Ao longo de 16 meses de guerra, as forças russas não pouparam em criatividade para “aterrorizar” os militares (e civis) ucranianos. ("Aterrorizar", assim mesmo, como foram descrevendo alguns dos analistas ouvidos pelo Expresso.) No entanto, os estrategos russos não contavam encontrar adversários à altura. Depois de as tropas da Ucrânia terem conduzido mais um ataque contra uma ponte, que ligava a região de Kherson à Crimeia, tornou-se evidente, de acordo com os investigadores da área da Defesa, que os ucranianos são também capazes de provocar o pânico entre as tropas inimigas. “O ataque à ponte de Chonhar deve ter um efeito psicológico”, argumenta Marina Miron, investigadora do Centro de Ética Militar do Departamento de Estudos de Defesa, em Londres, e analista da área de conflitos modernos. "Mesmo que a ponte seja consertada, as forças russas em Kherson não devem sentir-se seguras, seguindo o raciocínio ucraniano."
A retirada do Grupo Wagner do campo de batalha na Ucrânia é “extremamente desestabilizadora para o esforço militar russo”, lembra também Maximiliam Hess, analista de geopolítica do ‘think tank’ norte-americano Foreign Policy Research Institute. “A melhor unidade de combate a mover-se e a atacar o Exército russo pela retaguarda abre uma grande oportunidade para a Ucrânia, que pode, assim, avançar com sua contraofensiva.” Esta pode ser a “primeira grande oportunidade da Ucrânia”, considera também Kelly Grieco. A analista não tem dúvidas de que os soldados ucranianos tentarão tirar proveito dos mais recentes desenvolvimentos.“Independentemente de como a revolta se desenrole, nos próximos dias, o comando e controlo da Rússia, bem como a coesão militar, serão afetados negativamente."
O caos político-militar só pode ajudar a Ucrânia na sua contraofensiva, advogam os analistas. “Espero que os ucranianos aguardem alguns dias e, se o caos continuar, tentem algo dramático”, admite Alexander Motyl, professor de Ciência Política na Universidade Rutgers-Newark, nos Estados Unidos, e especialista em Ucrânia, Rússia, URSS e nacionalismo. É uma ajuda tremenda, sublinha também Maximilian Hess, analista de geopolítica do ‘think tank’ norte-americano Foreign Policy Research Institute. “Espero que os ucranianos estejam a apreciar os eventos, e que possam explorá-los para recuperar um território significativo.” A debandada do Grupo Wagner, no leste, abre, assim, uma brecha para o contra-ataque. “Não estou a dizer que o Grupo Wagner e a Ucrânia vão ser aliados, certamente que não. Mas é uma tremenda oportunidade.”