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Ensaios

O futuro da Europa — o enigma chinês

Apesar das fortes relações comerciais entre a União Europeia e a China, a rivalidade geopolítica é inegável e tem crescido nas últimas décadas. Desde 2022, a invasão da Ucrânia pela Rússia e as posições antagónicas de Bruxelas e Pequim têm moldado a relação. Este texto faz parte de uma série de ensaios que o Expresso convidou especialistas a redigir, para perspetivar o futuro da União Europeia
O Presidente chinês, Xi Jinping (ao centro da imagem) reuniu-se em maio de 2024 com o seu homólogo francês, Emmanuel Macron, e a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen
LUDOVIC MARIN/AFP/Getty Images

“Um espectro ensombra a Europa”, escreveram Marx e Engels em 1848. A primeira frase do histórico “Manifesto Comunista” não perdeu atualidade, mas o “espectro”, agora, chama-se China, e a Europa deixou de ser o centro do mundo.

Outrora pobre e isolada, a China é hoje o maior parceiro comercial de mais de 120 países, desde a Austrália ao Brasil. A lista inclui o Japão e a Coreia do Sul, dois aliados cruciais dos Estados Unidos na Ásia-Pacífico, o novo centro do mundo e o principal palco da rivalidade sino-norte-americana.

Em Washington, líderes dos dois partidos que se revezam no poder encaram a ascensão da China como “a maior ameaça” à sua hegemonia. Para a Europa, é um “paceiro”, um “concorrente” e um “rival” ­­— as três coisas ao mesmo tempo, conforme os interesses de cada país e o estado do planeta. Nos anos 70 e 80, foi um “aliado estratégico” contra o inimigo comum, a União Soviética; depois, a “fábrica do mundo”; e, após a crise financeira de 2007/08, o “motor da recuperação económica global”.

Estados Unidos e China estavam então no “mesmo barco” e remavam na “mesma direção”, disse Hillary Clinton em Pequim, em 2009. No primeiro ano da Era Obama, a speaker do Congresso, Nancy Pelosi, também se deslocou à capital chinesa: “Estamos aqui para ouvir. Temos de aprender uns com os outros para podermos avançar”. Enquanto os Estados Unidos e a Alemanha entravam em recessão, a economia chinesa crescia acima dos 9%. “Anos de fartura”, diria o romancista Chan Koonchung. “A economia global entrou em crise e a Idade de Ouro da Ascensão da China começou”.