Cresceu em Setúbal, mas foi em Lisboa que nasceu porque o pai era “alfacinha de gema”. Vivia com os pais, os três irmãos e a avó.
Sempre quis ser professor. Em pequeno, a mãe, professora, leva-o para a escola nas férias de verão e ele ajudava-a a fazer as turmas e a ordenar os nomes por ordem alfabética. “Não gostava de jogar à bola, gostava mais de dicionários”, recorda.
É escuteiro desde os nove anos e o escutismo ainda faz parte da sua vida. Fez teatro e trouxe algumas fotografias para recordar esses tempos.
Nasceu antes do 25 de Abril, em novembro de 1972, mas cresceu numa altura em que a política estava em “todo o lado”. Depois da Revolução, o país ficou “demasiado frágil” e viu a “miséria” à porta de casa. “Tinha amigos que não tinham casa, viviam em barracas. Tinha duas colegas de turma que aos 14 anos prostituíam-se”, revela.
“Nunca nos faltou nada”. Os pais tinham carro, gozavam férias no verão e nunca lhes faltou comida à mesa. Cresceu “irritado” com os privilégios que tinha e as desigualdades sempre o incomodaram. “Ficava muito revoltado porque não percebia o porquê de eu ter e os outros não”, confessa.
É professor catedrático de Linguística, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Veio da academia para a política sem um “passado político”. Trabalhou no Ministério da Educação durante oito anos, primeiro como secretário de Estado depois como ministro de António Costa.
Nunca achou que ia ser político. Muito menos ministro. Quando chegou ao cargo, não tinha “ilusões” e sabia que aquele cargo não tinha a melhor “fama”. Nesta conversa com Bernardo Ferrão recorda esses tempos, não muito distantes. Fala das reuniões com os sindicatos dos professores - sempre “cordiais e simpáticas" apesar do que passava cá para fora -, e das dificuldades que teve como ministro nomeadamente com a reposição do tempo de serviço dos professores em boa parte resolvida pelo seu sucessor, o atual ministro Fernando Alexandre.
“O dinheiro nunca chega para tudo e para satisfazer todas as exigências. Tentei mexer nos problemas estruturais do ensino e não consegui porque os sindicatos rejeitaram”, conta.
Deixou o cargo no final do ano de 2023, depois das buscas à residência oficial do então Primeiro-ministro, mais concretamente ao gabinete do chefe de gabinete Vitor Escária. “Hoje tenho mais tempo para sair, pensar, escrever e dizer o que me apetece. Foram tempos duros, foi uma pasta pesada”, desabafa.
Tem refletido sobre o papel da escola pública e o que mudou nos últimos anos. “É mais difícil ser professor”, o tipo de aluno mudou, a “escola deixou de ser das elites” e as atitudes dos pais são outras.
“Ser pai não me dá o direito de negar ao meu filho o acesso à informação", responde remetendo-se ao caso dos pais de Famalicão, uma polémica que também marcou o seu mandato. Aliás, sobre o assunto mantém a mesma posição: "A disciplina de cidadania pode ser comparada ao português e à matemática, é informação”, remata.
O antigo ministro da Educação, João Costa, é o convidado do novo episódio do Geração 70. Ouça aqui a entrevista.
Geração 70 não é um podcast de política ou de economia, nem de artes ou ciência. É uma conversa solta com os protagonistas de hoje que nasceram na década de 70. A geração que está aos comandos do país ou a caminho. Aqui falamos de expectativas e frustrações. De sonhos concretizados e dos que se perderam. Um retrato na primeira pessoa sobre a indelével passagem do tempo, uma viagem dos anos 70 até aos nossos dias conduzida por Bernardo Ferrão