Internacional

Democratas apresentam dois artigos de ‘impeachment’ contra Trump

De acordo com uma das acusações, o Presidente norte-americano abusou do seu poder ao colocar os seus interesses à frente dos interesses do país, e a outra tem que ver com a sua alegada obstrução às tentativas do Congresso de o investigar. A votação para a destituição presidencial na comissão de Justiça da câmara baixa do Congresso deverá ser realizada ainda esta semana, segundo a imprensa americana

Na origem do processo de destituição a Donald Trump está um telefonema com o homólogo ucraniano, Volodymyr Zelensky
Alex Wong / Getty Images

Os democratas da Câmara dos Representantes dos EUA apresentaram esta terça-feira dois artigos de ‘impeachment’, isto é, acusações formais, contra Donald Trump.

De acordo com uma das acusações, o Presidente norte-americano abusou do seu poder ao colocar os seus interesses à frente dos interesses do país, e a outra tem que ver com a sua alegada obstrução às tentativas do Congresso de o investigar.

A apresentação dos artigos foi feita pelo presidente da comissão de Justiça, o democrata Jerry Nadler, justificando em conferência de imprensa: “Temos de ser claros: ninguém, nem mesmo o Presidente, está acima da lei”.

Adam Schiff, presidente da comissão de Informação e que também interveio na conferência de imprensa, afirmou que os democratas “não tinham outra hipótese” a não ser fazer isto. “Estamos aqui hoje porque o Presidente continua a abusar do seu poder e não nos restam quaisquer alternativas. Se não fizéssemos o que quer que seja, tornar-nos-íamos cúmplices do Presidente e do seu abuso do exercício do cargo, da confiança pública e da segurança nacional”, afirmou.

Em reação à apresentação dos artigos de 'impeachment', a campanha de Trump para as eleições de 2020 emitiu um comunicado a afirmar que “os democratas não têm qualquer apoio por parte dos americanos” para forçar a destituição e que “montaram este teatro político só porque não têm um candidato viável para 2020”. Trump ainda não se pronunciou sobre o assunto.

Votação deverá ser realizada esta semana

A votação para a destituição presidencial na comissão de Justiça da câmara baixa do Congresso deverá ser realizada ainda esta semana, segundo a imprensa americana.

O presidente da comissão de Justiça, Jerry Nadler, encerrou esta segunda-feira uma audiência de nove horas com uma condenação à conduta de Trump. Os democratas, maioritários na Câmara dos Representantes, descreveram as ações do Presidente como um “perigo claro e presente” para a segurança nacional e para as próximas eleições americanas. “Os factos são claros. O perigo para a nossa democracia é claro e o nosso dever é claro”, sintetizou Nadler na sua declaração final. Trump nega quaisquer irregularidades e classifica a investigação de ‘impeachment’ como uma farsa.

A ORIGEM DO PROCESSO

O inquérito de destituição presidencial centra-se nas alegações de que Trump pressionou a Ucrânia a anunciar publicamente uma investigação ao ex-vice-Presidente Joe Biden. Em concreto, o seu homólogo ucraniano, Volodymyr Zelensky, deveria anunciar que estava em curso uma investigação à produtora de gás Burisma, que contratara Hunter, filho de Joe Biden, e só assim Kiev receberia a prometida ajuda militar norte-americana.

O antigo vice-Presidente é um dos candidatos mais bem posicionados para conseguir a nomeação democrata às presidenciais do próximo ano em que Trump tentará a reeleição. O atual Presidente tem feito acusações de corrupção, já refutadas, sobre Biden e o filho Hunter.

A ajuda militar à Ucrânia foi finalmente libertada em setembro, depois de um denunciante ter dado o alerta sobre um telefonema de 25 de julho entre os Presidentes Trump e Zelensky. A queixa do denunciante levou os democratas a darem início a uma investigação de ‘impeachment’.

UM PACOTE DE LEITE COM A INSCRIÇÃO “DESAPARECIDO”

A audiência desta segunda-feira foi marcada por gritos e recriminações por parte dos republicanos, relata a agência de notícias Reuters. Os democratas estão “desesperados” por terem uma votação de ‘impeachment’ contra o Presidente, acusou Doug Collins, o republicano mais graduado na comissão de Justiça.

Para o partido de Trump, não há provas de que o Presidente pressionou indevidamente a Ucrânia a investigar Biden. Os republicanos também argumentam não haver provas em primeira mão de que Trump tenha retido 391 milhões de dólares (cerca de 353 milhões de euros à cotação atual) em ajuda militar ou tenha feito depender um encontro na Casa Branca de um anúncio de uma investigação aos Biden.

Os republicanos solicitaram repetidamente o depoimento de Adam Schiff, cujo painel liderou a investigação e realizou cinco dias de audiências no mês passado. Nadler rejeitou o pedido dos republicanos, o que os levou a exibir um poster com a cara de Schiff impressa num pacote de leite, juntamente com a inscrição “Missing” (“Desaparecido”).

VOTAÇÃO DE GASTOS E PRIMÁRIAS DEMOCRATAS NO CAMINHO

O calendário do ‘impeachment’ começa a apertar, uma vez que até 20 de dezembro a Câmara dos Representantes terá de votar um projeto de lei relativo aos gastos da Administração. Só depois é que poderá voltar a debruçar-se sobre o ‘impeachment’ e quais os artigos a votar.

Se a votação resvalar para o próximo ano, o julgamento no Senado, que pode prolongar-se durante várias semanas, também ficará atrasado. Neste cenário, o processo seria arrastado para a altura das primárias democratas, o que complicaria a vida dos candidatos à nomeação, sendo muitos deles senadores.

Finalmente no Senado, o ‘impeachment’ só resultaria na destituição de Trump se fosse votado favoravelmente por dois terços dos senadores. Até ao momento, nenhum senador republicano deu indicação de que votaria nesse sentido, pelo que, chumbado na câmara alta, o processo morreria e Trump continuaria no cargo, como, de resto, aconteceu com Bill Clinton.