Ainda antes do terramoto político que conduziu à demissão de António Costa, já a direita pedia esta manhã eleições antecipadas, mal se soube da realização de 40 buscas, incluindo aos ministérios do Ambiente e das Infraestruturas e à residência oficial de António Costa. Mais cautelosa, a esquerda preferiu aguardar por mais desenvolvimentos, não pedindo consequências políticas. Mas o comunicado da PGR, ao final da manhã, – que anunciou a detenção do chefe de gabinete de Costa, que João Galamba foi constituído arguido e que o PM também seria alvo de um inquérito pelo Supremo no caso dos negócios do lítio e do hidrogénio – e a consequente demissão de Costa levou quase toda a oposição estar em sintonia. Tanto à direita, como a esquerda todas as forças políticas, exceto o PCP e o PAN, entendem agora que a única solução será a dissolução do Parlamento – posição que será transmitida a Marcelo esta quarta-feira nas audiências em Belém.
À direita, os partidos uniram-se numa só voz para pedir o primeiro cenário. Luís Montenegro defendeu que o atual Governo “não tem condições para continuar” e que não se pode “perder mais tempo”. Também a Iniciativa Liberal e o Chega não veem outra “solução” que não uma nova ida às urnas.
A leitura repete-se à esquerda, ainda que de forma menos categórica. Se o Bloco de Esquerda deixou claro que irá pedir novas eleições a Marcelo Rebelo de Sousa, o PCP defendeu que o país precisava de “soluções” e não de “eleições”. O PAN foi o partido que se colou mais ao lado dos socialistas. Com um Orçamento do Estado em fase de discussão, Inês Sousa Real alertou para o perigo de o país ficar numa gestão “em duodécimos”. Já o Livre deixou a decisão nas mãos de Marcelo, mas garantiu estar preparado para ir a votos.
Com o centro nevrálgico atingido, o PS disse apenas estar “preparado” para “qualquer circunstância”.
A bola está assim do lado do chefe de Estado, que depois de ouvir os partidos irá auscultar também os conselheiros de Estado, antes de falar na quinta-feira ao país. Nas suas mãos tem duas vias: convocar eleições antecipadas ou indigitar um novo nome socialista para chefiar o executivo de António Costa. Mas o cenário de eleições antecipadas parece cada vez mais próximo: resta saber se a dissolução da AR será imediata ou se ainda será aprovado o OE2024. E para quando serão convocadas as legislativas.
PSD promete “estar à altura da exigência deste momento”
“O Governo caiu e caiu por dentro. Não podemos esperar mais tempo”, defendeu perentório o líder do PSD, o último partido a reagir aos acontecimentos do dia, seis horas após o anúncio de Costa. Luís Montenegro pediu assim a convocação de eleições antecipadas, garantindo que o partido estará preparado para ir de novo às urnas. “Estaremos à altura da exigência deste momento”, prometeu o presidente dos sociais-democratas, numa declaração aos jornalistas na São Caetano à Lapa
Montenegro disse que o Governo socialista “volta a trazer um pântano à democracia portuguesa”, através de esquemas de “compadrio político”, que geram sempre “empobrecimento” no país. relembrando os últimos casos do Governo.
A “legitimidade do PS ruiu”, pela terceira vez, sendo altura "de responsabilizar e penalizar a reincidência de uma organização partidária que dá mostras de ceder muito rapidamente a esquemas de compadrio político”, insistiu, apelando a uma nova alternativa que deve ser escolhida pelos portugueses através de eleições antecipadas.
“Portugal não precisa de aventuras e soluções revolucionárias Estaremos à altura da exigência deste momento, estamos aqui para ouvir o povo português, para conquistar uma nova maioria e para formar um novo governo”, insistiu. Na audiência com Marcelo, Montenegro, espera assim que o chefe de Estado exerça as "competências constitucionais” e dissolva o Parlamento.
Questionado sobre a possibilidade de acordos com o Chega, o líder do PSD voltou a afastar essa possibilidade: “Não é não”, repetiu.
Chega pede eleições “o mais depressa possível”
Depois de sair em defesa da demissão de Costa e Galamba, na primeira reação de partidos aos acontecimentos do dia, André Ventura congratulou-se com a decisão do PM e sustentou que cabe ao chefe de Estado convocar eleições antecipadas "o mais depressa possível.
Embora reconheça que este “não é o melhor momento” para eleições antecipadas, em pleno processo orçamental, considerou que não há outra solução face à atual crise política.
E deixou desde logo um recado ao PR: uma substituição do líder do PS por outro ministro, como Fernando Medina ou José Luís Carneiro, seria apenas “adiar” o problema. Só através de eleições é que os portugueses poderão escolher o PM “legitimado”.
“Qualquer outra solução sem ser eleições será um agudizar da situação. Seria uma fraude e uma grande traição do PR", insistiu, recordando as palavras de Marcelo de há dois anos, quando disse que se o PR saísse do Governo, "a única solução é a dissolução do Parlamento”.
IL não vê outra solução a não ser eleições antecipadas
Após ter defendido logo na primeira reação a demissão do PM, presidente dos liberais reafirmou que António Costa não tinha condições para se manter no cargo e defendeu que não haverá solução a não ser a convocação de eleições antecipadas pelo PR.
“Era fundamental que António Costa assumisse as responsabilidades que lhe cabem, não só face à investigação que o visa diretamente, mas também às pessoas de quem se rodeou ao longo do tempo e estavam hoje a ser indiciadas ou investigadas por factos muito graves”, afirmou Rui Rocha, em declarações aos jornalistas nos Passos Perdidos.
Por isso, entende que não há outra solução que não passe pela dissolução da AR e consequente convocação de eleições. “Este não é apenas o fim político de António Costa como primeiro-ministro é também o fim de uma solução para o país que não funcionava”, atirou.
