Estado da Nação

Contas públicas com excedente, dívida pública em mínimos, carga fiscal em máximos

Estado teve excedente de 4,3 mil milhões de euros em 2023 e o esforço de última hora das Finanças colocou o rácio da dívida pública abaixo dos 100% do PIB. O revés da medalha é a receita fiscal e contributiva, que continua a bater máximos

Fernando Medina
Ana Baião

Quatro anos depois do excedente de 2019, o Governo voltou a repetir o ‘feito’ em 2023, cumprindo o desígnio das “contas certas” repetido ao longo da governação socialista.

No final de janeiro, a Direção-Geral do Orçamento (DGO) fez saber que as Administrações Públicas registaram um excedente orçamental de 4.330 milhões de euros, em 2023, em contabilidade pública.

Face a 2022, este desempenho traduz uma melhoria da receita efetiva em 12,1%, justificada pelo Executivo com a repetida “resiliência do mercado de trabalho tanto em volume de emprego como no crescimento das remunerações (mais 13,6% de IRS e mais 10,7% de contribuições sociais)”. Do lado da despesa observou-se, igualmente, um aumento de 9%, ajustado das medidas extraordinárias (aqui entram a redução do volume de medidas relacionadas com a Covid-19 e o montante “significativo” de medidas para mitigação do impacto do choque geopolítico).

Foi, igualmente, avançado pelo Ministério das Finanças que a receita fiscal aumentou 11,8%, fruto do crescimento do encaixe com impostos diretos (mais 14,4%) enquanto a receita contributiva “continua a espelhar a dinâmica observada no mercado de trabalho, aumentando 10,7% face ao ano anterior”.

Recorrendo aos dados do Banco de Portugal para aferir o valor da economia portuguesa em 2023 (em torno dos 266,5 mil milhões de euros) constatamos que o saldo orçamental terá ficado nos 1,6% do Produto Interno Bruto (PIB).

Medina dá o tudo por tudo e coloca dívida abaixo dos 100% do PIB

Do lado da dívida pública, num sprint na reta final do ano passado, a equipa do ministro das Finanças, Fernando Medina, deu o tudo por tudo para reduzir o seu valor para baixo dos 100% do PIB (os dados do gráfico são da Comissão Europeia até 2022 e do Banco de Portugal para 2023).

Pela primeira vez em 14 anos, a dívida pública caiu abaixo deste limiar, confirmou recentemente o Banco de Portugal, um feito que Fernando Medina destacou como o melhor desempenho desde 2009. “Este resultado faz-nos recuperar algo que não tínhamos desde a crise financeira e das crises seguintes”, disse o ministro. O stock da dívida desceu para 263 mil milhões de euros e o rácio caiu para 98,7% do PIB, muito abaixo dos 106,1% inicialmente previstos pelo ministro das Finanças.

Segundo Medina a queda não foi apenas em percentagem do PIB, mas também um recuo real da dívida (menos 9,4 mil milhões de euros), o que aconteceu apenas mais duas vezes nos últimos 50 anos, e as duas vezes “em ciclos de governação do PS”.

Portugal saiu do grupo dos países mais endividados da Europa, ficando atrás da Grécia, Itália, França, Espanha e Bélgica.

Dívida pública em queda e o regresso ao excedente em 2023

Em percentagem do PIB

Novo recorde na carga fiscal à espreita

É, por isso, de esperar que quando o Instituto Nacional de Estatística (INE) aferir o valor da carga fiscal para 2023 se volte a verificar um novo recorde.

Em 2022, a carga fiscal em Portugal atingiu os 36,4% do Produto Interno Bruto (PIB), um máximo que compara com os 35,3% no ano anterior, segundo dados do INE divulgados em abril do ano passado.

Carga fiscal continua a bater recordes

Em % do PIB

O valor dos impostos em Portugal aumentou 14,9% em termos nominais, atingindo 87,1 mil milhões de euros – a carga fiscal reflete o total dos impostos e das contribuições obrigatórias cobrados pelo Estado.

Recorde-se que, em 2021, a carga fiscal havia regressado a uma trajetória ascendente, “mais do que compensando” o decréscimo nominal do ano anterior, com as receitas fiscais das Administrações Públicas a fixarem-se em 75,6 mil milhões de euros, que era, até agora, o valor mais elevado da série.

Segundo o INE, considerando 2021, o último ano com informação disponível para a União Europeia (UE27) e excluindo os impostos recebidos pelas instituições da UE, Portugal continuou a apresentar uma carga fiscal (35,1%) inferior à média da União (40,5%).

A análise do INE é feita numa lógica de contabilidade nacional – a que conta para o apuramento do saldo orçamental segundo as regras nacionais e europeias – enquanto os dados do Governo são apresentados em contabilidade pública, ou seja, são sistemas diferentes que dão origem a saldos distintos, embora as tendências permaneçam idênticas.