Internacional

A irmã de Juan Carlos que tem uma medalha de honra do Governo português: Dona Pi (1936-2020)

Pilar de Borbón viveu quase 30 anos em Portugal, onde se casou, nos Jerónimos (Lisboa). Ficou conhecida pela sua espontaneidade e por estar quase até ao fim da vida arredada dos escândalos

Pilar de Borbón, numa entrevista para a agência Efe, em Madrid, em novembro de 2018
EPA/Ballesteros

Foi em abril de 2016 que a infanta Pilar de Borbón, irmã do rei emérito Juan Carlos e duquesa de Badajoz, se viu envolvida no que se pode considerar o único grande escândalo da sua vida pública – o que não é coisa pouca no âmbito de qualquer realeza que se preze.

O seu nome apareceu ligado a uma offshore no Panamá, criada pelo marido em 1969 e que só foi dissolvida em junho de 2014, poucos dias depois da coroação do sobrinho e atual rei, Filipe VI. Explicou então em comunicado que a firma "nunca teve lucros fora do controlo das autoridades fiscais" e que tinha sido dissolvido por “não contar com recursos suficientes nem expectativas de os ter".

Ficou uma mancha na vida da infanta, que morreu esta quarta-feira, aos 83 anos, na clínica Ruber Internacional de Madrid, após uma luta de cerca de um ano contra um cancro do cólon. De resto, Dona Pi – como também era tratada – passou quase sempre ao lado das polémicas da família real, cultivando uma relação ambígua com a comunicação social: dizia não se rever na imagem que os média difundiam dos seus familiares, mas também gostava de fazer comentários mordazes e humorados.

Por exemplo, chegou a apelidar os programas cor de rosa “pornográficos”. E não se coibia de defender a rainha Letícia sempre que tinha oportunidade, mesma quando lhe pediam para a comparar com Diana Spencer, a princesa de Gales falecida em 1997. “São duas mulheres completamente diferentes, mas a nossa é mais esperta. (...) Letícia é uma pessoa estupenda”.

Infância, adolescência e casamento em Portugal

Pilar de Espanha viveu em Portugal durante quase 30 anos: "Portugal é a minha terra e Espanha é o meu país", disse à "Sábado" em 2006. Nasceu em Cannes, França, onde os pais se protegeram primeiro da Guerra Civil e viveu depois em Itália e na Suíça até chegar ao Estoril com os pais e três irmãos, quando tinha 10 anos, em 1946.

Algumas das suas melhores memórias, recorda em várias entrevistas, são das décadas seguintes – o regresso a Madrid só aconteceu quando o irmão Juan Carlos foi proclamado rei, em 1975. Foi em Portugal, no Mosteiro dos Jerónimos, que se casou, a 5 de maio de 1967, com Luis Gómez-Acebo, filho de um banqueiro e de uma aristocrata. Tiveram cinco filhos.

O marido de Dona Pi não tinha sangue azul, apesar das várias tentativas do pai, o Infante João, conde de Barcelona, para que um casamento do género se consumasse. É conhecida a história do encontro preparado ao pormenor pela avó, com Balduíno da Bélgica, que acabou por se apaixonar pela dama de companhia Fabíola de Mora – que a acompanhava a infanta precisamente por ser a menos vistosa. Para casar com Gómez-Acebo – que morreu em 1991, vítima do cancro linfático – teve de abdicar dos direitos dinásticos.

Outra data marcante: foi no Hotel Palácio, no Estoril, em 1954, que festejou o 18.º aniversário e foi apresentada à sociedade, numa festa que reuniu cerca de 2.000 pessoas, incluindo vários representantes de famílias reais europeias.

Porém, o momento porventura mais lembrado da sua vida em Portugal aconteceria em 1963, quando a queda dos alpendres da estação ferroviária do Cais do Sodré, em Lisboa, provocou 49 mortos e 69 feridos. Pilar de Borbón, enfermeira de profissão e que então trabalhava no Hospital dos Capuchos, dirigiu-se para o local para prestar auxílio às vítimas, um gesto que lhe valeria uma medalha do Governo português e a atenção da imprensa internacional.

Mesmo vivendo em Espanha, fazia questão de visitar Portugal pelo menos duas vezes por ano e orgulhava-se de manter um português fluente. Falava ainda inglês, francês e italiano.