saiu de Belém assegurando ter dado ao Presidente da República "fundadas razões" para acreditar que o partido já é uma alternativa ao Governo - e a recusar desviar-se dos “temas que interessam à vida das pessoas” (frase na resposta às perguntas sobre o caso Rui Rio, que quase replicava a de Antonio Costa quando fugiu a dar esclarecimentos sobre a saída do secretário de Estado da Defesa).
"Não alinhamos na distração sobre aquilo que nos trouxe aqui hoje. O que nos trouxe aqui foi fazer uma avaliação do estado da nação portuguesa e habilitar o Presidente da República com a posição do PSD para os temas que interessam à vida das pessoas", disse, a dois dias do debate no parlamento sobre, precisamente, o estado da nação.
O líder social-democrata admitiu que a justiça é um desses temas centrais, mas disse não querer - "à boleia de um episódio lamentável" - escamotear o que diz serem "as necessidades e anseios dos portugueses", em áreas como a saúde, educação ou habitação.
Questionado se já convenceu o Presidente da República de que o PSD é uma alternativa ao Governo -- três meses depois de Marcelo Rebelo de Sousa ter considerado que ainda não existia uma alternativa sólida ao executivo do PS -, Montenegro considerou ter feito a sua parte. "A opinião do Presidente da República só ele poderá veicular, demos ao Presidente fundadas razões para que ele, como já acontece com muitos portugueses, possa confiar que Portugal tem uma grande alternativa política diante de si que é liderada pelo PSD", afirmou.
No final de hora e meia de reunião com o chefe de Estado, Montenegro deixou um diagnóstico muito negativo da governação do PS, que classificou como "de desesperança". "O país não tem esperança, não tem ambição, mas tem oposição e tem alternativa. Somos a alternativa que quer dar a Portugal condições de sonhar mais e melhor nos próximos anos, não nos conformamos com um país que pensa pequeno, um Governo que só pensa no dia seguinte", criticou.
Para o líder do PSD, ano e meio depois da maioria absoluta do PS "os portugueses estão mais pobres, têm salários baixos, uma dificuldade enorme em aceder a serviços públicos", a que acrescentou "as manifestas demonstrações de incompetência". "O que quero dizer aos portugueses é que no PSD não vamos desviar as atenções do essencial, a vida de cada português, de cada família, de cada empresa", assegurou.
PS encara “com otimismo e confiança" o futuro
Na última audiência, já noite dentro, o secretário-geral adjunto do PS rejeitou as críticas de falta de diálogo, acusando a oposição de ser incapaz de reconhecer qualquer mérito e de não constituir alternativa.
João Torres lembrou que "os portugueses confiaram ao PS uma maioria absoluta" nas legislativas de 2022 e elogiou a governação do executivo chefiado por António Costa, em particular o modo como respondeu aos efeitos da guerra na Ucrânia. "Tudo isto aconteceu apesar de termos uma oposição que manifestamente não tem estado à altura das suas responsabilidades. Esta é uma oposição que não é capaz de concordar, que não é capaz de reconhecer nenhum mérito, nenhuma boa notícia para o país, mesmo no contexto difícil que atravessamos", afirmou, em seguida.
João Torres descreveu o PS como “verdadeiramente uma maioria de diálogo”. E transmitiu ao chefe de Estado que encara "com otimismo e com confiança o momento presente e também o futuro".
No plano económico, o socialista referiu que "felizmente a inflação dá algumas notas de abrandamento mais sólido e mais sustentado". "Podemos dizer que estamos perante os primeiros mais consolidados de que estamos a sair de uma nova crise que tivemos de coletivamente enfrentar", sustentou.