Exclusivo

Guerra na Ucrânia

A Rússia contra-ataca em Kharkiv: será manobra de diversão, zona de tampão ou tentativa de conquistar a segunda maior cidade da Ucrânia?

Confusos com a aparente irreflexão do Kremlin, os analistas militares têm apontado três teorias para explicar a tentativa russa de voltar a atacar Kharkiv. Mas pode haver outra possibilidade: o regresso da “fragmentação na estrutura militar” do início da guerra

Bombardeamentos na região de Kharkiv
Anadolu

Quando há muita discussão entre os observadores militares em torno de uma decisão da Rússia, "talvez seja um indicador de que a decisão não se baseia em princípios lógicos impecáveis", diz ao Expresso Anders Nielsen, analista militar da Royal Danish Defence College. Nielsen refere-se à ofensiva que os militares russos resolveram lançar, no início de maio, em Kharkiv, a segunda maior cidade ucraniana. As forças russas estão a empreender uma ofensiva em todos os setores da linha da frente. Estão a exercer forte pressão a sul, a leste, e, agora, também a norte. “Não vemos, nos princípios militares, qualquer conselho para o espalhamento das forças em vários pontos, para pressionar em muitos lugares”, aponta Anders Nielsen. "Pode ser isso que os russos estão a fazer."

No início da guerra, muitos analistas militares criticaram a estratégia russa, dizendo que não havia um comando seguro e uma hierarquia fixa à qual obedecer na linha da frente. Além de a estrutura militar ser fragmentada, vários focos de interesse competiam por recursos e resultados espetaculares. Depois, as Forças Armadas russas optaram por adotar um plano único e coerente. “Quando vejo o que está a acontecer agora na Ucrânia, não consigo evitar questionar-me se o que vemos não é um retrocesso àquele ponto de partida”, admite o analista militar sediado na Dinamarca. "Talvez vários generais estejam a competir por grandes resultados que vão agradar às pessoas em Moscovo."

Há uma história que pode ajudar a desvelar a história toda. O responsável pelas unidades que estão a combater no norte da Ucrânia é o general Aleksandr Lapin, que, em 2022, encarregava-se de toda a operação na Ucrânia. Foi demitido depois de, na contraofensiva na região de Kharkiv, os ucranianos terem recuperado aquela área. Lapin foi criticado por ter sido negligente a ponto de deixar a reconquista acontecer. Desde então, Aleksandr Lapin tem tentado recuperar estatuto na hierarquia militar, e agora comanda as forças do norte. "Talvez tenha motivos pessoais para querer reaver Kharkiv, pode querer mostrar que consegue alcançar resultados", concede Anders Nielsen, que vê na renovada aposta em Kharkiv um sinal da “fragmentação na estrutura militar” da Rússia. "Como observadores externos, tendemos a acreditar que há um plano coerente", refere o analista, esclarecendo também que plano poderá ser esse.