É jornalista várias vezes premiada, documentarista, escritora. Chama-se Eliane Brum e, por estes dias, a partir da sua coluna no jornal “El País”, é uma das vozes que vincula a dura realidade brasileira com o mundo, uma realidade assolada pela pandemia. Autora do livro “Brasil, construtor de ruínas”, que documenta a história do país desde Lula até aos primeiros cem dias de Governo de Jair Bolsonaro.
É também ativista contra a destruição da Amazónia, região onde se radicou em 2017, justamente por considerá-la o centro do debate sobre o futuro do Brasil e do planeta. Centro que a mistura explosiva do bolsonarismo com a pandemia tornou ainda mais frágil, mais mortal. Ao Expresso, Eliane Brum relata como a emergência criada pelo coronavírus está a servir de oportunidade ao desmatamento da Amazónia e como, no gigante sul-americano de 210 milhões de habitantes governado por um “perverso”, a morte tem classe social.
Como descreve o quotidiano do Brasil em tempo de pandemia?
O quotidiano que eu acompanho é o de Altamira, na Amazónia. É o terceiro município do mundo e o maior do Brasil. Foi afetado por vários projetos do Governo, causando o deslocamento de pessoas, que foram lançadas na periferia da cidade. Altamira virou a cidade mais violenta da Amazónia e o epicentro do desmatamento e dos incêndios do ano passado. A pandemia entra nesse contexto e torna tudo mais difícil. Soma-se a todas as outras violências, a um sistema de saúde extremamente precário. Nesta região, as crianças indígenas morrem de gripe comum. Há protestos para a abertura do comércio, contra o isolamento, contra qualquer ação de proteção, lideradas pelos ‘grileiros’ — os grandes ladrões de terras públicas, que são também os grandes destruidores da Amazónia, ligados ao Bolsonaro. Em toda a parte, relatos de camponeses e de indígenas dão conta de camiões com árvores recém-cortadas que estão saindo da floresta sem controlo. Ou seja, está-se a usar a pandemia para aumentar o desmatamento, que em abril foi 64% mais elevado do que em abril do ano passado. Então, o contexto da pandemia, que agora explodiu na Amazónia como em todo o Brasil, é um contexto que caminha ao lado da destruição da floresta.