Numa nota de “confiança” e “tranquilidade”, o presidente da IL defendeu ainda que é preciso devolver aos portugueses a “oportunidade de se pronunciarem” e de confiarem na “capacidade de regeneração da democracia”. Sem se querer “imiscuir” da decisão que cabe ao chefe de Estado, vincou.
Bloco junta-se aos partidos que pedem eleições antecipadas, PCP é menos taxativo
Depois da IL e o Chega terem pedido claramente eleições antecipadas, o Bloco de Esquerda também anunciou a preferência por este cenário. Sem meias palavras, Mariana Mortágua afirmou que só novas eleições legislativas poderão resolver a atual crise política. “É isso que iremos comunicar ao presidente da República”, disse a partir da sede nacional do Bloco de Esquerda, em Lisboa. Na sequência da demissão de António Costa, o presidente da República irá ouvir todos os partidos políticos com assento parlamentar durante esta quarta-feira, dia 7. No dia seguinte, haverá Conselho de Estado e, só depois, Marcelo Rebelo de Sousa deverá comunicar a decisão quanto ao futuro político do país.
Com o líder de uma maioria absoluta a sair devido ao comunicado da Procuradoria-Geral da República - que informou que será aberto um processo autónomo a António Costa no âmbito das investigações ao lítio -, Mariana Mortágua colocou como “principal responsabilidade” da justiça o esclarecimento de “todas as suspeitas levantadas”. “Em democracia, não é saudável que permaneçam suspeitas desta natureza sob um primeiro-ministro", disse.
Já o PCP, ex-parceiro de geringonça do PS e do Bloco, optou por mais contenção nas palavras. “Tivemos há um ano e meio uma situação em que o presidente da República entendeu convocar eleições antecipadas. O país não precisava de eleições, mas de soluções”, disse Paulo Raimundo. Ainda assim, o secretário-geral do PCP garantiu que o partido está “pronto” para enfrentar eleições, caso essa seja a decisão de Marcelo Rebelo de Sousa. “Estamos prontos para essa batalha”.
Livre deixa decisão nas mãos de Marcelo, PAN preferia outras “soluções”
Se na parte da manhã, Rui Tavares admitia manter a “serenidade vigilante” face ao Governo, apesar da notícia das buscas, a demissão do PM levou o deputado do Livre a admitir que essa solução pode estar em cima da mesa. E que até podia ser positiva para o partido, mas “primeiro” está o país.
Deixou nas mãos de Marcelo a decisão de dissolver o Parlamento, garantindo que o partido está preparado para um cenário de eleições antecipadas: “Este é o tempo do PR, depois de ouvir os partidos e o Conselho de Estado”, afirmou o deputado único, reconhecendo que a situação do país é “séria”.
Depois de não ter defendido esta manhã a demissão do PM, Tavares justificou que o Livre “não é um partido incendiário numa situação que já é inflamável para o país” e "respeita os órgãos de soberania". O deputado único considerou, contudo, que o caso dos negócios do hidrogénio e do Lítio tem que ser esclarecido “num futuro próximo” e os partidos também devem contribuir para a solução para o país.
Já o PAN, o outro ‘parceiro’ do Governo, reagiu ainda de forma mais recuada, considerando que eleições antecipadas não serão a saída desejável para o país, em pleno processo orçamental.
O partido não quer um país “em duodécimos” ou com o PRR “por executar”, defendeu Inês de Sousa Real, apontando para a necessidade de “estabilidade” (depois de uma legislatura interrompida em 2021) e "respostas agora" para os problemas dos portugueses.
A porta-voz do PAN admitiu, à semelhança de Paulo Raimundo, que o partido espera ouvir também amanhã as “soluções” do chefe de Estado “para além da dissolução”.
PS preparado para “qualquer circunstância” neste momento “inesperado”
A notícia da demissão de António Costa foi uma surpresa até dentro do próprio PS. Na reação à saída de cena do primeiro-ministro, Carlos César começou por falar nos momentos “inesperados e difíceis” que o país enfrenta. Quanto ao futuro político da governação, o presidente do PS preferiu deixar nas mãos do presidente da República. “O PS está preparado (ou tem capacidade para se preparar) para qualquer uma das duas circunstâncias”, garantiu.
Em resposta aos jornalistas, Carlos César recusou revelar se o PS irá ajustar os calendários do congresso do partido, marcado para 15 de março. Primeiro irá ouvir a decisão de Marcelo Rebele de Sousa, só depois falará dos próximos passos dentro do seu partido.
Com vários membros da comissão permanente do PS na assistência (como Eurico Brilhante Dias, Jamila Madeira, Pedro do Carmo, Elza Pais e Vera Braz), Carlos César defendeu a decisão de António Costa. “Cabe-me a mim prestar homenagem à exemplaridade do seu gesto e grande sentido de responsabilidade evidenciado. Agiu como quem sempre pôs em primeiro lugar a credibilidade das instituições”, disse.
Por fim, o presidente do PS fez questão de deixar algumas palavras sob o “legado” que António Costa deixa depois de oito anos à frente da governação do país. “Portugal está melhor, reganhou a confiança junto dos mercados e o prestígio junto das instituições europeias, e isso deveu-se à condução lúcida e firme que [António Costa] sempre empreendeu”.
No anúncio da demissão, António Costa avançou que não se irá recandidatar à liderança do PS no cenário de eleições antecipadas. Significa que, caso o presidente da República opte por essa via, os socialistas terão de nomear um novo nome para encabeçar as próximas legislativas. O ministro das Finanças, Fernando Medina, ou o ex-ministro das Infraestruturas e Habitação, Pedro Nuno Santos, poderão estar no topo da lista de opções.