António Costa voltou a ser questionado sobre a mudança não anunciada do presidente do Tribunal de Contas [TdC] e até agradeceu as perguntas dos jornalistas, porque não gostou de muitas críticas que leu ou ouviu. “As instituições não são o seu presidente. O TdC é composto por um conjunto vasto de conselheiros. O atual cumpriu integralmente o seu mandato", começou por dizer o primeiro-ministro, lembrando que foi ele próprio quem o nomeou há quatro anos.
Mas depois de Marcelo Rebelo de Sousa ter dito, no domingo, que não teve "mais informação" sobre a substituição do que a leu nos jornais, e depois também de Marcelo ter repudiado "compadrios, clientelas e corrupções", exatamente as expressões usadas pelo TdC no aviso sobre as novas leis de simplificação administrativa na aplicação de fundos comunitários (entre outros investimentos), Costa prendeu o próprio Marcelo à sua escolha de mudar de chefe da instituição: "Como o sr Presidente da República teve ocasião de explicitar, é entendimento do Governo e Presidente que não deve haver lugar à renovação de mandato, para garantia da independência da função".
A alegada concordância no critério teve, para Costa, um momento definidor na (também) polémica mudança da antiga Procuradora-Geral da República, Joana Marques Vidal, há dois anos. E Costa disse-o agora, para lembrar: "Esse foi o critério definido para a PGR e não faria agora mudar de critério. Por isso liguei ao anterior presidente, que terminou as funções a 30 de setembro, agradeci, mas seguramente o TdC prosseguirá a sua missão". O primeiro-ministro vincou ainda a ideia, com um aviso: "Um critério pode ser bom ou mau, mas este foi o critério. O PR explicitou-o de forma muito clara. O que seria estranho era mudá-lo à medida de cada um". Para ainda lembrar que relativamente às críticas de há dois anos sobre a mudança na PGR, "os motivos de suspeição não se justificaram".
O primeiro-ministro, de resto, assinalou não apenas que não recuará, como deixou claro que, no seu entender, Vítor Caldeira não está já em funções: "Neste momento o vice-presidente assume as funções", disse Costa. A mudança súbita não é, porém, consensual também. Na segunda-feira, o jornal Público citava vários juristas que estranhavam a ideia (até então não confirmada) de que Caldeira teria de sair imediatamente do cargo, explicando que a tradição é que o presidente fique em funções até haver sucessor. Neste caso, ainda não há. Mais: se o PM transmitiu essa indicação a Vitor Cabral na semana passada, Caldeira esteve presente na cerimónia do 5 de outubro ainda na segunda-feira.
O que António Costa recusa é que a mudança tenha relação com o parecer do TdC sobre a nova lei que quer simplificar os processos de investimento, proposto pelo Governo e neste momento em discussão no Parlamento. "Não faz o menor sentido: há quatro anos que se sabia qual era o termo do mandato, 30 de setembro. Não se sabia sequer que havia pareceres. Eu só soube do parecer depois. O parecer não é do presidente, é do TdC. Aliás, com toda a legitimidade para que o Parlamento o tenha em conta." Costa quis sublinhar que "no processo legislativo é importante pedir outras opiniões para ter em conta" e disse mesmo que a "AR deve ponderar tudo." Acrescentando mesmo que "em matéria de contratação pública o Governo podia ter legislado", mas que decidiu entregar o diploma à AR "porque estes regimes são muito sensíveis".
Para Costa, nesse processo, é preciso "conciliar o máximo transparência com mínimo de burocracia." E "é preciso máximo de consenso". Mas sem prescindir do objetivo: "Precisamos de um regime que dê segurança jurídica na prevenção de corrupção e mau uso, mas também agilidade necessária. É cumprir lei e cumprir os prazos." Os prazos da "bazuca" europeia de resposta à crise, já se sabe, são apertados. E há muitos milhões para investir. "Uma das causas de baixo investimento tem a ver com a enorme burocracia", lembrou o primeiro-ministro.
Já sobre as críticas de Ana Gomes ao mesmo diploma, candidata presidencial da área do PS (embora sem o apoio do partido), costa rematou de forma seca: "Não sei, não ouvi".