Depois do PSD, foi a vez de a Iniciativa Liberal (IL) acusar Augusto Santos Silva de ser o responsável pela não inclusão do 25 de Novembro nas comemorações dos 50 anos do 25 de Abril. A polémica dominou o arranque das declarações políticas esta quarta-feira no Parlamento e aqueceu os ânimos, com o líder liberal, Rui Rocha, a dirigir “palavras duras”– como o próprio reconheceu – ao presidente da Assembleia da República (AR). O que obrigou Santos Silva a defender-se e dizer que espera que o PS comemore a data.
“Por decisão do presidente da AR, mal, o 25 de Novembro foi riscado das comemorações oficiais do Parlamento, que vai assinalar várias outras datas relacionadas com a democratização, como as primeiras eleições. Esta decisão revela um profundo desprezo pela história da consolidação da democracia”, começou por afirmar Rui Rocha, acusando o presidente da AR e o PS de serem “negacionistas” da História. Segundo o presidente dos liberais, Santos Silva “esconde-se atrás do consenso” dos partidos na comissão organizadora e conferência de líderes e revela uma ”tremenda cobardia política", um “deplorável oportunismo” e uma "enorme hipocrisia", para agradar a “extrema esquerda”.
Á semelhança do que já tinha sido feito pelo líder parlamentar do PSD, Miranda Sarmento, em conferência de imprensa, citou Mário Soares, ao dizer que "o 25 de Novembro foi um momento fundamental para impedir que se instalasse uma ditadura de cariz comunista em Portugal" e recordou ainda as palavras do próprio Santos Silva há mais de uma década quando afirmou que "a democracia em Portugal se devia a Mário Soares e a Salgado Zenha e não a Álvaro Cunhal ou a Mário Nogueira".
Pelo PSD, Hugo Oliveira reiterou o que dissera na segunda-feira o líder parlamentar que a decisão foi “exclusivamente” de Santos Silva e desafiou o presidente da AR a esclarecer se considerava que a data devia constar do programa das comemorações. Santos Silva garantiu que já teve oportunidade de defender a importância da efeméride.
Recordar Eanes
“Quando discutimos na comissão organizadora esta questão, lembro-me muito bem de ter dito: percebo que o consenso não é possível, mas devo dizer que espero que o meu partido comemore o 25 de novembro”, respondeu o presidente da AR, acrescentando que o programa das comemorações foi aprovado, em julho, por consenso entre os partidos na comissão organizadora, a que preside. “O que significa que nenhum grupo parlamentar se opôs”, vincou, sob os aplausos da bancada do PS.
Nesta altura, o socialista Porfírio Silva também pediu a palavra para sair em defesa de Santos Silva. O deputado acusou a IL de "concorrer em radicalismo" com a bancada do lado, referindo-se ao Chega e citou Ramalho Eanes, que considerou que o “25 de Novembro foi um momento fraturante" e os "momentos fraturantes não se comemoram, refletem-se”. “Este é o teatro de quem não quer comemorar o 25 de Abril e quer comemorar uma data fraturante como o 25 de Novembro”, prosseguiu.
Na semana passada, Rui Rocha já tinha criticado a não inclusão do 25 de Novembro nas comemorações parlamentares dos 50 anos do 25 de Abril. “A IL não pactua nem com tentativas de reescrever a História nem com enviesamentos esquerdistas que revelam reserva mental quanto aos momentos decisivos para a consolidação da democracia e da liberdade dos portugueses, e continuará a afirmar o papel central do 25 de Novembro”, escreveu na rede social X (antigo Twitter).
Também Miranda Sarmento aproveitou a conferência de imprensa, desta segunda-feira sobre as prioridades do PSD para o OE2024 para alfinetar ainda mais Santos Silva. “A decisão fica exclusivamente na esfera do presidente da AR. Choca-nos que não queira comemorar o 25 de Novembro, talvez com receio de irritar antigos parceiros da geringonça”, atirou.
PS vai assinalar 25 de novembro
Desde que Carlos Moedas, no discurso do 5 de outubro, lançou o tema das comemorações da data que pôs fim ao PREC e desde que foi conhecido que essa data não constava das celebrações oficiais da Assembleia, vários foram os socialistas que saíram em defesa da data histórica - não obstante a polarização esquerda/direita que o tema provoca.
Ao Público, Ana Gomes, proveniente da ala mais à esquerda do PS, foi das primeiras em sair em defesa da celebração da data: “Para mim, é indissociável celebrar um e outro”, disse, afirmando que nem Mário Soares permitiria tal coisa e acusando o PS e Augusto Santos Silva de ceder ao PCP.
Também o deputado Sérgio Sousa Pinto saiu em defesa da data e a polémica à volta do tema - que fez o PSD acusar os socialistas e o Presidente da AR de estarem a evitar a data para “não irritar” o PCP - levou o líder parlamentar socialista a escrever um artigo de opinião no Público a deixar claro que “o PS não deixará de assinalar o 25 de novembro como uma data de uma jornada que para nós começou muito antes na luta por um país livre e democrático, e que tem no 25 de abril de 1974 uma data única, fundadora e libertadora”.
Para Eurico Brilhante Dias, contudo, a ideia de Carlos Moedas não deixa de ter de ser enquadrada numa espécie de provocação e de disputa eleitoral à direita. "Há uma direita que usa o 25 de novembro para afrontar o 25 de abril, encontrando sempre espaço para justificar o "24 de abril", escreveu, insistindo que, “para o PS, o 25 de novembro é uma data importante do processo de democratização então em curso, que salvaguardou a legitimidade do voto constituinte, preservou o próprio PCP como participante essencial da democracia portuguesa, e abriu espaço para uma Constituição Democrática em 1976”.