O cérebro humano tem resiliência, e curiosamente é essa resiliência que acaba por retardar os primeiros sintomas de uma doença como o Parkinson. “Há quem estime que cerca de 40% dos neurónios dopaminérgicos já degeneraram na altura em que a pessoa começa a ter os primeiros tremores”, responde Luís Miguel Oliveira, o investigador português que lidera a equipa de cientistas da Fundação Michael J. Fox.
Os métodos de diagnóstico mais comuns recorrem a análise e deteção de sintomas. E essa é a razão porque, além de chegarem tarde, os métodos atuais apresentam taxas de erro "na ordem dos 15%, 20%, principalmente se o diagnóstico for feito bastante cedo na doença”.
É perante este cenário que a equipa liderada por Luís Miguel Oliveira pode ajudar a fazer a diferença com um novo método de diagnóstico que tem por base a deteção da proteína alfa-sinucleína. “Não sabemos exatamente quando é que o teste fica positivo, mas sabemos que acontece antes dos sintomas aparecerem”, refere o cientista sobre a deteção da proteína que está associada à doença de Parkinson.
Sabe-se que Alfa-sinucleína está presente em diferentes tecidos dos pacientes de Parkinson, mas ainda não há consenso sobre o papel desempenhado pela proteína. Luís Miguel Oliveira admite que, eventualmente, a Alfa-sinucleína contribui para a progressão da doença, mas prefere manter a atenção focada nume métodpo de deteção desta proteína. E é aí que surge um desafio sobre a recolha de amostras do paciente.
O método desenvolvido pela equipa de Luís MIguel Oliveira implica uma punção lombar com agulhas compridas que penetram nas costas do paciente. Para os tempos mais próximos, os trabalhos na Fundação Michael J. Fox vão ter por prioridade um método de recolha de amostras que seja menos complexo e desagradável para os pacientes, explica o cientista que se deslocou a Lisboa para participar no Global Health Forum.
“Talvez uma pequena biópsia da pele ou até uma zaragatoa para tirar um pouco da mucosa olfativa...”, refere o cientista, apontando alternativas para o futuro método de recolha de amostras dos pacientes.
Na equipa liderada por Luís Miguel Oliveira, há a expectativa de que o método de diagnóstico que está a ser desenvolvido possa vir a ter, eventualmente, aplicação na deteção de Alzheimer e outras doenças neurodegenerativas, além do Parkinson.
O diretor da Fundação Michael J Fox recorda que a doença Parkinson, com cerca de um milhão de doentes diagnosticados nos Estados Unidos, tem um impacto anual de mais 50 mil milhões de dólares devidos aos custos clínicos e sociais implicados. E é esse impacto que tentou ilustrar ao responder a um dos dois desafios que costumamos colocar aos entrevistados com um gráfico produzido pela Fundação Michael J. Fox.
No Alzheimer, um estudo deste género deverá apurar um impacto “muito maior”. E não há perspetivas de o panorama melhorar no futuro – e por isso na Fundação Michael J. Fox há estimativas de que o impacto económico destas doenças neurodegenerativas possa passar para o dobro em 2040.
No Parkinson, o cientista esclarece que as terapias mais comuns, com cocktails de medicamentos, apenas repõem níveis de dopamina, mas “a degeneração continua a ocorrer” e os doentes “continuam a perder neurónios dopaminérgicos”.
Para ilustrar o drama de pacientes e famílias afetadas pelas duas doenças, Luís MIguel Oliveira trouxe, num segundo desafio do Podcast Futuro do Futuro, um excerto do filme The Father.
A estimulação profunda do cérebro recorre a implantes cerebrais que produzem efeitos muito rápidos – mas não evita que a degeneração de neurónios prossiga o seu curso. E por isso, a descoberta de cura ou tratamento continuam a perfilar-se como uma das principais metas para a comunidade científica.
Luís Miguel Oliveira diz-se otimista, apontando para os tratamentos que prometem um retardamento da doença na ordem dos 30%. “Ainda não é uma cura, ainda não conseguimos parar a progressão da doença na sua totalidade, mas estamos agora a começar a modificar os mecanismos”, refere.
Sobre o ator Michael J. Fox, que dá nome à fundação, recorda que foi diagnosticado com Parkinson quando tinha apenas 29 anos e estava “no auge da carreira”. “Visita-nos três a cinco vezes por ano, quando entende que é uma boa altura para nos visitar. É sempre uma pessoa muito inspiradora”, conclui o cientista português.
Hugo Séneca conversa com mentes brilhantes de diversas áreas sobre o admirável mundo novo que a tecnologia nos reserva. Uma janela aberta para as grandes inovações destes e dos próximos tempos