Dois minutos bastaram para o alemão Sven Giegold apontar baterias às autoridades portuguesas, acusando-as de falharem na deteção de escândalos financeiros. O eurodeputado dos Verdes juntou várias casos num único rol, de que o Luanda Leaks é apenas o mais recente exemplo: contou o Football Leaks, a Zona Franca da Madeira e até os "milhares de vistos Gold" atribuídos. Em plena intervenção no Parlamento Europeu, Giegold somou tudo e, sem hesitar, diagnosticou um problema de Estado de Direito, defendendo que a Comissão Europeia "tem de agir".
Depois do alemão também o bloquista José Gusmão levou Portugal para o debate, atribuindo-lhe "responsabilidades nacionais" no escândalo do Luanda Leaks, enquanto a social-democrata Lídia Pereira admitiu que o combate à lavagem de dinheiro "é uma questão de Estado de Direito e de defesa dos direitos humanos".
Mas nem Lídia Pereira falou em Portugal, nem Gusmão mencionou um problema de Estado de Direito. A acusação mais dura ficou com Giegold, que há anos é uma das vozes críticas no Parlamento Europeu, em matéria de lavagem de dinheiro e evasão fiscal.
Nem o colega de bancada, Francisco Guerreiro, foi tão longe como o alemão. Ainda assim, o eurodeputado do PAN juntou-se a Giegold nas críticas ao "incompreensível" sistema de vistos Gold, que acusa de falhar na criação de emprego e de estar ligado "à entrada de capitais duvidosos" no país.
Problema é dos 27
A sessão plenária sobre o combate contra o branqueamento de capitais decorreu já ao final da tarde desta quarta-feira, em Estrasburgo, e com a maioria das cadeiras do hemiciclo vazias. O caso do Luanda Leaks foi o pretexto para discutir um problema que não se fica pelos negócios de Isabel dos Santos, nem é exclusivo de Portugal.
João Ferreira, do PCP, atribui também culpas à atuação da União Europeia. Diz que "o combate ao branqueamento de capitais" e "à evasão e elisão fiscais" continua "limitado por um nó que a União Europeia não se mostra interessada em desatar". E esse nó são, segundo o comunista, "os paraísos fiscais com os quais a União Europeia convive".
Também Gusmão fala numa responsabilidade das instituições europeias para "perceber que, se há jurisdições nacionais que estão a facilitar o branqueamento de capitais, a evasão fiscal e a criminalidade financeira", então os restantes membros da UE "têm de impedir que isso aconteça". E aqui o recado é também para a jurisdição de Malta.
Já o socialista Pedro Marques aponta o dedo à supervisão e a uma atuação "insuficiente" das várias autoridades. "Precisamos de regimes coerentes de supervisão", defende o eurodeputado, que pede também "mais cooperação".
As últimas revisões da diretiva sobre o branqueamento de capitais reforçaram os deveres de vigilância de bancos, auditores, advogados, consultores fiscais sobre as transações suspeitas dos clientes.
No entanto, no caso da quinta revisão - que visa acabar com a opacidade das empresas de fachada utilizadas para fugir ao fisco e lavar dinheiro - Bruxelas fez hoje saber que há oito países que ainda não transpuseram as novas regras para a legislação nacional. Portugal está na lista, juntamente com Hungria, Países Baixos, Roménia e Espanha. A transposição deveria ter acontecido até 10 de janeiro. A Comissão Europeia lamenta que haja países que não o tenham feito e avisa que devem fazê-lo e "com urgência".
"As lacunas legislativas de um Estado-membro têm impacto no conjunto da UE. Por isso, as regras da UE devem ser aplicadas e supervisionadas de forma eficiente, a fim de combater a criminalidade e proteger o nosso sistema financeiro", foi dito em comunicado. Num recado, repetido depois pela comissária para a Igualdade, Helena Dalli, durante o debate no Parlamento Europeu.
Para final de março, a Comissão Europeia já prometeu apresentar um plano de ação contra o branqueamento de capitais.